… 20/06/1994 – Brasil 2 x 0 Rússia

Três pontos sobre…
… 20/06/1994 – Brasil 2 x 0 Rússia


(Imagem: Pinterest)

● Nas três primeiras conquistas do Brasil em Copas do Mundo (1958, 1962 e 1970), o futebol arte se tornou sinônimo da camisa amarelinha. Por isso, poucos botavam fé no futebol pragmático apresentado pelo time do técnico Carlos Alberto Parreira. Mas depois de 24 anos sem o título, o treinador preferiu abdicar de jogar bonito para entrar na história como campeão.

Havia um temor para a Copa de 1994: que o Brasil passasse a mesma vergonha de quatro anos antes. A Seleção teve dificuldades e perdeu uma partida pela primeira vez na história das eliminatórias sul-americanas, para a Bolívia na altitude, por 2 a 0. Os brasileiros acabaram sofrendo mais que o normal e só garantiram a vaga na última rodada, ao vencerem o Uruguai por 2 x 0. Com a lesão de Müller, Parreira teve que engolir o orgulho e convocar de última hora o seu desafeto Romário, que acabou por marcar os dois gols que deram a vaga ao Brasil para o Mundial.

Antes disso, para mostrar a união do grupo, Ricardo Rocha propôs que o time entrasse de mãos dadas em campo a partir do jogo de volta contra a Bolívia, em Recife (vitória por 6 x 0). Esse gesto se tornaria uma das imagens mais marcantes da equipe em todos os jogos do Mundial.


(Imagem: Veja)

● A espinha dorsal ainda era a mesma da Copa anterior. Dez dos convocados para 1994 estiveram presentes em 1990: Taffarel, Jorginho, Ricardo Rocha, Aldair, Branco, Dunga, Mazinho, Müller, Bebeto e Romário. Como novidade, surgia o menino Ronaldo, do Cruzeiro, de apenas 17 anos.

Parreira perdeu um de seus líderes uma semana antes da estreia, no amistoso contra El Salvador: o zagueiro Ricardo Gomes – capitão em 1990 e candidato a ser também em 1994 – sofreu um estiramento na coxa e foi desligado da delegação. Para seu lugar, foi convocado o zagueiro Ronaldão. Antes, no início da preparação, já havia perdido o também zagueiro Mozer, com problemas no fígado.

Durante a semana da estreia, Romário sentiu dores na virilha e não treinou – mas estaria pronto para o jogo. Branco ainda estava se recuperando de dor na lombar e dava lugar a Leonardo na lateral esquerda. Roberto Carlos, do Palmeiras, estava em grande fase e a presença de Branco foi uma das mais contestadas, mas Parreira bancou a presença do experiente jogador do Fluminense.

Sem Ricardo Gomes, Raí foi o capitão no início do Mundial. Ele chegava à competição bastante contestado, mas estava recuperando a confiança aos poucos. Em carta aberta à torcida publicada na véspera da partida, disse que já podia imaginar as jogadas que faria e que tinha certeza que marcaria um gol, talvez de cabeça.


(Imagem: O Curioso do Futebol)

● Havia uma grande expectativa sobre a primeira participação da Rússia em Copas do Mundo após a dissolução da União Soviética. E como essa separação tinha ocorrido recentemente, alguns jogadores remanescentes da URSS escolheram defender a Rússia em 1994. Entre os 22 convocados Yuriy Nikiforov, Vladislav Ternavsky, Viktor Onopko, Ilya Tsymbalar e Sergei Yuran eram nascidos na região pertencente à Ucrânia; Andrey Pyatnitsky era do Uzbequistão; Omari Tetradze era da Geórgia; e Valeri Karpin (tecnicamente o melhor do elenco) era da Estônia.

Liderados por Andriy Kančelskis, seis bons jogadores promoveram um boicote e abandonaram a seleção por divergências com o polêmico treinador Pavel Sadyrin: Ihor Dobrovols’kyi, Igor Shalimov, Igor Kolyvanov, Sergei Kiriakov e Vasiliy Kulkov. Karpin estava entre os dissidentes, mas voltou atrás e permaneceu no grupo.

Para o jogo contra o Brasil, a Rússia não pôde contar com o bom líbero Viktor Onopko, melhor jogador do último Campeonato Russo, que estava suspenso.


O Brasil atuava no 4-4-2, com dois volantes e dois meias. O sistema do técnico Parreira consistia em manter a maior posse de bola possível e dar o bote no momento certo. A figura símbolo desse estilo de jogo era o meia Zinho, apelidado de “enceradeira” por girar com a bola de um lado para outro, sem agressividade.


