Três pontos sobre… … 20/07/1966 – União Soviética 2 x 1 Chile
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● O Chile se classificou para a Copa do Mundo de 1966 através do Grupo 12 das eliminatórias. Teoricamente seria uma chave fácil, com os fragilizados Colômbia e Equador.
Os colombianos até haviam disputado o Mundial anterior, mas houve uma cisão no futebol do país na época. Os clubes mais fortes e ricos formaram uma liga à parte, considerada “pirata”, pois não era filiada à federação nacional e tampouco à FIFA. Por isso, apenas um jogador da liga pirata atuou pela seleção – o atacante Antonio Rada.
Algo semelhante aconteceu com o Equador: houve um conflito entre as ligas de Guayaquil e Quito, com os times da capital se recusando a fornecer jogadores para a seleção equatoriana.
A seleção chilena era forte e contava com nove jogadores que tinham alcançado o 3º lugar na Copa de 1962: o goleiro Adán Godoy, os defensores Luis Eyzaguirre e Humberto Cruz, o meia Alberto Fouillioux e os atacantes Jaime Ramírez, Armando Tobar, Carlos Campos, Honorino Landa e Leonel Sánchez.
E o Chile começou bem, goleando a Colômbia por 7 x 2 em casa. Depois, perdeu fora para os mesmos colombianos por 2 x 0 (dois gols de Rada). Os dois jogos contra o Equador resultaram em um empate fora (2 x 2) e uma vitória em casa (3 x 1).
Com chilenos e equatorianos empatados em número de pontos, a vaga foi decidida em uma partida desempate, em Lima, no Peru. Leonel Sánchez e Rubén Marcos marcaram para o Chile e Romulo Gómez descontou para o Equador. Com esse resultado, o Chile estava de volta à disputa de uma Copa do Mundo.
(Imagem: Alamy)
● Por sua vez, a União Soviética conseguiu a sua vaga facilmente no Grupo 7 do qualificatório. Em seis partidas, foram cinco vitórias (3 x 1 e 4 x 1 na Grécia; 6 x 0 e 3 x 1 na Dinamarca; e 2 x 1 sobre o País de Gales) e apenas uma derrota (1 x 2 para os galeses, em Cardiff).
O lendário treinador Gavriil Kachalin, campeão olímpico em 1956 e europeu em 1960, deu lugar a Nikolai Petrovich Morozov, do Torpedo Moscou. Ele deixou de lado o famoso “futebol científico” – liderado pelo meia Igor Netto e pelo atacante Valentin Ivanov – e simplificou o estilo de jogo. E fez testes, utilizando 24 jogadores diferentes nos seis jogos das eliminatórias.
Mas a base do time ainda era a mesma, com o histórico goleiro Lev Yashin, os defensores Albert Shesternyov e Leonīds Ostrovskis, os meias Valery Voronin, Viktor Serebryanikov e Yozhef Sabo, além dos atacantes Slava Metreveli, Igor Chislenko e Galimzyan Khusainov.
As duas seleções jogavam no sistema 4-2-4.
● Nas duas primeiras rodadas da Copa, pelo Grupo 4, o Chile perdeu para a Itália por 2 x 0 e empatou com a Coreia do Norte por 1 x 1. Na defesa da seleção chilena já se destacava um garoto de 19 anos que viria a fazer história no futebol: Elías Figueroa.
Por sua vez, a URSS já estava classificada com quatro pontos, com vitórias por 3 x 0 sobre a Coreia do Norte e 1 x 0 em cima da Itália.
No dia anterior, a Coreia do Norte tinha vencido a Itália por 2 x 1, em uma das maiores zebras da história das Copas. Os chilenos tinham 01 ponto, contra 03 dos norte-coreanos. Com esse resultado, bastava uma vitória de 1 x 0 sobre a URSS para o Chile se classificar pelo critério do goal average. Isso já havia acontecido nas quartas de final do Mundial anterior (vitória chilena por 2 x 1).
