Se em SP eram apenas seis, no RJ o número é maior. São 17 (dezessete) atletas que vestiram a camisa dos quatro times considerados “grandes” do futebol carioca: Botafogo, Flamengo, Fluminense e Vasco da Gama.
A maioria desses nomes se concentram nos últimos 20 anos.
Destaques para os que foram campeões em todos esses times: Cláudio Adão, Leandro Ávila, Beto, Renato Silva e Júlio César, além de Diego Souza, que inicia agora sua caminhada no Botafogo, mas já conquistou títulos nos outros três gigantes do Rio.
Seguem abaixo os atletas e o período que representaram, respectivamente, cada clube. Com um asterisco (*) destacamos os clubes pelos quais foram campeões de algum torneio oficial.
(Imagens localizadas no Google)
● 1) Paulo Cézar Caju: Botafogo: 1967-1971, 1978*
Flamengo: 1972-1974*
Fluminense: 1975-1977*
Vasco: 1979
— Menção honrosa para o ex-atacante Luizão, que além de ter defendido os quatro grandes de São Paulo, defendeu três no Rio de Janeiro. Faltou apenas o Fluminense para completar todo o ciclo nos dois estados:
Palmeiras: 1996-1997*
Vasco: 1998*
Corinthians: 1999-2002*
Botafogo: 2004
São Paulo: 2005*
Santos: 2005
Flamengo: 2006*
Três pontos sobre… … Jogadores que atuaram nos quatro grandes clubes de São Paulo
Em toda região onde há grandes clubes, vencedores tanto em âmbito local, nacional e até internacionalmente, há de surgir uma grande rivalidade entre eles. Afinal, brigam pelos mesmos títulos e pela mesma torcida.
Com isso, essas equipes costumam ter jogadores bastante identificados com sua camisa e, consequentemente, odiados pelos rivais.
Acontece a mesma coisa entre os quatro times considerados “grandes” do futebol paulista: Corinthians, Palmeiras, Santos e São Paulo.
Mesmo assim temos uma lista extensa de atletas que representaram mais de um desses times.
E temos também alguns casos, mais restritos, de craques que vestiram a camisa de todos esses quatro.
Praticamente todos jogaram nos anos 1990, quando a mercantilidade já era maior que a rivalidade.
Mas o primeiro caso se destaca: Cláudio Christóvam de Pinho, um dos grandes jogadores de sua época. Começou a carreira no Santos, marcou o primeiro gol da história do Palmeiras após deixar de ser chamado de Palestra Itália, fez história e se tornou o maior artilheiro da história do Corinthians e encerrou a carreira no São Paulo.
Seguem abaixo os atletas e o período que representaram, respectivamente, cada clube. Com um asterisco (*) destacamos os clubes pelos quais foram campeões de algum torneio oficial. O único a ser campeão pelos quatro foi o ex-zagueiro Antonio Carlos Zago.
(Imagens localizadas no Google)
● 1) Cláudio Christóvam de Pinho:
Santos: 1940-1941, 1943-1944
Palmeiras: 1942-1943*
Corinthians: 1945-1957*
São Paulo: 1959-1960
Três pontos sobre… … 14/06/1970 – Brasil 4 x 2 Peru
(Imagem: Futebol nas 4 linhas)
● Na primeira Copa do Mundo transmitida ao vivo, com imagens ainda em preto e branco, o Brasil parou para assistir a mais um show do escrete canarinho. Com o primeiro lugar do Grupo 3, a delegação brasileira permaneceu em Guadalajara para o confronto das quartas de final diante do Peru.
Os peruanos tinham a simpatia da torcida mexicana por causa da tragédia que atingiu o país andino no mesmo dia da abertura da Copa, em 31 de maio. Um terremoto matou mais de 60 mil pessoas e a delegação estava muito abalada. O governo decidiu que o time deveria continuar na competição.
Pouco cotados antes do início do torneio, os peruanos eram franco-atiradores. Com a melhor geração de sua história, vizinhos sul-americanos tinham bons jogadores, como Teófilo Cubillas, Héctor Chumpitaz, Ramón Mifflin e Alberto Gallardo. Mas a grande atração era mesmo o técnico Didi. O brasileiro Waldir Pereira havia sido bicampeão mundial como jogador em 1958 e 1962 (assim como seu colega Zagallo, treinador do Brasil), sendo eleito o craque da Copa na primeira conquista.
Na primeira fase, os peruanos conseguiram duas boas vitórias, vencendo a Bulgária de virada por 3 a 2 e batendo o Marrocos por 3 a 0. Depois, perderam para a Alemanha Ocidental por 3 a 1. A inédita classificação para as quartas de final tornou Didi uma celebridade no Peru.
O Brasil jogava em um 4-3-3, com Rivellino apoiando mais a esquerda e fechando pelo meio. No ataque, Tostão era o “falso 9” (criando tendências para o futuro), se revezando com Pelé – hora como atacante, hora como ponta-de-lança. O jogador mais avançado era Jairzinho, um ponta-direita que fechava pelo centro, abrindo espaços para os avanços constantes de Carlos Alberto.
Didi escalou o Peru no 4-3-3. Com a bola, Teófilo Cubillas avançava e o sistema se tornava um 4-2-4.
● No estádio Jalisco, eram 54.233 as testemunhas de mais uma mostra de futebol arte. O meia Gérson voltou ao time após dois jogos se recuperando de lesão. Na lateral esquerda, o garoto Marco Antônio (19 anos) foi escolhido como titular por apoiar melhor que Everaldo.
Em toda a partida, o Brasil não correu mais que o necessário, mudando o ritmo da partida como lhe convinha.
No comecinho, Gérson fez um lançamento ao seu estilo. Pelé dominou no peito antes de entrar na área, driblou a marcação com o joelho e chutou na trave. O mesmo Pelé apanhou o rebote e tocou para trás de calcanhar, mas Tostão chegou chutando para fora.
Aos 11 minutos de jogo, Carlos Alberto cobrou lateral para Pelé na direita. O Rei cruzou para a área de pé esquerdo. O lateral Eloy Campos errou o domínio e deixou a bola nos pés de Tostão, que ajeitou para a meia-lua. Rivellino, em uma de suas “patadas atômicas” mandou de três dedos. A bola fez uma curva e morreu no canto esquerdo do arqueiro peruano. 1 a 0.
Quatro minutos depois, escanteio para o Brasil. Após cobrança curta, Tostão e Rivellino tabelam perto da linha de fundo. De um ângulo improvável, Tostão chuta direto para o gol. O quique da bola enganou o péssimo goleiro Luis Rubiños, que tentou encaixar e deixou a bola entrar. 2 a 0.
Pouco depois, em falta na intermediária, Pelé encheu o pé esquerdo e a bola foi no ângulo. Mas o árbitro belga Vital Loraux anulou o gol, pois tinha determinado tiro livre indireto (em dois lances).
Tostão abriu com Rivellino na esquerda. Ele usou sua habilidade, enganou o marcador e deixou com Pelé na entrada da área. O Rei tentou o gol por cobertura, mas a bola foi por cima.
(Imagem: Futebol nas 4 linhas)
O Brasil diminuiu o ritmo, trocando passes e procurando esfriar o jogo. Do outro lado, o Peru atacava a todo vapor. Tinha uma grande equipe e se aproveitou do primeiro descuido fatal da defesa brasileira – e é bom lembrar que a retaguarda canarinho tinha mesmo os seus problemas.
Aos 27′, o capitão Héctor Chumpitaz lançou Alberto Gallardo (ex-Palmeiras, nos anos 1960) na ponta esquerda. Ele cortou Carlos Alberto e chutou sem ângulo. Inseguro, o goleiro Félix praticamente fez um gol contra ao tentar pegar o chute cruzado do peruano e desviou para dentro. Um gol com certa semelhança ao de Tostão, pelos chutes com pouco ângulo e falhas dos goleiros.
No finzinho da etapa inicial, Jairzinho escapou pela ponta direita e tocou para Pelé no meio. O camisa 10 bateu de esquerda e Rubiños defendeu sem conseguir segurar. A bola escapou e foi na trave.
O primeiro tempo terminou em 2 a 1. Os onze comandados por Zagallo se entendiam às mil maravilhas e voltaram a campo dispostos a resolverem logo o jogo.
Aos 7′, Pelé deixou com Jairzinho, que devolveu para o Rei no costado da zaga. Ele tocou para o meio da área, a bola desviou na defesa, tirou o goleiro do lance e sobrou livre para Tostão completar para o gol vazio. Esses gols contra o Peru foram os únicos de Tostão no Mundial do México.