A Rússia jogou no 3-5-2, com os alas Gorlukovich e Tsymbalar bastante adiantados.

● Mais de 81 mil pessoas encheram o Stanford Stadium, em Palo Alto, em plena segunda feira. A temperatura de 36º centígrados era aliada brasileira, já que Parreira sempre treinava a seleção nos horários dos jogos, para os atletas já irem se habituando.

Trocando passes em sua própria intermediária, o Brasil só conseguiu avançar para o campo adversário aos quatro minutos. E foi se soltando aos poucos.

Na saída de jogo, Mauro Silva recuava e se posicionava entre os zagueiros, permitindo que Jorginho e Leonardo avançassem. Dunga geralmente era o responsável pelos passes de transição, sempre priorizando os laterais. Zinho segurava a bola e dava suporte ao apoio de Leonardo. Raí ficava mais centralizado, enquanto Bebeto flutuava pela direita e pelo centro. Romário ficava mais próximo da área, sempre à espreita.

A primeira chance foi aos nove minutos, quando Dunga cortou de carrinho no meio campo e Bebeto lançou Romário. Em velocidade, o baixinho dominou na direita da grande área, tirou Nikiforov do lance e cruzou para trás, mas não tinha ninguém chegando para finalizar.

No minuto seguinte, Dunga lançou Jorginho na ponta direita. O lateral dominou, passou a bola entre as pernas de Tsymbalar, mas Nikiforov chegou pra dividir fazendo cobertura. Dunga pegou o rebote e cruzou na segunda trave. Bebeto tentou seu tradicional voleio, mas a bola passou por cima do gol.

Márcio Santos avançou pela lateral esquerda e tocou para Dunga no meio. O volante brasileiro se enrolou com a bola e ela sobrou para Radchenko tabelar com Yuran, mas Márcio Santos chegou a tempo de travar o chute. Na sequência, Tsymbalar chutou forte, mas Taffarel defendeu com tranquilidade.

No minuto 14, Raí e Romário tabelavam e a zaga russa tirou. A bola foi em direção a Ricardo Rocha, que foi enganado pelo quique da bola, se desequilibrou e teve que puxar Yuran pela camisa. Seria uma ocasião clara e manifesta de gol, que caberia o cartão vermelho. Mas Ricardo Rocha simulou ter sofrido uma lesão e escapou de ser expulso pelo árbitro Lim Kee Chong, das Ilhas Maurício.

Aos 20, o juiz compensou ao não marcar um empurrão sobre Leonardo dentro da área russa.


(Imagem: Gazeta Press)

Aos 26′, houve uma série de tiros de canto a favor da Seleção Brasileira. No último desses escanteios, Bebeto cobrou da esquerda, a bola passou por Márcio Santos e Romário se antecipou à marcação e tocou de bico, rasteiro, para o fundo das redes.

Pouco depois, Romário sofreu pênalti claro ao ser agarrado por Ternavsky (um carrapato na marcação individual sobre o Baixinho), mas o juiz ignorou.

Ainda antes do intervalo, Bebeto bateu uma falta perigosa, que passou raspando a trave.

No segundo tempo, a Rússia adiantou a marcação, tentou partir para cima e ficou mais aberta. Em compensação, se cansava mais. E o Brasil passou a ter os contragolpes a seu favor.

Aos seis minutos da etapa complementar, Zinho trocou passes com Mauro Silva e Dunga e lançou Romário. O astro do Barcelona recebeu de costas, girou sobre a marcação de Ternavsky, tocou a bola entre as pernas de Nikiforov e, ao entrar na área, foi atingido por um carrinho de Ternavsky. A penalidade dessa vez não foi ignorada.

Com a camisa 10 e a faixa de capitão, Raí era o cobrador oficial e bateu com categoria, no canto esquerdo do goleiro Dmitri Kharine, que pulou no lado contrário. Foi seu único gol na Copa antes de perder a vaga no time titular. Raí fez uma partida apagada, mas foi eleito pela FIFA o melhor em campo.

Esse gol deu a tranquilidade necessária para que a Seleção controlasse as ações. Marcando praticamente em duas linhas de quatro, o escrete canarinho deu a bola aos russos, que não conseguiram criar jogadas.

A Seleção diminuiu o ritmo, mas teve chance de ampliar. Dunga tabelou com Raí e cruzou da linha de fundo. Bebeto finalizou da entrada da área, mas Kharine espalmou por cima.

Depois, começaram os problemas físicos. Jorginho sofreu uma entrada forte de Khlestov e precisou sair no carrinho maca, mas, felizmente, conseguiu voltar a campo.

