Três pontos sobre…
… 07/07/1998 – Brasil 1 x 1 Holanda
(Imagem: Paul Popper / Popperfoto / Getty Images)
● Mesmo com os problemas internos já citados, a Seleção Brasileira continuava entrando em campo de mãos dadas, tentando reviver o espírito vencedor de 1994.
Pelo Grupo A, o Brasil venceu a Escócia por 2 x 1 no jogo de abertura do Mundial. Depois, venceu o Marrocos por 3 x 0 e perdeu para a Noruega de virada por 2 x 1, sofrendo os gols nos últimos minutos. Na sequência, venceu o Chile de Salas e Zamorano por 4 x 1 nas oitavas de final. Nas quartas, venceu por 3 x 2 o ótimo time da Dinamarca, do goleiro Peter Schmeichel e dos irmãos Laudrup.
A Holanda era a cabeça de chave no Grupo E. Na primeira fase, empatou por 0 x 0 com a vizinha Bélgica, goleou a Coreia do Sul por 5 x 0 e empatou por 2 x 2 com o bom time do México. Nas oitavas de final, venceu por 2 x 1 com um gol de Edgar Davids no apagar das luzes. Nas quartas, contou com um gol fenomenal de Dennis Bergkamp no último lance da partida para eliminar a ótima seleção argentina pelo placar de 2 x 1.
Para a semifinal diante do Brasil, Arthur Numan estava suspenso por ter sido expulso diante da Argentina. Seu substituto imediato, Winston Bogarde, sofreu uma fratura no tornozelo em um treino no dia 05 de julho. André Ooijer, terceira opção, também estava machucado. E ao invés de escalar Giovanni van Bronckhorst na posição, o técnico Guus Hiddink preferiu improvisar Phillip Cocu como lateral esquerdo e colocar Boudewijn Zenden como titular na ponta, aproveitando a ausência de Cafu.
O Brasil apostava no talento dos jogadores de frente e nos apoios dos laterais. Jogava no 4-3-1-2. Rivaldo era o “número 1”, fazendo a ligação entre meio e ataque, no sistema de Zagallo. Zé Carlos substituiu Cafu, suspenso.
Sem a bola, a Holanda se fechava no 4-4-2. Com a bola, Zendem avançava e se tornava um 4-3-3.
● Cerca de 54 mil pessoas lotaram o estádio Vélodrome de Marselha para ver duas das seleções mais técnicas da Copa do Mundo.
O primeiro tempo foi de muito respeito de ambas as partes. A Holanda tentava controlar o jogo com a posse de bola, mas o Brasil assustava mais nas poucas vezes em que chegava ao ataque.
Ronaldo estava em noite inspirada e ameaçou por várias vezes o gol de Edwin Van der Sar. Em seu primeiro lance, ele arrancou e foi travado por Jaap Stam na hora do chute.
A Oranje respondeu. Ronald de Boer chutou de fora da área e a bola passou assustando Taffarel, que mandou para escanteio. Wim Jonk cobrou o córner e Phillip Cocu cabeceou para fora com perigo.
Cocu abriu com Zenden na esquerda. O camisa 12 cruzou e Kluivert cabeceou perto do gol, mas a bola foi por cima.
De novo Zenden cruzou da esquerda com perigo, mas Bergkamp não alcançou a bola.
A Seleção Brasileira passava seus sustos quando o arisco Zenden partia para cima de Zé Carlos. Com quase 30 anos, o lateral direito do São Paulo FC fazia sua segunda partida pela Seleção Brasileira. A primeira havia sido o empate por 1 x 1 em um amistoso não-oficial contra o Athletic Bilbao dez dias antes da Copa. Ficou cinquenta dias animando a imprensa e a delegação brasileira fazendo imitações de animais e outros sons. Um ano antes do Mundial, disputava a Série A2 do Campeonato Paulista pela Matonense. E naquele 07 de julho, teve a incumbência de substituir Cafu, que estava suspenso por ter levado o segundo cartão amarelo. Zé Carlos não conseguiu imitar bem um lateral direito e era o “mapa da mina” para os rápidos ataques holandeses.