Mesmo com vantagem, o Brasil continuou atacando. E, com muita categoria, o Peru respondia com ferocidade nos contragolpes. Aos 24′, após uma bela jogada coletiva, Cubillas ficou com a sobra e chutou de primeira. A bola foi no meio do gol e passou por baixo de Félix. 3 a 2.
No meio do segundo tempo, Gérson foi poupado e deu lugar a Paulo Cézar. O “Canhota de Ouro” jogou 67 minutos, fez 57 passes e errou apenas um.
Com duas alterações, Didi lançou sua equipe à frente.
Antes que o Peru começasse a gostar do jogo de vez, a reação do Brasil foi quase imediata. Aos 31 minutos, Jairzinho deixou com Rivellino e arrancou. Riva devolveu com perfeição para o “Furacão da Copa”. Ele entrou na área, driblou o goleiro, foi à linha de fundo e tocou para o gol vazio antes da chegada do beque peruano. Jairzinho marcou pela quinta vez na Copa. Logo depois, esgotado, ele deu lugar a Roberto.
Com a vitória garantida, o escrete canarinho trocou muitos passes e deixou o tempo correr. Embora o placar tenha sido 4 a 2, o Brasil foi senhor do jogo o tempo todo e não sofreu em momento algum.
(Imagem: Peru.com)
● Finalmente Tostão marcou seus primeiros gols na Copa. Ele vinha merecendo. Antes do Mundial, muitos diziam que Tostão não poderia jogar ao lado de Pelé. E a crítica sempre pesa para o lado mais fraco. Nesse caso, para Tostão. Ele, que foi o artilheiro das Eliminatórias com dez gols. Ele, que fez um esforço comovente para provar que poderia voltar a jogar em alto nível após o descolamento da retina. O próprio Zagallo só não barrou Tostão porque a opinião pública o queria no time. E nos jogos anteriores, jogando como “falso 9” (quarenta anos antes de Lionel Messi), o cruzeirense abria espaços para Pelé, Jair e Rivellino, com intensa movimentação e passes geniais. Mais que ninguém, ele merecia marcar esses dois gols contra o Peru.
O Brasil estava classificado para enfrentar o arquirrival Uruguai nas semifinais. A lembrança do “Maracanazzo” de 1950 ainda pairava na lembrança dos brasileiros.
O Chile estava fazendo uma campanha digna, de certa forma até surpreendente. Estreou vencendo a Suíça por 3 x 1 de virada. Na sequência, venceu um jogo duríssimo contra a Itália por 2 x 0. A derrota por 2 x 0 para a Alemanha Ocidental deixou os anfitriões em segundo lugar do grupo. Nas quartas de final, o Chile bateu a União Soviética por 2 a 1 e estava entre os quatro melhores do mundo pela primeira (e até hoje única) vez em sua história.
Animados com a campanha, os torcedores comemoraram tanto a classificação, como se tivessem vencido a final. A capital Santiago foi tomada pela febre do futebol, que contagiou a todos – até mesmo os que nunca assistiram a uma partida na vida. Até nas casas noturnas e teatros, o tema era a bola. O Chile era a capital da bola.
A empolgação da torcida local passava do ponto, chegando a encher a capital Santiago de frases cômicas e ameaçadoras, como, por exemplo: “Com Pelé ou sem Pelé, haveremos de tomar café” ou “Com Didi ou sem Didi, haveremos de fazer xixi”.
Por isso, naquela manhã de quarta-feira, a comissão técnica brasileira decidiu providenciar ela mesma a refeição dos jogadores e comprou salame, mortadela, queijo e pão. Os atletas almoçaram apenas sanduíches. Os dirigentes brasileiros tinham receio de que algo pudesse ser colocado na comida do hotel.
(Imagem: FIFA / Getty Images)
● Se fosse seguida a tabela original da Copa, a semifinal entre Brasil e Chile deveria ser disputada em Viña del Mar, enquanto Tchecoslováquia e Iugoslávia se enfrentariam em Santiago. Mas o comitê organizador, inverteu as sedes com o objetivo de ter uma renda maior.
Assim, ao mesmo tempo em que tchecos e iugoslavos duelavam no estádio Sousalito para 5.890 pessoas, brasileiros e chilenos jogavam para 76.594 expectadores. O “detalhe” é que o estádio Nacional tinha capacidade para 70 mil. Ou seja, o público presente extrapolou em mais de seis mil a lotação máxima. Foi o maior público e a maior renda da Copa.
Muitos jogos tiveram poucos expectadores no Chile. Cabe ressaltar o motivo não foi a falta de entusiasmo que afastou o público dos estádios, mas sim a falta de dinheiro. E não era possível adquirir o ingresso para um jogo só. Eles eram vendidos em pacotes e eram muito caros. O jeito era assistir de graça pelas televisões nas ruas. Onde houvesse uma TV ligada, havia uma multidão de chilenos com os olhos grudados na tela.
Recém saindo de um terremoto arrasador, o país vivia problemas econômicos, financeiros e até estruturais, inclusive com racionamento de energia elétrica. O fornecimento era interrompido em todas as tardes. A única exceção naqueles dias foi em 13/06, justamente no dia da semifinal entre Brasil e Chile. A direção geral da companhia energética recebeu milhares de cartas e telefonemas de pessoas que não tinham ingressos para o jogo, mas que não queriam perder a transmissão pelo rádio ou pela TV. Curiosamente, um dos bairros que deveria sofrer o corte naquele dia era justamente o do estádio Nacional, palco da disputa. Em caráter de exceção, o pedido foi prontamente atendido.
O Brasil atuava como em 1958, em um falso 4-2-4, se transformando em um 4-3-3 com o recuo voluntário de Zagallo.
O Chile atuava no sistema 4-2-4, com muita força pelas pontas.
● Os jogadores pareciam nervosos nos minutos iniciais, mas o Brasil dominou o jogo desde os primeiros momentos.
Didi cobrou falta com perigo, mas a bola foi por cima.
Após bola na área brasileira, Mauro escorou de cabeça e Djalma Santos cortou mal, para o meio da área. Leonel Sánchez chutou de esquerda e a bola bateu na trave direita de Gylmar. No rebote, Landa cabeceou por cima.
E os locais se decepcionaram logo aos nove minutos de bola rolando. Da esquerda, Zagallo ergueu a bola na área. Amarildo furou na tentativa de bicicleta e Vavá deixou para Garrincha. De fora da área, o ponta dominou e mandou uma bomba de perna esquerda no ângulo esquerdo do goleiro Misael Escuti, sem chance alguma de defesa.
Garrincha continuava a brilhar, aparecendo em todos os lados do ataque. Pouco depois, ele avançou pela direita e chutou cruzado para dentro da pequena área. A bola passou por todo mundo, até pelo goleiro chileno, mas a zaga recuperou e afastou o perigo. Claramente a marcação sobre Garrincha não estava funcionando. Para tentar parar o ponta direita, o técnico Fernando Riera havia escalado Manuel Rodríguez (mais forte e melhor na marcação individual) na lateral esquerda, ao invés de Sergio Navarro – que havia sido titular nas partidas anteriores.
Aos 21′, Vavá marcou o segundo, mas o árbitro Arturo Yamasaki anulou alegando impedimento. Foi a primeira de algumas decisões controversas do juiz peruano.
Mas nem fez muita diferença. Dez minutos depois, Zagallo cobrou escanteio de trivela da esquerda. Garrincha subiu mais que Rodríguez e, do bico da pequena área, cabeceou forte para dentro. Foi um lance muito semelhante ao gol de cabeça que o mesmo Mané havia marcado contra a Inglaterra três dias antes. Desde o princípio, o Chile já havia se mostrado vulnerável na bola aérea defensiva.
Mas a animada e esperançosa torcida local não se cansava de incentivar o seu time. E empurrado pela fanática torcida, o Chile não se dava por vencido. Jorge Toro recebeu na intermediária ofensiva e sofreu falta de Zito. O próprio Toro cobrou com perfeição e mandou no ângulo direito de Gylmar.
Os donos da casa foram para o segundo tempo na esperança de conseguir o empate, mas foram frustrados logo aos três minutos. Garrincha cobrou escanteio da direita. Vavá escapou da marcação, subiu nas costas de Raúl Sánchez e cabeceou para baixo. A bola quicou no chão e tomou o rumo do gol, sem chances para o goleiro (que foi com a mão mole na bola).
(Imagem: Barão Lhkz)
Mas a vantagem de dois gols não deixou o jogo mais fácil para o Brasil. O Chile passava a ter mais posse de bola.