O técnico soviético até deu uma certa ajuda para que isso acontecesse, escalando um time bem alternativo, poupando vários titulares. Mas o time reserva da URSS tinha bons jogadores, que queriam provar que poderiam seguir no time principal e jogaram como se fosse uma decisão.
O Chile pressionou o jogo inteiro. Mas foi a URSS que abriu o placar aos 28′ em um contra-ataque. Valery Voronin chutou, a bola bateu no peito de Aldo Valentini e sobrou para Valeriy Porkujan mandar no ângulo esquerdo do goleiro Juan Olivares.
O Chile empatou quatro minutos depois. O capitão Leonel Sánchez bateu falta, Anzor Kavazashvili deu rebote e Valentini cabeceou na trave. A bola voltou e Guillermo Yávar chutou. Rubén Marcos apareceu na pequena área, se antecipou ao goleiro e mandou para o gol.
Os sul-americanos continuavam em busca do gol que lhes dariam a classificação. Chegaram a ter um gol anulado pelo árbitro norte-irlandês John Adair, em lance que Honorino Landa fez falta no goleiro antes de marcar de cabeça.
O golpe final veio a cinco minutos do fim. Kavazashvili despachou a bola para a frente. Ela quicou, enganou a defesa e chegou até Porkujan, que tocou por cobertura e fechou o placar em 2 x 1 a favor dos soviéticos.
(Imagem: Alamy)
● Com esse resultado, o Chile estava eliminado na primeira fase. A Coreia do Norte ficou com a outra vaga do grupo.
Três pontos sobre… … 08/06/1958 – União Soviética 2 x 2 Inglaterra
(Imagem: Pinterest)
● Por ser o mais equilibrado da Copa, o Grupo 4 era chamado pela imprensa de “Grupo de Ferro”. Além de Inglaterra e URSS, a chave ainda tinha o talento dos craques da Seleção Brasileira e o bom time da Áustria, que tinha terminado o Mundial anterior na 3ª colocação.
A União Soviética chegou ao Mundial como uma das favoritas ao título, muito por causa da conquista da medalha de ouro dos Jogos Olímpicos de 1956, em Melbourne. Mas teve certa dificuldade para se qualificar para o Mundial na Suécia. No Grupo 6 das eliminatórias, terminou empatada em número de pontos com a Polônia e precisou do jogo desempate, quando derrotou os poloneses por 2 x 0 em Leipzig, na Alemanha Oriental.
A URSS atraía a curiosidade de todos. Tudo que vinha “do lado de lá” da Cortina de Ferro tinha uma aura misteriosa e moderna que dava medo ao mundo ocidental, em todos os âmbitos: na ciência, nos equipamentos bélicos, no esporte e em tudo mais. A lenda do “futebol científico” – que havia produzido um sistema perfeito para derrotar qualquer equipe – deixava os adversários intimidados. Segundo uma história contada na época, a comissão técnica soviética teria cruzado o provável desempenho dos rivais em computadores e, após os cálculos, o país seria campeão do mundo.
Lev Yashin recebe a bola recuada antes da chegada de Derek Kevan (Imagem: Futbox)
● Em sua partida de estreia em Copas do Mundo, a União Soviética enfrentou um forte adversário.
A Inglaterra se classificou no Grupo 1 das eliminatórias. Mesmo em um grupo com a incipiente Dinamarca e a fraca Irlanda, o English Team não foi soberano. A qualificação foi alcançada apenas aos 44 minutos do segundo tempo do último jogo, quando John Atyeo fez o gol do empate por 1 x 1 com os irlandeses, em Dublin.
Os ingleses não tinham mais a aura de invencível, principalmente depois das duas surras que sofreram da Hungria em 1953 (3 x 6) e 1954 (1 x 7). Mas ainda era um time muito respeitável, com jogadores como o capitão Billy Wright, Bobby Robson, Johnny Haynes e Tom Finney. No banco já aparecia o craque Bobby Charlton, de apenas 20 anos, que lideraria a seleção campeã do mundo em 1966 (disputaria quatro Copas, entre 1958 e 1970). Inclusive, Charlton foi um dos sobreviventes da “Tragédia de Munique”.