Ricardo Rocha não teve a mesma sorte. Ele sentiu uma contratura no músculo adutor da coxa esquerda e foi substituído por Aldair, aos 25′. Um dos líderes do elenco, Ricardo não voltaria mais a jogar no Mundial.

A cinco minutos do fim, Dunga levou a pior em uma dividida e Mazinho o substituiu.


(Imagem: Action Images)

● Ao fim da partida, o chato técnico russo Pavel Sadyrin se rendeu a Romário: “imarcável”.

A Rússia foi eliminada na primeira fase. Depois da derrota para o Brasil (2 x 0), perdeu também para a Suécia de Martin Dahlin, por 3 x 1. Na última partida do Grupo B, venceu Camarões por 6 x 1, na maior goleada do Mundial. Essa partida marcou dois recordes: o atacante Oleg Salenko anotou uma “manita”, sendo o único jogador a fazer cinco gols em uma única partida em toda a história das Copas. O gol de honra camaronês foi marcado pelo veterano Roger Milla, que se tornou o jogador mais velho a marcar um gol na história dos Mundiais.

Na sequência da fase de grupos, o Brasil venceu Camarões por 3 x 0. Já classificado para as oitavas de final, empatou em 1 x 1 com a Suécia. Nas oitavas de final, enfrentou o anfitrião Estados Unidos justamente no dia da independência americana. Com um homem a menos (Leonardo foi expulso), foi um jogo duríssimo, mas a Seleção venceu com um gol de Bebeto. Nas quartas de final, o melhor jogo da Copa: vitória sobre a Holanda por 3 a 2. Nas semifinais, novo encontro com os suecos, que agora foram batidos por 1 a 0, com um gol de Romário. Enfim, depois de 24 anos, o Brasil estava em uma final de Copa do Mundo. Na decisão, enfrentou a Itália, suportou bem os 120 minutos no calor infernal e venceu nos pênaltis por 3 a 2, após um empate sem gols no tempo normal e na prorrogação. É tetra! É tetra!


(Imagem: CBF)

FICHA TÉCNICA:

 

BRASIL 2 x 0 RÚSSIA

 

Data: 20/06/1994

Horário: 13h00 locais

Estádio: Stanford Stadium

Público: 81.061

Cidade: Stanford (Estados Unidos)

Árbitro: Lim Kee Chong (Ilhas Maurício)

 

BRASIL (4-4-2):

RÚSSIA (3-5-2):

1  Taffarel (G)

16 Dmitri Kharine (G)(C)

2  Jorginho

5  Yuriy Nikiforov

3  Ricardo Rocha

21 Dmitri Khlestov

15 Márcio Santos

6  Vladislav Ternavsky

16 Leonardo

3  Sergei Gorlukovich

5  Mauro Silva

2  Dmitri Kuznetsov

8  Dunga

7  Andrey Pyatnitsky

10 Raí (C)

10 Valeri Karpin

9  Zinho

17 Ilya Tsymbalar

7  Bebeto

15 Dmitri Radchenko

11 Romário

22 Sergei Yuran

 

Técnico: Carlos Alberto Parreira

Técnico: Pavel Sadyrin

 

SUPLENTES:

 

 

12 Zetti (G)

1  Stanislav Cherchesov (G)

22 Gilmar Rinaldi (G)

12 Omari Tetradze

14 Cafu

18 Viktor Onopko

13 Aldair

4  Dmitri Galiamin

4  Ronaldão

8  Dmitri Popov

6  Branco

14 Igor Korneev

17 Mazinho

19 Aleksandr Mostovoi

18 Paulo Sérgio

20 Igor Lediakhov

19 Müller

13 Aleksandr Borodyuk

21 Viola

11 Vladimir Beschastnykh

20 Ronaldo

9  Oleg Salenko

 

GOLS:

26′ Romário (BRA)

52′ Raí (BRA) (pen)

 

CARTÕES AMARELOS:

61′ Yuriy Nikiforov (RUS)

65′ Dmitri Khlestov (RUS)

78′ Dmitri Kuznetsov (RUS)

 

SUBSTITUIÇÕES:

55′ Sergei Yuran (RUS) ↓

Oleg Salenko (RUS) ↑

 

75′ Ricardo Rocha (BRA) ↓

Aldair (BRA) ↑

 

77′ Dmitri Radchenko (RUS) ↓

Aleksandr Borodyuk (RUS) ↑

 

85′ Dunga (BRA) ↓

Mazinho (BRA) ↑

Melhores momentos da partida:

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