No esforço de agradar ao time da casa, Yamasaki tomou outra de suas decisões discutíveis ao marcar um pênalti para o Chile aos 16′. Os brasileiros reclamaram muito, alegando que a bola teria batido na mão de Zózimo de forma involuntária. Nada adiantou. Leonel Sánchez cobrou rasteiro, no canto esquerdo e diminuiu para os chilenos. Gylmar nem pulou.
Mas Garrincha continuava a mandar no jogo. Em outra arrancada, Mané finalizou, mas o chute saiu fraco para uma defesa fácil do goleiro Escuti.
Somente aos 33′ o escrete canarinho respiraria aliviado. Em cobrança de falta da esquerda, Zagallo ergueu a bola na pequena área. Vavá, forte e sempre bem posicionado, apareceu entre Sánchez e Rodríguez e cabeceou para o gol. Curiosamente, Vavá se desgastou tanto nessa partida, que perdeu 3,5 kg.
E depois o jogo descambou para a violência. Aos 35′, Honorino Landa fez falta dura em Zito e acabou expulso.
Na tentativa de fazer o impossível e tentar parar Garrincha, Eladio Rojas utilizou todas suas “ferramentas”: pontapés, cotoveladas e dedos nos olhos. E o juiz foi complacente com tudo isso. E aos 39 minutos do segundo tempo, com o placar já definido, Garrincha levou outro pontapé de Rojas. Caiu e se levantou. De forma cômica, com todo o “estilo Garrincha de ser”, o Mané deu um peteleco de joelho na bunda de Rojas. O chileno se atirou ao chão, como se houvesse sido agredido brutalmente. Os chilenos acusaram o lance e cercaram o árbitro. Depois de consulta ao bandeirinha uruguaio Esteban Marino (que estava a um metro do lance), o juiz expulsou o brasileiro – que havia apanhado calado o jogo todo. Após sair de campo e enquanto caminhava junto à linha lateral, Garrincha foi atingido na cabeça por uma pedra atirada pela torcida (algumas fontes indicam que foi uma garrafa). Abriu-se um corte que precisou de pontos e o craque passou a noite com a cabeça enfaixada.
Mesmo com tudo isso, após o apito final, os craques brasileiros homenagearam a torcida chilena, para que ela ficasse ao seu favor na decisão. O Brasil estava em sua segunda final de Copa do Mundo consecutiva.
Com o resultado definido, a preocupação era outra. Garrincha seria punido e suspenso da final pela FIFA?
“Foi um pontapezinho de amizade” — afirmou o ingênuo Garrincha.
(Imagem: FIFA)
● Embora o regulamento da época não previsse a suspensão automática em caso de expulsão, a pressão dos chilenos era enorme para que isso acontecesse. A imprensa transformou a atitude pueril de Garrincha em uma agressão criminosa. A comissão disciplinar da FIFA se reuniu no dia seguinte para julgar o caso.
Foi feita uma força-tarefa na tentativa de absolver Garrincha. Representantes da CBD fizeram um amplo dossiê, baseando sua defesa no fato dele nunca ter sido expulso de campo. Tancredo Neves, primeiro-ministro brasileiro, passou um telegrama à comissão “em nome do povo brasileiro” pedindo perdão para o jogador. Até o presidente do Peru pediu ao árbitro para que não prejudicasse o craque brasileiro.
Mas o maior feito foi o “sumiço” do bandeirinha uruguaio Esteban Marino. O presidente da CBD, João Havelange, por intermédio do árbitro brasileiro João Etzel Filho, deu de presente a Marino um passeio de Santiago a Paris, saindo logo de manhã. Coincidentemente, antes do julgamento ocorrer.
E tudo ficou mais fácil quando a comissão disciplinar leu a súmula. O árbitro escreveu que “não viu a infração de Garrincha” e que seu auxiliar “tivera de viajar”, mas que lhe deixou um bilhete descrevendo a suposta agressão como um “revide típico de lance de jogo”. Assim, a agressão estava descaracterizada e Garrincha foi absolvido por 5 votos a 2, recebendo apenas uma advertência simbólica.
Cabe ressaltar que o mesmo Marino tinha sido bandeirinha na vitória do Brasil sobre a Espanha, quando o escrete canarinho foi beneficiado pela não marcação de um pênalti e por um gol sofrido incorretamente anulado, quando perdia por 1 a 0. “Coincidentemente”, um mês depois, Marino foi contratado como árbitro pela Federação Paulista de Futebol.
Mas possivelmente nem seria necessária toda essa proeza. Ninguém tinha interesse que um país comunista (Tchecoslováquia) vencesse a Copa. Além disso, a FIFA era grata ao Brasil por ter sediado a Copa de 1950, logo no pós-Guerra. Por isso e muito mais, a FIFA é historicamente “simpática” ao Brasil.
E se Garrincha foi absolvido, o chileno Landa foi suspenso para a decisão do bronze entre Chile e Iugoslávia. Mas, mesmo sem ele, o Chile venceu por 1 a 0. A festa pelo terceiro lugar tomou as ruas de Santiago e só parou no dia seguinte, poucas horas antes da final entre Brasil e Tchecoslováquia.
Três pontos sobre… … 12/06/2002 – Suécia 1 x 1 Argentina
(Imagem: UOL)
● A Argentina tentava se reerguer depois da pior crise econômica de sua história. Um dos raros alentos para o país era sua seleção, maior favorita para conquistar o título da Copa do Mundo de 2002 – juntamente com a França, então campeã da Europa e do mundo. Os portenhos fizeram a melhor campanha da história das eliminatórias sul-americanas, com 43 pontos, 13 vitórias, 4 empates e só uma derrota; foram 42 gols marcados e 15 sofridos (melhor ataque e melhor defesa). Terminou 12 pontos à frente do segundo colocado, o Equador. Estava invicta há 18 jogos, desde a derrota por 3 a 1 para o Brasil no Morumbi, em 26/07/2000. Mas, além de vencer, aquele time encantava em campo.
Muito bem treinada por Marcelo “El Loco” Bielsa, a albiceleste era armada em um 3-4-3 com ótima ocupação dos espaços. Era um time completo, com zagueiros fortes e de boa técnica (Pochettino, Samuel e Placente), os melhores laterais da história do país (Zanetti e Sorín), dois dínamos no meio campo (Simeone e Verón), dois pontas rápidos e habilidosos (Ortega e Kily González) e um goleador de respeito (Batistuta). Era uma base que jogava junta há muito tempo na seleção e contava com grande entrosamento.
Mas, justamente no Mundial, quando tudo deveria estar perfeito, o time desandou. No jogo de abertura do Grupo F, teve muito volume de jogo, mas venceu a Nigéria com um magro 1 a 0. Na partida seguinte, deu muitas brechas na defesa e perdeu para a Inglaterra por 1 a 0, com um gol de pênalti (e cheio de raiva) de David Beckham. Na rodada final, precisava vencer a Suécia para se classificar. Se empatasse, precisaria torcer para uma vitória por dois gols dos nigerianos sobre os ingleses.
Com dois técnicos, Lars Lagerbäck e Tommy Söderberg (coisa rara), a Suécia era uma equipe aplicada taticamente e composta de bons valores individuais. Havia um misto de experiência e juventude. Magnus Hedman, Patrik Andersson, Teddy Lučić e Henrik Larsson estavam presentes no elenco de 1994, que levou a seleção “Blågult” ao 3º lugar. E a jovem guarda era muito bem representada por um jovem reserva de 20 anos, chamado Zlatan Ibrahimović.
Nas duas primeiras rodadas, os suecos empataram com a Inglaterra (1 x 1) e venceram a Nigéria (2 x 1). Precisava de um empate contra os argentinos para se classificar.
A Argentina atuava no 3-4-3 consagrado por Marcelo “Loco” Bielsa. Dessa vez, com muitas mudanças na escalação.
A Suécia jogava no sistema 4-4-2 clássico, com muita aplicação tática.
● Insatisfeito com o rendimento dos jogos anteriores, “El Loco” Bielsa mudou quase meio time. Entraram Chamot, Almeyda, Pablo Aimar e Claudio López, nos lugares de Placente, Simeone, Verón e Kily González. Surpreendente mesmo foi a saída do capitão Verón, mesmo não atuando bem nas partidas anteriores.
O jogo começou com cautela de ambos os lados. Mas logo a Argentina começaria a demonstrar a sua superioridade técnica e a ditar o ritmo da partida. Mas os hermanos mostraram que não haviam aprendido com os erros da derrota anterior e continuaram insistindo nas jogadas pela linha de fundo. Até chegavam com perigo, mas erravam na finalização. Nos 90 minutos, foram 57 bolas erguidas na área sueca, consagrando a dupla de zaga Jakobsson e Mjällby.