Wim Jonk lançou nas costas da defesa, Kluivert cruzou e Bergkamp novamente passou da bola, que foi alta demais. Roberto Carlos apenas recuou com o peito para Taffarel.
Novamente Wim Jonk cruzou para a área, Kluivert ganhou de Júnior Baiano pelo alto e cabeceou por cima.
Patrick Kluivert se movimentou constantemente entre os zagueiros e deu trabalho à defesa brasileira.
E os primeiros 45 minutos terminaram sem gols.
(Imagem: Fritz The Flood)
● No primeiro minuto do segundo tempo, Aldair abriu na esquerda para Roberto Carlos, que deixou com Rivaldo no meio. Genial, o camisa 10 viu a infiltração de Ronaldo pela diagonal e fez um lançamento perfeito para o Fenômeno se desvencilhar da marcação implacável de Frank de Boer, ganhar na velocidade de Cocu (seu ex-companheiro de PSV) e tocar de esquerda entre as pernas de Van der Sar.
Em desvantagem no marcador, a Holanda precisou ser mais incisiva no ataque e começou a apostar ainda mais nas jogadas de bola aérea.
Aos 7′, Kluivert desviou uma cobrança de escanteio para o meio e Bergkamp finalizou à queima-roupa, mas Taffarel fez uma defesa sensacional.
O Brasil reagiu e Ronaldo chutou da direita para a defesa de Van der Sar.
Kluivert tabelou com Bergkamp na entrada da área e chutou forte, mas Taffarel segurou sem dar rebote.
Aos 27′, Rivaldo recebeu de Denílson e lançou Ronaldo, que partiu em velocidade de trás da linha de impedimento holandesa. Já dentro da área, na hora de chutar, o camisa 9 brasileiro foi travado por Edgar Davids na hora H, em uma arrancada impressionante do holandês. A bola ainda saiu pela linha de fundo, quase beliscando a trave.
Denílson pedalou para cima de Aron Winter e cruzou para a área. Rivaldo cai e, mesmo caído, tentou chutar, mas Van der Sar abafou e ficou com a bola. O Brasil perdia chances de matar a partida, mas seria duramente castigado.
Aos 34′, Kluivert tabelou com Pierre van Hooijdonk, mas chutou por cima do gol. A defesa brasileira dava calafrios em qualquer um.
A três minutos do fim, Ronald de Boer cruzou com precisão da direita. Kluivert subiu entre Aldair e Júnior Baiano (que ficaram parados) e cabeceou para baixo, sem dar a mínima chance de defesa a Taffarel.
O gol fez justiça ao placar pelo que os dois times haviam criado, especialmente no segundo tempo.
O lance mais reclamado pelos holandeses até hoje aconteceu nos acréscimos. Van Hooijdonk recebeu um cruzamento da direita e caiu na área após disputa com Júnior Baiano, mas o árbitro Ali Bujsaim, dos Emirados Árabes Unidos, não viu o suposto pênalti.
(Imagem: New York Times)
● E foi só no tempo extra que começou um dos maiores jogos dos últimos tempos. Diferente das grandes prorrogações da história das Copas, esta tinha “morte súbita” ou “gol de ouro”, ou seja, o jogo terminaria assim que houvesse um gol, sem chance de recuperação para o adversário. E nos 30 minutos que se seguiram, o que se viu foi um jogo aberto e eletrizante, não recomendável para cardíacos.
Ronaldo estava inspirado e em grande fase, conseguindo dar suas perigosas arrancadas. Roberto Carlos passou a avançar quase como um ponta pela esquerda e Dunga coordenou as ações no meio de campo.
Aos três minutos, Roberto Carlos recebeu de Denílson na esquerda e cruzou da linha de fundo. Van der Sar espalmou para cima e Ronaldo tentou uma bicicleta, mas Frank de Boer tirou em cima da linha.