Aos 13′, Zanetti foi à linha de fundo e cruzou da direita. Na pequena área, Sorín cabeceou o o goleiro Hedman espalmou.
Claudio López perdeu duas chances. Uma aos 29′, quando chutou para fora um cruzamento da direita. A outra foi pouco depois, ao receber na área e chutar de esquerda por cima.
Aimar tabelou com Ortega e deixou Batistuta livre para chutar cruzado. Ele encheu o pé, mas a bola foi para fora, assustando Hedman.
Próximo ao intervalo, o experiente atacante Claudio Caniggia xingou o bandeirinha e foi recebeu o cartão vermelho mesmo sem ter entrado em campo. Caniggia se tornou o primeiro jogador expulso do banco de reservas em toda a história das Copas. Foi praticamente uma viagem turística do veterano pela Ásia, já que não entrou em campo nem um minuto.
(Imagem: Tim De Waele / Getty Images)
O placar foi aberto aos 14 minutos do segundo tempo. Anders Svensson cobrou falta da intermediária com perfeição e acertou o canto direito. O goleiro Pablo Cavallero se esticou todo, chegou a tocar na bola, mas não conseguiu impedir o gol.
Aos 27, Verón (que entrou no lugar de Almeyda) cruzou na área, mas a bola passou por todo mundo.
Um pouco antes, Batistuta tinha dado lugar a Crespo. Uma das maiores críticas feitas a Bielsa e ao seu antecessor, Daniel Passarella, foi o fato de não deixarem Batistuta e Crespo em campo ao mesmo tempo em hipótese alguma. No primeiro tempo, joga “Batigol“; no segundo, entra “Valdanito”. Mesmo precisando fazer gols e contando com dois dos maiores goleadores do mundo na época, os treinadores não mantinham os dois centroavantes juntos em campo.
Sem a bola, os argentinos tinham dificuldade para retomá-la. Uma das ausências mais sentidas em campo foi do experiente zagueiro Roberto Ayala. Ele havia se lesionado no aquecimento contra a Nigéria e nem chegou a jogar durante o torneio.
Na necessidade de atacar a qualquer custo, a Argentina abriu a defesa. A Suécia respondeu nos contra-ataques em velocidade. Andreas Andersson cruzou rasteiro da esquerda. Pochettino tentou cortar e a bola explodiu no peito do goleiro Cavallero, evitando o gol contra.
Aos 32, Larsson partiu sozinho em um contragolpe e foi derrubado por Chamot. O árbitro Ali Bujsaim, dos Emirados Árabes Unidos, interpretou que o atacante sueco simulou a falta e lhe aplicou cartão amarelo. Foi um erro crasso. A falta aconteceu e resultaria na expulsão de Chamot, por ser o último defensor.
Mas a Argentina reagiu. Após cruzamento da esquerda, a zaga sueca afastou e Zanetti chutou forte da entrada da área. Hedman foi bem espalmou para fora.
Depois, Chamot invadiu a área pela direita e chutou de esquerda. A bola bateu no travessão, quicou na linha e não entrou.
Aos 39, Andersson penetrou na área portenha e tocou por cima na saída do goleiro. A bola tocou no travessão e não entrou.
A dois minutos do fim, Ortega entrou na área pela direita e se jogou na disputa com Mattias Jonson. O juiz marcou pênalti. O próprio Ortega bateu no canto esquerdo, Hedman defendeu e Hernán Crespo pegou o rebote para completar para o gol. O detalhe é que Crespo havia invadido a área antes da cobrança. Portanto o gol foi irregular – embora tenha sido validado pela arbitragem.
Mas não havia tempo para mais nada. Ex-favoritos, os argentinos choraram a eliminação ainda em campo.
(Imagem: FIFA)
● Como o jogo entre Inglaterra e Nigéria terminou sem gols, o empate garantiu a Suécia no primeiro lugar do “grupo da morte”.
Nas oitavas de final, a Suécia saiu na frente de Senegal, mas viu os africanos empatarem e vencerem na prorrogação (2 x 1) com um gol de ouro de Henri Camara. Foi uma campanha digna dos suecos. E uma vergonha a dos argentinos.
Marcelo Bielsa continuou como técnico da seleção argentina por mais dois anos e conquistou a medalha de ouro nos Jogos Olímpicos de Atenas, em 2004, com um time que tinha Roberto Ayala, Javier Mascherano, Kily González, Javier Saviola, Carlos Tévez e outros ótimos nomes.
Três pontos sobre… … 11/06/1958 – Brasil 0 x 0 Inglaterra
(Imagem: DPA / FourFourTwo)
● Em partida válida pela segunda rodada do Grupo 4, mais de quarenta mil pessoas estiveram presentes no estádio Nya Ullevi, em Gotemburgo, para assistir ao primeiro jogo oficial entre Brasil e Inglaterra.
Após a vitória de 3 a 0 sobre a Áustria, o Brasil liderava seu grupo com dois pontos. Na primeira rodada, Inglaterra e União Soviética haviam empatado por 2 a 2.
O futebol inglês ainda vivia o luto causado pelo desastre aéreo ocorrido no aeroporto de Munique no dia 06/02, que causou a morte de 23 dos 38 tripulantes, sendo oito jogadores do Manchester United. Entre os mortos, três atletas que certamente seriam titulares do English Team na Copa da Suécia: Roger Byrne (28 anos), capitão do Man Utd, que havia jogado o Mundial de 1954; Tommy Taylor (26 anos), grande artilheiro dos Red Devils e também veterano da Copa de 1954; e Duncan Edwards (21 anos), um jogador polivalente, adorado pelos ingleses e que – segundo a imprensa europeia – tinha potencial para ser o melhor do mundo. Os três foram perdas muito sentidas para o time formado pelo técnico Walter Winterbottom. Entre os sobreviventes, um garoto de 20 anos, Bobby Charlton, que esteva no elenco em 1958 e que lideraria a seleção campeã do mundo em 1966 (disputaria quatro Copas, entre 1958 e 1970).
(Imagem: Central Press / Hulton Archive / Getty Images)
● Como já contamos detalhadamente nesse outro texto (clique aqui para ler) a pacata cidade de Hindås foi o local escolhido para concentração da Seleção Brasileira na Copa do Mundo de 1958. A cerca de 300 metros estava hospedada também a delegação da União Soviética.
Na véspera do jogo contra a Inglaterra, o goleiro Gymar dos Santos Neves recebeu a visita do colega Lev Yashin. O arqueiro soviético falava um pouquinho de espanhol e alertou o brasileiro sobre o centroavante inglês Derek Kevan, que costumava entrar dando cotoveladas para quebrar os goleiros rivais. O “Aranha Negra” descobriu isso da pior maneira na partida anterior e sofreu com o jogo sujo do inglês – que também era acostumado a cuspir nos adversários.
Gylmar entrou em campo prevenido. Na partida, saía do gol com o joelho levantado para acertar os oponentes antes de ser acertado. Isso ajudou a manter o ataque inglês longe de sua área. Na época o futebol britânico era pouco criativo e tinha praticamente uma única jogada de ataque: os cruzamentos para a área adversária. Foi um jogo duro, muito sofrido. Kevan jogava sujo, mas era um grande jogador e deu muito trabalho à defesa brasileira.
Antes da partida, Feola recebeu informações sobre o forte sistema defensivo inglês e resolveu reforçar o ataque, com dois atacantes de ofício. Dida sentia dores no pé e não conseguia sequer chutar uma bola. Foi substituído por Vavá. Além disso, Pelé havia sido barrado pelo médico, o Dr. Hilton Gosling, por ainda estar com o joelho em tratamento.
O treinador brasileiro pretendia escalar uma equipe mais ofensiva do que na estreia e queria que Garrincha jogasse no lugar de Joel. Mas, outra vez, foi convencido do contrário pelo observador Ernesto Santos, que alertou que o lateral esquerdo Bill Slater era um jogador muito violento e que poderia atingir Garrincha e tirá-lo do restante da Copa. Segundo Ernesto, Slater era o “jogador mais perverso que já vira atuar”. A jogada desleal do inglês consistia em “pisar com força o calcanhar do adversário na corrida, prender-lhe o pé e embolar-se com ele na queda”. E, enquanto o juiz nem marcava falta, o ponta passava o resto do jogo fazendo número ou saía de campo para não mais voltar.
Joel foi escalado e orientado a buscar mais o jogo no meio ao invés de abrir pela ponta, evitando o confronto direto com Slater. Seguiu o posicionamento à risca na primeira etapa e quase marcou um gol – salvo em cima da linha por Billy Wright. Porém, no segundo tempo, o brasileiro se empolgou, deu uma sequência de dribles no inglês, recebeu uma pancada e saiu de campo com muitas dores.
Influenciado pelo técnico húngaro Béla Guttmann, de quem foi auxiliar no São Paulo FC, Vicente Feola escalou seu time no revolucionário sistema 4-2-4. Com o recuo voluntário de Zagallo, o esquema se transformava em um 4-3-3 sem a bola.
A Inglaterra ainda utilizada o velho sistema W-M, criado por Herbert Chapman em 1925.
● O Brasil deu o pontapé inicial. Mas logo nos primeiros segundos, quem atacou foi a Inglaterra. O ponta esquerda Alan A’Court avançou e tabelou com Johnny Haynes. O capitão Bellini cortou e Dino Sani aliviou o perigo.
No fim do primeiro tempo, Zagallo cruzou para a área e a bola sobrou para Joel, que chutou forte para boa defesa de McDonald. Eddie Clamp pegou a sobra e bateu para cima.
A Inglaterra partiu para o ataque. Johnny Haynes, tabelou com Kevan e chutou bem. Gylmar defendeu em dois tempos. Foi o lance mais perigoso dos ingleses nos 90 minutos.
O English Team soube fechar os espaços para Didi, evitando que a criação de jogadas passasse pelo astro brasileiro. Com isso, o Brasil não conseguiu criar muito e não faz gols.
O goleiro inglês Colin McDonald esteve em uma noite inspirada e fechou o gol. Ele fez várias defesas à queima roupa, especialmente de Mazzola, e viu o Brasil acertar a trave com Vavá.
Já no finzinho, foi Mazzola quem desperdiçou a melhor oportunidade do jogo, ao perder um gol embaixo da trave, finalizando por cima.
(Imagem: Pinterest)
● Essa partida ficou marcada por ter sido a primeira a terminar sem gols em toda a história das Copas, após 116 jogos. Como era uma situação inédita, alguns jogadores ficaram meio perdidos em campo, chegando a pensar que o árbitro alemão Albert Dusch daria uma prorrogação.
O placar soou como um alerta para a comissão técnica denunciou algumas deficiências no ataque brasileiro que não tinham sido percebidas na estreia. O terceiro jogo seria de “vida ou morte” e seria justamente contra os temidos soviéticos.
Três pontos sobre… … 10/06/1962 – Brasil 3 x 1 Inglaterra
(Imagem: FIFA)
● Em 1958, o Brasil se livrou do “complexo de vira-latas” e se sagrou campeão do mundo. Com Pelé e Garrincha no auge, era o favorito destacado à conquista do bicampeonato.
Na primeira fase, o English Team teve uma campanha irregular. No dia 31/05, perdeu na estreia para a Hungria por 2 a 1. Dois dias depois, venceu a Argentina por 3 a 1. Na última rodada, um empate sem gols com a Bulgária permitiu que os ingleses se classificassem no critério de saldo de gols. Empatadas com três pontos, a Inglaterra teve saldo de +1, enquanto a Argentina teve saldo de -1.
(Imagem: CBF)
● No escrete canarinho, uma preocupação era unanimidade: a ausência de Pelé. Ele até treinou com o grupo, mas não tinha condições de jogo. Comissão técnica, crítica especializada e torcida estavam inseguras com as chances de título sem o Rei. Mas outra coisa afligia discretamente a maioria: a má fase técnica de Garrincha.
Nos jogos anteriores, Mané teve um desempenho muito aquém do esperado e foi acusado injustamente de excesso de individualismo. Contra os mexicanos, esteve bem marcado e se omitiu do jogo, recebendo poucas bolas. Contra os tchecos, com Pelé lesionado e Vavá mal na partida, não tinha para quem cruzar. Contra a Espanha, só acertou uma boa jogada, que deu origem ao segundo gol de Amarildo.
Didi também não esteve bem na fase inicial. Mas, contra os ingleses, ele jogaria mais solto. Com sua visão de jogo, fez seus lançamentos, orientou o posicionamento da linha de frente, fechou os espaços no meio para revezar com Zito nas subidas ao ataque. Era uma passagem de bastão. Se Didi foi o líder em campo em 1958, Garrincha seria o astro na reta final em 1962.
O Brasil atuava como em 1958, em um falso 4-2-4, se transformando em um 4-3-3 com o recuo voluntário de Zagallo
O ultrapassado técnico inglês Walter Winterbottom se rendeu ao “moderno” sistema 4-2-4.
● Antes da partida, o nervosismo de alguns atletas era grande. Até o experiente Zagallo sofreu. Ele não conseguiu urinar no vestiário. Já em campo, depois de executados os hinos nacionais, lhe deu uma vontade incontrolável de fazer xixi. Como não podia sair correndo dali, chamou três jogadores e dois fotógrafos para fazer uma rodinha. Ele se agachou e se aliviou ali mesmo, no centro do gramado.
A Inglaterra, mesmo não jogando bem, sempre é um time a ser respeitado. A partida começou com muito equilíbrio de lado a lado, com os dois selecionados se estudando. Os brasileiros ainda se recordavam do jogo na Copa de 1958, quando o Brasil não conseguiu passar pela defesa inglesa e ficou em um empate sem gols.
Estava sendo um jogo muito bem disputado. Os dois goleiros, Gylmar e Ron Springett, haviam feito defesas importantes.
Mas o maior protagonista da partida, até então, tinha sido um cachorrinho preto que invadiu o campo no meio da partida. Ele driblou alguns jogadores e deu um “olé” em Garrincha. Só foi capturado pelo inglês Jimmy Greaves, que ficou de quatro e foi se aproximando do bichinho no meio campo até agarrá-lo. Pouco depois, outro cão entrou no gramado, mas este não foi pego. Depois de desfilar rapidamente pelo gramado, ele passou por baixo do alambrado e desapareceu por conta própria.
● Garrincha era um driblador nato, brilhante na técnica, mas irresponsável taticamente. Costumava jogar fixo pela ponta direita e não entrava em diagonal. Mas, contra os ingleses, fugiu de seu padrão: saiu de sua posição, se infiltrou pelo meio e até pela esquerda, desempenhando tarefas que caberiam aos outros. Foi o responsável pelos três gols brasileiros, que decidiram uma partida complicada. Garrincha sabia e podia fazer de tudo. Provou isso naquele dia 10/06.
E foi ele quem abriu o placar para o Brasil. Aos 31 minutos de jogo, Zagallo cobrou escanteio de trivela da esquerda. Garrincha veio livre de trás e subiu mais que Maurice Norman (mais alto que ele) para cabecear forte para o gol. Um raro gol de cabeça de Garrincha.
Sete minutos depois, Johnny Haynes cobrou falta da direita para dentro da área. Jimmy Greaves cabeceou para o gol. A bola encobriu Gylmar, bateu na trave e sobrou limpa para Gerry Hitchens completar para o gol vazio e empatar o jogo.
Aos 8′ do segundo tempo, o Brasil tinha uma falta para bater, em uma posição perfeita para a cobrança de Didi. Mas Garrincha foi mais rápido e chutou com violência. A bola passou pela barreira. O goleiro Ron Springett não conseguiu segurar e espalmou para frente. Vavá só aproveitou e escorou de cabeça para fazer seu primeiro gol na Copa.
No minuto 14′, a Inglaterra tentou a bola longa, mas Mauro aparou de cabeça e deixou com Didi. O “Príncipe Etíope” lançou rasteiro para Amarildo na esquerda. O “Possesso” só ajeitou a bola para Garrincha, que chutou de fora da área. A bola fez uma curva, como se fosse a famosa “folha seca” de Didi, e foi no ângulo. Springett se esticou todo, mas não conseguiu defender. Na comemoração, Mané brincou com Didi: “Viu? Não é só você que sabe chutar assim”.
Segundo algumas fontes, Garrincha poderia ter marcado o “hat-trick” se o goleiro Springett não tivesse defendido um pênalti cobrado por ele, aos 21 minutos da etapa final.
Com dribles desconcertantes e jogadas decisivas, o “Anjo das Pernas Tortas” infernizava seus marcadores e levava ao delírio os 18.715 expectadores do estádio Sousalito, em Viña del Mar.
(Imagem: Candangol)
● “Preparamos nossos rapazes durante quatro anos para enfrentar times de futebol. Não esperávamos um jogador como Garrincha.” — Walter Winterbottom, técnico inglês, eliminado por Garrincha.
Após a consagradora exibição do ponta direita brasileiro, um jornal chileno publicou em manchete: “Garrincha, de qual planeta você vem?”