No minuto seguinte, Ronaldo driblou Frank de Boer e chutou de fora da área para uma boa defesa de Van der Sar.
Aos 6′, Van Hooijdonk bateu uma falta com efeito (uma das suas especialidades), mas Taffarel fez a defesa em dois tempos.
Aos doze, Kluivert recebeu nas costas de Zé Carlos, invadiu a área e chutou cruzado, mas a bola tocou de leve na trave e foi para fora.
No início da etapa final do tempo extra, Ronaldo deu mais uma de suas arrancadas características, ganhou na velocidade de Frank de Boer e deu um toque entre as pernas de Stam, mas o capitão holandês se recuperou e travou o brasileiro para evitar o gol.
Após o apito final, as duas equipes receberam os merecidos aplausos dos extasiados torcedores.
Certamente foi a melhor prorrogação que a Seleção Brasileira já jogou. Em 30 minutos, fez tudo que não havia feito nos 90 anteriores. Criou pelo menos oito chances claras de gol, contra uma única dos holandeses.
(Imagem: Rede Globo)
● Mas o gol decisivo não saiu e a vaga foi decidida nos pênaltis.
Ronaldo foi o primeiro a cobrar e bateu alta, no canto direito de Van der Sar. Brasil, 1 a 0.
Frank de Boer bateu firme, à meia altura, no canto direito de Taffarel. Empate em 1 a 1.
Rivaldo deslocou o arqueiro holandês e bateu no canto esquerdo: 2 a 1 Brasil.
Bergkamp bateu no cantinho esquerdo de Taffarel, que se esticou todo, mas não conseguiu chegar na bola: 2 a 2.
Emerson tinha entrado no lugar de Leonardo aos 40′ do segundo tempo. Como Leonardo era um dos cobradores oficiais, Zagallo estranhamente manteve seu substituto entre os batedores, ao invés de escolher outro jogador mais experiente. Mas Emerson bateu bem, no canto direito alto e converteu. Brasil 3, Holanda 2.
Cocu bateu à meia altura no canto esquerdo e Taffarel pulou certo para pegar. Permanecia 3 a 2.
Dunga bateu no canto direito e Van der Sar quase pegou, mas a bola foi para o gol: 4 a 2.
Ronald de Boer bateu no cantinho direito, mas… “Sai que é sua, Taffarel!” O goleiro brasileiro voou e pegou mais um.
Placar final: Brasil 4 x 2 Holanda.
(Imagem: CBF)
● Taffarel sofreu muito com as críticas após o tetra, bastante contestado por suas atuações pelo Clube Atlético Mineiro. Mas ele tinha a confiança do técnico Zagallo. E provou que deveria sempre ter tido a do povo brasileiro. Ele acertou o canto dos quatro pênaltis e só não defendeu o de dois craques: Frank de Boer e Dennis Bergkamp.
“Essa decisão por pênaltis foi ótima para o Taffarel. Ele já tinha sido muito criticado.” ― Zagallo
“Hoje ganhamos a batalha, mas a guerra não está vencida.” ― Taffarel
O Brasil havia superado seu trauma na decisão por pênaltis após o a conquista do título da Copa do Mundo de 1994. Por sua vez, a Holanda só se livraria desse trauma seis anos mais tarde, na Eurocopa de 2004, quando superou a Suécia e pela primeira vez venceu uma decisão por penalidades. Antes, já haviam sido derrotados pela Dinamarca na Euro de 1992, pela França na Euro de 1996 e pela Itália na Euro de 2000.
Na decisão do 3º lugar, a Holanda não teve ânimo algum e perdeu para a Croácia de Davor Šuker por 2 x 1.
O Brasil estava na final pela segunda Copa do Mundo consecutiva. E também pela segunda vez seguida, eliminava a Holanda.
Na decisão, a Seleção Brasileira enfrentou a França e perdeu por 3 x 0, em partida que ficou marcada pela convulsão de Ronaldo horas antes da partida e os dois gols de cabeça de Zinedine Zidane. Emmanuel Petit completou o placar.