Naquele mesmo dia 10/06, o Chile estava em festa. Sua seleção havia se classificado para as semifinais ao vencer a União Soviética por 2 a 1. A notícia ruim? O adversário seria o Brasil, do “extra-terrestre” Garrincha.
Três pontos sobre… … 09/06/1990 – Itália 1 x 0 Áustria
(Imagem: Barcalcio)
● Depois de vencer a Copa do Mundo de 1982, a Itália soube capitalizar muito bem esse sucesso. Nos anos seguintes, os clubes do país contrataram os principais talentos do futebol mundial. A Juventus trouxe Michel Platini e Zbigniew Boniek. A Udinese tirou Zico do Flamengo. A Roma já tinha Falcão e trouxe Toninho Cerezo. Júnior foi para o Torino. A Internazionale comprou Karl-Heinz Rummenigge. A Fiorentina fechou com Sócrates. O Verona foi atrás de Hans-Peter Briegel. E até o pequeno Napoli conseguiu sua estrela: Diego Armando Maradona, que não estava bem no Barcelona. Exceções feitas aos espanhóis (pelo futebol forte e capitalizado) e aos soviéticos (que eram impedidos de deixar seu país), em meados da década de 1980, praticamente todos os grandes futebolistas do planeta estavam desfilando em gramados italianos. Com uma constelação dessa imponência no Calcio, até a Rede Globo ousou transmitir o Campeonato Italiano ao vivo na temporada 1984/85.
Com esse sucesso, os políticos italianos demonstraram o interesse de seu país em ser sede da próxima Copa a ser disputada na Europa. A Itália já tinha sido anfitriã no segundo Mundial, em 1934, e a FIFA estava relutante em repetir um país sede. Mas o precedente do México em 1986 abriu as portas para o sucesso italiano.
A FIFA, vendo como iminente queda da “Cortina de Ferro” e a consequente implosão da União Soviética (maior adversária dos italianos no pleito), decidiu pelo país que tinha mais tradição, o melhor campeonato nacional do mundo e melhor infraestrutura turística. E a Itália se tornou novamente sede da Copa – dessa vez sem a influência do fascismo.
Foram reformados nove dos doze estádios que sediaram jogos, incluindo o Olímpico de Roma e o San Siro, em Milão. O Luigi Ferraris, de Gênova, foi demolido e reconstruído. Turim e Bari ganharam estádios novos: Delle Alpi e San Nicola, respectivamente.
A FIFA dirigiu o sorteio do chaveamento, de forma a evitar o desequilíbrio. Cada grupo tinha pelo menos duas equipes de bom nível, sendo que até três times poderiam se classificar para as oitavas de final. Esse direcionamento impediu que houvessem grupos fracos e também os chamados “grupos da morte”.
Em 1990, a Áustria disputou três amistosos preparatórios. Em 28/03, venceu a Espanha de virada por 3 a 2, em Málaga, após estar perdendo por 2 a 0. Em 11/04, em Salzburg, goleou a Hungria por 3 a 0. No dia 30/05, em Viena, derrotou a fortíssima Holanda por 3 a 2. Esses resultados elevaram o moral dos austríacos. Para a crítica especializada, o time deixou de ser a “terceira força do Grupo A” e passou a ter “razoáveis chances de chegar entre os oito finalistas”. Mas, para os austríacos, um empate na estreia já seria um ótimo resultado.
A Itália causava desconfiança à sua torcida após o resultado de três partidas amistosas. Em fevereiro, empatou sem gols com a Holanda, em Roterdã. Em março, venceu a Suíça por 1 a 0, em Basel. No dia 30/05, em Perugia, empatou sem gols com a Grécia. Em três jogos, marcou um gol e não sofreu nenhum. E aparentemente era isso que a Squadra Azzurra tinha a oferecer na Copa: uma defesa intransponível e um ataque estéril.
Azeglio Vicini montou a Itália no sistema 4-4-2 com Franco Baresi como líbero.
Josef Hickersberger armou a Áustria no 5-3-2.
● Todavia, com a bola rolando, a Itália surpreendeu a todos e partiu para cima, deixando de lado sua prudência costumeira e criando inúmeras oportunidades. Porém, não foi feliz nas finalizações.
O primeiro tempo poderia ter terminado com o placar dilatado, se Andrea Carnevale (várias vezes), Gianluca Vialli, Carlo Ancelotti (acertou a trave) e Roberto Donadoni não tivessem desperdiçado chances preciosas. Donadoni perdeu o gol mais feito: ele estava dentro da pequena área e chutou por cima, com o gol vazio. Os atacantes sofriam com a ansiedade e nervosismo para definir logo as jogadas. Faltava pontaria.
Vialli perdeu outro gol fácil no início do segundo tempo, na oitava finalização italiana no jogo. Com 23 anos, o talentoso Roberto Baggio permaneceu no banco os 90 minutos.
Daí em diante, a Áustria conseguiu estabelecer um certo equilíbrio na partida, trocando passes e tirando a velocidade das jogadas. Mas, muito bem marcado, o artilheiro Toni Polster pouco conseguia fazer.
E, aos 30 minutos, o técnico Azeglio Vicini trocou o inoperante Carnevale (que errou quatro finalizações) por Salvatore “Totò” Schillaci – um artilheiro implacável atuando pelo Messina na Série B, que havia chegado à Juventus um ano antes e sido autor de 12 gols em 30 jogos na Série A de 1989/90. Aos 25 anos, era seu segundo jogo pela seleção. Era praticamente um desconhecido do grande público. E que se tornou celebridade apenas três minutos após entrar em campo.
Aos 33′, Vialli avançou até a linha de fundo e cruzou da direita. Praticamente em seu primeiro toque na bola, Schillaci (1,75 m) saltou entre os gigantes Ernst Aigner (1,94 m) e Robert Pecl (1,89) para cabecear a bola para o fundo do gol de Lindenberger.
Em um jogo duro, a Itália conseguiu a vitória graças a “Totò” Schillaci, o novo xodó da torcida italiana. Salvatore foi o salvador da Itália.
São João Paulo II: o Papa na Copa (Imagem: FIFA)
● Esse foi o único jogo da história das Copas que contou com a presença de um Papa. Antes da partida, São João Paulo II desfilou de papamóvel pela pista de atletismo do estádio Olímpico de Roma e depois leu um breve discurso na tribuna de honra, enaltecendo a importância dos atletas para que sirvam de modelo aos jovens de todo o mundo, “como líderes, e não como ídolos”.
Curiosamente, em sua juventude em Wadowice (a 50 km de Cracóvia), o polonês Karol Wojtyła brincava de ser goleiro e era elogiado pelo porte físico, coragem e disciplina em campo.
Mas o Papa sabia que naqueles dias o catolicismo ficaria em segundo plano na Itália, perdendo para a principal religião do mundo: o futebol. Tanto sabia, que adiantou o horário da tradicional procissão de Corpus Christi para que os fiéis pudessem assistir o jogo entre Itália e Estados Unidos.
E para tentar atender o maior número possível de fiéis turistas durante Copa, o Vaticano rezava missas em cinco idiomas: italiano, inglês, espanhol, alemão e francês.
(Imagem: Bob Thomas / Getty Images)
● Na sequência, a Áustria perdeu para a Tchecoslováquia por 1 a 0 e venceu os Estados Unidos por 2 a 1. Foi eliminada na primeira fase, com apenas dois pontos.
A Itália pegou embalo e, nas partidas seguintes, venceu os EUA por 1 a 0 e a Tchecoslováquia por 2 a 0, terminando a fase de grupos com 100% de aproveitamento. Nas oitavas de final, eliminou o Uruguai (2 x 0). Nas quartas, teve dificuldade para vencer a Irlanda por 1 a 0. Na semi, a Azzurra sofreu seu primeiro gol no torneio e empatou com a Argentina por 1 a 1, mas perdeu nos pênaltis por 4 a 3. Como consolo, conquistou o 3º lugar ao vencer a Inglaterra por 2 a 1.
“Totò” Schillaci se sagrou o artilheiro da Copa com seis gols e foi eleito o melhor jogador do torneio.
Três pontos sobre… … 08/06/1990 – Camarões 1 x 0 Argentina
Omam-Biyik deu um salto acrobático para marcar o gol camaronês (Imagem: UOL)
● A seleção argentina tinha vencido duas das três últimas Copas do Mundo, mas claramente não era a mesma de quatro anos antes. Fracassou na Copa América que sediou, em 1987, mesmo ainda tendo o time base de um ano antes. O novo fracasso na Copa América de 1989, organizada e vencida pelo Brasil, levou os argentinos a chegarem com menos cartaz na Itália, no Mundial de 1990. A bem da verdade, cada vez mais eles dependiam de Diego Armando Maradona. Entre o fim da Copa de 1986 e o início do Mundial de 1990, os portenhos jogaram 31 vezes e conseguiram apenas seis vitórias. Mas Diego motivou o time, dizendo: “vão ter que arrancar a Copa de nossas mãos”. Ao final das contas, aos trancos e barrancos, ainda era a Argentina.
No Mundial de 1990, dos 22 selecionados pelo técnico Carlos Bilardo, apenas sete eram remanescentes do título de 1986 e cinco deles entrariam em campo na estreia, contra Camarões: o goleiro Nery Pumpido, o zagueiro Oscar Ruggeri, o volante Sergio Batista, o meia Jorge Burruchaga e o gênio Maradona. Os dois reservas campeões eram os alas Ricardo Giusti e Julio Olarticoechea.
A única esperança argentina era em Maradona. Apenas 15 dias antes, ele havia deixado o sul da Itália em festa ao liderar o Napoli à conquista de seu segundo scudetto em quatro anos (os únicos na história dos partenopei). Sempre protagonista, a simples presença do camisa 10 poderia fazer a diferença para os hermanos. Mas ele não estava fisicamente bem e jogou a Copa toda com fortes dores nos tornozelos.
No mesmo dia 08 de junho, poucas horas antes da partida, o presidente argentino Carlos Menem se reuniu com os jogadores e o técnico Bilardo. Nesse encontro, Menem outorgou a Maradona um passaporte oficial e o nomeou assessor do governo para “assuntos desportivos e difusão da imagem argentina no exterior”. Diego aceitou e ficou emocionado com a nomeação. Mas, em março de 1991, ele foi pego no exame antidoping com cocaína em uma partida com o Napoli e foi suspenso do futebol até 30 de junho de 1992, em caso que gerou enorme repercussão mundial. Em 25/04/1991, Menem assinou um novo decreto que revogava o anterior e retirada a designação diplomática de Maradona.
Maradona não estava bem fisicamente e apanhou o jogo todo (Imagem: ESPN)
● O Grupo B era realmente o mais difícil a Copa. Era formado pela campeã mundial Argentina, a campeã olímpica União Soviética, a Romênia do craque Gheorghe Hagi e Camarões, vencedor da Copa Africana de Nações dois anos antes.
A campanha invicta de Camarões em 1982 ainda estava viva na memória dos amantes do futebol alternativo. Alguns veteranos permaneceram, como o goleiro Thomas N’Kono e o atacante Roger Milla.
Com 38 anos, o “velhinho” Milla havia se retirado da seleção em 1988 e estava à beira da aposentadoria. Mas recebeu um convite do presidente de Camarões, Paul Biya (seu amigo pessoal) e retornou à convocatória dos “Leões Indomáveis” para disputar o Mundial de 1990. Sem o mesmo fôlego dos garotos, Milla normalmente entrava nas partidas no início do segundo tempo. Ainda sim, anotou quatro gols durante a competição e se tornou um dos destaques da Copa.
O técnico soviético Valery Nepomnyashchy escalou seu time em uma espécie de 4-2-3-1. Sem a bola, Victor N’Dip (o mais fraco do grupo) se transformava em líbero. Com a bola, os meias avançavam em velocidade. No ataque, Omam-Biyik recebia a companhia de Roger Milla no segundo tempo de todas as partidas.
Carlos Bilardo mandou sua equipe ao campo no 3-5-2, com forte proteção ao sistema defensivo e liberdade para Burruchaga e Maradona criarem.
● Um desfile de modas abriu a competição antes da partida inaugural, no estádio San Siro, em Milão – capital da moda. No jogo de abertura, a expectativa era de um duelo entre um dos favoritos ao Mundial contra um mero coadjuvante. Assim como na abertura da Copa de 1982, quando também defendia o título, a Argentina foi a campo como favorita. E, assim como em 1982 (1 a 0 para a Bélgica), também perderia a partida.
Em poucos minutos de bola rolando, os camaroneses mostraram que seriam adversários duros de serem batidos. Sua defesa era um misto de um pouco de ingenuidade e muito de violência. Com apenas nove minutos de jogo, o beque Benjamin Massing recebeu o primeiro cartão da Copa por dar um bico por trás no tornozelo já baleado de Maradona. Os “Leões Indomáveis” não eram nada dóceis.
Em compensação, o ataque dos africanos era ágil e liso e a defesa argentina também apelava para as faltas. Assim, enquanto as bordoadas se seguiam de lado a lado, os primeiros 45 minutos de passaram e nenhuma das equipes conseguiu criar chances reais de gol.
No intervalo, o técnico Carlos Bilardo desfez o sistema 3-5-2 argentino, colocando o rápido atacante Claudio Caniggia no lugar do veterano zagueiro Oscar Ruggeri.
E na etapa final, a situação ficou mais favorável aos sul-americanos quando o volante André Kana-Biyik foi expulso aos 16′ por derrubar Caniggia por trás e matar um contra-ataque argentino. Mas, mesmo com dez atletas, Camarões continuou correndo e batendo. E o jogo começava a ganhar cara de 0 x 0.
(Imagem: Globo)
Mas o gol saiu aos 22 minutos do segundo tempo. Após cobrança de falta da esquerda para a área albiceleste, Makanaky disputou com Lorenzo e jogou a bola para cima. Sensini ficou só olhando e não viu a aproximação de Omam-Biyik. O camisa 7 se deslocou do meio para a esquerda e deu um salto acrobático, entortando o corpo no ar e conseguindo cabecear na direção do gol. A bola foi em cima de Pumpido e parecia fácil de ser defendida, mas o goleiro vacilou. A bola passou entre suas mãos e tocou seu joelho antes de entrar lentamente no canto direito.
Um gol estranhíssimo. Um verdadeiro frango. Mas a falha de Pumpido não tira o mérito do salto impressionante de Omam-Biyik. Com 1,84 m de altura, ele alcançou a bola a 2,60 do chão. Curiosamente, o autor do gol jogava no modestíssimo Stade Lavallois, 4º colocado da 2ª Divisão da França na temporada 1989/90. François Omam-Biyik é irmão de André Kana-Biyik, o volante expulso seis minutos antes do gol.
Nos 20 minutos restantes, a Argentina se lançou de vez ao ataque. O atacante Gabriel Calderón entrou no lugar do ala Roberto Sensini. Mas os hermanos não conseguiram acertar um mísero chute na direção do gol do lendário Thomas N’Kono.
Aos 42′, Massing também foi expulso por derrubar Caniggia. O argentino recebeu uma bola ainda em seu campo de defesa e disparou para o ataque. Camarões se postava de forma compacta, com o time quase todo no meio campo. Em uma corrida impressionante, “El Pájaro” Caniggia deixou dois marcadores para trás e já estava na intermediária ofensiva, quando Massing lhe acertou em cheio. A truculência foi tamanha que a chuteira do camaronês voou longe. O árbitro Michel Vautrot expulsou corretamente o infrator, pois – além da violência – Massing era o último defensor. Trocou uma chance de gol pela falta. De forma até engraçada, o atabalhoado juiz francês mostrou o cartão vermelho a Massing antes de mostrar o segundo amarelo.
Com nove jogadores, Camarões precisou resistir por mais três minutos para provocar a primeira grande “zebra” da Copa. A comemoração dos africanos é o reflexo da surpresa e alegria do time. Foi um resultado realmente inesperado.
(Imagem: Globo)
● No fim da partida, Maradona percebeu ter perdido no gramado um anel que havia ganhado de sua esposa Cláudia em seu último aniversário, e que valia cerca de US$ 5 mil. O anel foi encontrado pouco depois.
Após aprontar contra a Argentina, Camarões venceu também a Romênia por 2 a 1 com dois gols de Roger Milla. Já classificado, foi goleado pela já eliminada União Soviética por 4 a 0. Terminou como líder do grupo B com quatro pontos. Em um jogo empolgante e só decidido na prorrogação, venceu a forte Colômbia por 2 a 1 (com uma falha do goleiro colombiano René Higuita e dois gols de Milla). Nas quartas de final, deu muito trabalho para a Inglaterra, vendendo caro a derrota. Só perdeu na prorrogação, com um gol de pênalti de Gary Lineker (o placar foi 3 a 2). Mas ficou na história como (até então) a melhor campanha de uma seleção africana na história dos Mundiais. Foi a primeira equipe de seu continente a chegar às quartas de final. Seria igualada por Senegal em 2002 e por Gana em 2010.