(Imagem: Alexandre Battibugli / Placar / Dedoc)
● FICHA TÉCNICA: |
||
|
||
BRASIL 1 X 1 HOLANDA |
||
|
||
Data: 07/07/1998 Horário: 21h00 locais Estádio: Stade Vélodrome (atual Orange Vélodrome) Público: 54.000 Cidade: Marselha (França) Árbitro: Ali Bujsaim (Emirados Árabes Unidos) |
||
|
||
BRASIL (4-4-2): |
HOLANDA (4-4-2): |
|
1 Taffarel (G) |
1 Edwin van der Sar (G) |
|
13 Zé Carlos |
2 Michael Reiziger |
|
4 Júnior Baiano |
3 Jaap Stam |
|
3 Aldair |
4 Frank de Boer (C) |
|
6 Roberto Carlos |
11 Phillip Cocu |
|
5 César Sampaio |
6 Wim Jonk |
|
8 Dunga (C) |
16 Edgar Davids |
|
18 Leonardo |
7 Ronald de Boer |
|
10 Rivaldo |
12 Boudewijn Zenden |
|
20 Bebeto |
8 Dennis Bergkamp |
|
9 Ronaldo |
9 Patrick Kluivert |
|
|
||
Técnico: Zagallo |
Técnico: Guus Hiddink |
|
|
||
|
||
|
|
|
12 Carlos Germano (G) |
18 Ed de Goey (G) |
|
22 Dida (G) |
22 Ruud Hesp (G) |
|
2 Cafu |
13 André Ooijer |
|
14 Gonçalves |
15 Winston Bogarde |
|
15 André Cruz |
5 Arthur Numan |
|
16 Zé Roberto |
19 Giovanni van Bronckhorst |
|
17 Doriva |
20 Aron Winter |
|
11 Emerson |
||
7 Giovanni |
14 Marc Overmars |
|
19 Denílson |
17 Pierre van Hooijdonk |
|
21 Edmundo |
21 Jimmy Floyd Hasselbaink |
|
|
||
GOLS: |
||
46′ Ronaldo (BRA) |
||
87′ Patrick Kluivert (HOL) |
||
|
||
CARTÕES AMARELOS: |
||
31′ Zé Carlos (BRA) |
||
45′ César Sampaio (BRA) |
||
48′ Michael Reiziger (HOL) |
||
60′ Edgar Davids (HOL) |
||
90′ Pierre van Hooijdonk (HOL) |
||
119′ Clarence Seedorf (HOL) |
||
|
||
SUBSTITUIÇÕES: |
||
56′ Michael Reiziger (HOL) ↓ |
||
Aron Winter (HOL) ↑ |
||
|
||
70′ Bebeto (BRA) ↓ |
||
Denílson (BRA) ↑ |
||
|
||
75′ Boudewijn Zenden (HOL) ↓ |
||
Pierre van Hooijdonk (HOL) ↑ |
||
|
||
85′ Leonardo (BRA) ↓ |
||
Emerson (BRA) ↑ |
||
|
||
111′ Wim Jonk (HOL) ↓ |
||
Clarence Seedorf (HOL) ↑ |
||
|
||
DECISÃO POR PÊNALTIS: |
||
BRASIL 4 |
HOLANDA 2 |
|
Ronaldo (gol, no ângulo direito) |
Frank de Boer (gol, à meia altura, à direita) |
|
Rivaldo (gol, no canto esquerdo) |
Dennis Bergkamp (gol, no canto esquerdo) |
|
Emerson (gol, no alto do gol, à direita) |
Phillip Cocu (perdeu, à esquerda, defendido por Taffarel) |
|
Dunga (gol, no ângulo direito) |
Ronald de Boer (perdeu, à direita, defendido por Taffarel) |
|
Melhores momentos (Rede Globo):
Melhores momentos (FIFA.com):