A Argentina somente passou de fase por ter sido uma das melhores terceiras colocadas, com três pontos. No Grupo B, após perder para Camarões, venceu a União Soviética por 2 a 0 e empatou com a Romênia por 1 a 1. Nas oitavas de final, jogou pior, mas venceu o clássico com o Brasil graças a uma jogada mágica de Maradona e uma linda conclusão de Caniggia. Nas quartas, contou com a estrela do goleiro Goycochea, que pegou duas cobranças na vitória por pênaltis por 3 a 2 sobre a Iugoslávia. Nas semifinais, após um empate por 1 x 1 com a anfitriã Itália, Goycochea pegou outras duas cobranças e a Argentina venceu nos pênaltis por 4 a 3. Na decisão, já no fim da partida, um pênalti polêmico resultou na derrota para a Alemanha Ocidental por 1 a 0 e no vice-campeonato.
Caniggia entrou bem e deu outra cara à Argentina. Se tornou titular nas partidas seguintes (Imagem: OCacifoDoRaúl)
Três pontos sobre… … 07/06/1934 – Alemanha 3 x 2 Áustria
(Imagem: Yahoo)
● Em sua primeira Copa do Mundo, a inexperiente e (até então) pouco expressiva seleção da Alemanha surpreendeu e conquistou o terceiro lugar. Eliminou a Bélgica com uma vitória por 5 a 2 nas oitavas. Nas quartas, bateu o bom time da Suécia por 2 a 1. Na semifinal, teve desfalques importantes e duas falhas do goleiro Willibald Kreß foram cruciais para que a Tchecoslováquia vencesse por 3 a 1.
Na decisão do 3º lugar, os dois países vizinhos se enfrentariam. Com a mesma origem germânica, com culturas semelhantes que praticamente se misturavam, dividem o alemão como o mesmo idioma. E algo mais era comum aos dois, que gerou discórdia desde antes do apito inicial.
Antigamente, era comum que as seleções viajassem para disputar uma Copa do Mundo levando somente o uniforme principal, ignorando a possibilidade de que suas cores poderiam coincidir com as do adversário. E isso aconteceu nessa partida. As duas equipes entraram em campo com seu uniforme tradicional: camisa branca e calção preto. Após muita discussão, os capitães Fritz Szepan e Johann Horvath não chegaram a um acordo sobre quem deveria se trocar. Assim, o jogo começou com as duas seleções vestindo branco. Como não poderia deixar de ser, a confusão foi enorme e a Alemanha abriu o placar. Só após isso, os austríacos acabaram mudando de ideia e pediram permissão para trocar as vestimentas. Um dirigente do Napoli, a equipe local, ofereceu a camisa do clube, que foi prontamente aceita. Com isso, os austríacos ganharam a simpatia da torcida napolitana.
(Imagem: Popper Foto / FIFA)
● O técnico alemão Otto Nerz teve problemas para escalar sua equipe. Entre deserções e lesões durante o torneio, ele tinha apenas dez atletas à disposição para a última partida. Como as regras da FIFA não eram tão rígidas, Nerz convocou de última hora o defensor Reinhold Münzenberg, que estava na Alemanha. Münzenberg havia atuado quatro vezes com a camisa da “Nationalelf”, inclusive nas eliminatórias. Ao receber o chamado, o jogador telefonou para o hotel onde se hospedava a delegação alemã e conversou diretamente com o até então auxiliar técnico Sepp Herberger. Ele explicou que não poderia viajar à Itália por estar de casamento marcado no mesmo dia do jogo. Herberger insistiu e convenceu Münzenberg: “Uma data de casamento pode ser adiada, mas um Mundial, não”. Curiosamente, Münzenberg estaria no elenco de sua seleção também em 1938.
Uma das ausências no escrete alemão foi o meia Rudolf Gramlich. Após a vitória de sua seleção sobre a Suécia por 2 x 1, ele recebeu a notícia de que a fábrica de sapatos na qual trabalhava, em Frankfurt, como curtidor tinha sido confiscada pelas autoridades nazistas. Como o futebol alemão era amador e a fábrica era seu único emprego remunerado, ele abandonou a Copa para tentar ajudar seus patrões judeus a salvar a empresa. Nem sua boa reputação representando seu país no Mundial foi suficiente e ele não conseguiu impedir a prisão e posterior morte de seus patrões. Algum tempo depois, Gramlich se tornou militar do exército nazista.
Otto Nerz era um adepto do sistema W-M, recém criado na Europa. O esquema tático reforça melhor o sistema defensivo e dá enfâse ao trabalho do meio de campo.
A Áustria de Meisl jogava em uma adaptação do 2-3-5 chamada “Sistema Danubiano”, que consistia na maior aproximação dos homens do ataque, com muitas tabelas e toques rápidos. Sem Sindelar, lesionado, faltou movimentação ao ataque.
● Historicamente, a Áustria levava ampla vantagem. Mas isso não se traduziu em campo em Nápoles, no estádio Giorgio Ascarelli – que viria a ser destruído por bombardeios na Segunda Guerra Mundial.
Matthias Sindelar, conhecido como “Der Papierene” (“Homem de Papel”) pelo seu físico magro, leveza e mobilidade, estava lesionado e não pôde jogar. Em campo, a Áustria demonstrou que dependia muito do estilo de jogo de seu astro para que todo o time funcionasse.
A Alemanha teve sorte ao marcar um gol logo aos 25 segundos de jogo, com Ernst Lehner. Na época, foi o gol mais rápido da história das Copas.
Edmund Conen marcou seu quarto gol no Mundial e fez 2 a 0 aos 27′.
A Áustria diminuiu três minutos depois com o capitão Johann Horvath.
Mas pouco antes do intervalo, Lehner marcou de novo e aumentou a vantagem.
No segundo tempo, a Áustria cresceu em campo. O zagueiro Karl Sesta ainda descontou aos 9′.
Mas foi pouco. A derrota seria o canto de cisne do “Wunderteam”.
(Imagem: Impromptuinc)
● Quatro anos depois, a seleção austríaca ainda tinha jogadores remanescentes do “Wunderteam”. Se classificou com tranquilidade nas eliminatórias, mas não pôde disputar a Copa do Mundo de 1938.
Na véspera do torneio, a Europa estava às portas da Segunda Guerra Mundial, que ocorreu oficialmente entre 1939 e 1945. E o conflito político interferiu diretamente no Mundial organizado pela França.
No dia 11/03/1938, a Alemanha nazista deu um choque no mundo ao anexar a Áustria ao seu território, em um processo chamado “Anschluss” (“anexação”, em alemão). Assim, a Áustria deixou de existir como nação independente. Com isso, o “Wunderteam” teria jogadores “prestando serviços” à seleção alemã – foi o que a federação germânica comunicou à FIFA, sem mais delongas. A invasão piorou as relações diplomáticas no continente. A FIFA tentou ignorar o caso ao máximo. Para tentar contornar a situação, a entidade convidou a Inglaterra a ocupar a vaga austríaca, mas o “English Team” – sabiamente – declinou o convite.
Sem time contra quem jogar, a Suécia (adversária da Áustria) se classificou automaticamente para as quartas de final. Até hoje esse é o único W.O. da história das Copas do Mundo.
Já comandada pelo lendário Sepp Herberger, a seleção alemã contou com nove atletas nascidos na Áustria: o goleiro Rudolf Raftl, o zagueiro Willibald Schmaus, os meias Hans Mock, Stefan Skoumal e Franz Wagner, além dos atacantes Wilhelm Hahnemann, Leopold Neumer, Hans Pesser e Josef Stroh. Desses nove, quatro faziam parte do elenco austríaco na Copa de 1934: Raftl, Schmaus, Wagner e Stroh.
Mas, mesmo com esses “reforços”, a “Nationalelf” foi eliminada na primeira fase. Com cinco deles em campo (Raftl, Schmaus, Hahnemann, Pesser e Mock – o capitão), empatou com a Suíça em 1 a 1. Na partida desempate, novamente eram cinco atletas nascidos na Áustria (Raftl, Skoumal, Hahnemann, Neumer e Stroh). Dessa vez, a Alemanha perdeu de virada por 4 a 2, depois de estar vencendo por 2 a 0.
Matthias Sindelar, melhor jogador de seu país em todos os tempos, se recusou a defender a seleção da Alemanha. Ele faleceu em 23/01/1939, pouco depois de sua esposa. A versão oficial é que ele se matou. A história romântica diz que ele “foi suicidado” pelo regime nazista por ser judeu.
A Áustria teve outros bons times, como o que conquistou o 3º lugar na Copa de 1954, mas nunca mais formou uma seleção de classe mundial como foi o “Wunderteam” da década de 1930 – destruído por Adolf Hitler e cia.