O futebol inglês ainda vivia o luto causado pelo desastre aéreo ocorrido no aeroporto de Munique no dia 06 de fevereiro daquele mesmo ano, que causou a morte de 23 dos 38 tripulantes, sendo oito jogadores do Manchester United. Entre os mortos, três atletas que certamente seriam titulares do English Team na Copa da Suécia: Roger Byrne (28 anos), capitão do Man Utd, que havia jogado o Mundial de 1954; Tommy Taylor (26 anos), grande artilheiro dos Red Devils e também veterano da Copa de 1954; e Duncan Edwards (21 anos), um jogador polivalente, adorado pelos ingleses e que – segundo a imprensa europeia – tinha potencial para ser o melhor do mundo.
Os três foram perdas muito sentidas para o time formado pelo técnico Walter Winterbottom. Além do aspecto técnico, o fator psicológico também foi preponderante. Em um amistoso preparatório disputado um mês antes do Mundial, a Inglaterra perdeu por 5 x 0 para a Iugoslávia, em Belgrado.
(Imagem: sovsport.ru)
● Esse foi um duelo muito aguardado, por colocar frente a frente duas escolas diferentes e com grande qualidade técnica.
As duas seleções entraram em campo com seus uniformes tradicionais: os ingleses de calção preto e camisa branca com o símbolo dos três leões (Three Lions), enquanto os soviéticos vestiam calção branco e a camisa vermelha ostentando o famoso símbolo “CCCP” (Союз Советских Социалистических Республик – União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, escrita em russo com o alfabeto cirílico). O goleiro Lev Yashin justificava a alcunha de Aranha Negra, com seu uniforme todo preto, sua tradicional boina e uma coisa inédita: luvas. Yashin foi o primeiro goleiro a usar luvas de couro para proteger as mãos em uma partida de Copa do Mundo.
A principal ausência na seleção soviética foi a do centroavante Eduard Streltsov, artilheiro do time nas eliminatórias. Ele foi impedido de sair de seu país por estar respondendo a um processo criminal por estupro. Diz a lenda que ele era inocente e seu julgamento teria sido todo armado porque ele bateu de frente com o regime comunista russo. Porém, essa é uma história polêmica que fica pra outro momento. Mas ele fez muita falta à equipe e, talvez, se estivesse em campo, a URSS poderia ter tido melhor sorte ao longo da competição.
A URSS jogava em um sistema W-M adaptado, com um homem na sobra, como um líbero. Os meias jogavam muito perto dos pontas e trocavam de posição com frequência.
A Inglaterra ainda utilizada o velho sistema W-M, criado por Herbert Chapman em 1925. Era um estilo de jogo mais estático que o dos soviéticos.
● Praticamente ninguém sabia como jogava a URSS. E os ingleses descobriram da pior maneira, já dentro de campo. A novidade tática dos soviéticos estava no ataque, com os meias jogando bem próximos dos pontas, com muita movimentação. O centroavante Nikita Simonyan se mexia incessantemente, caindo para os dois lados. Essa troca de posições constante confundiu muito a marcação da defesa inglesa. Mesmo com a proteção do grande Billy Wright como líbero, o time só se encontrou após sofrer dois gols.
O placar foi aberto aos 13 minutos. Após cruzamento da direita, a bola passou por todo mundo e Nikita Simonyan chutou para o gol vazio.
O segundo foi foi marcado aos 11′ do segundo tempo. Aleksandr Ivanov recebeu na meia-lua, invadiu a área sem marcação, driblou o goleiro Colin McDonald e finalizou de esquerda para o gol.
O jogo parecia resolvido. Mas os ingleses tinham uma jogada que praticavam desde o século XIX: os famosos “chuveirinhos” – as bolas aéreas cruzadas na área desde a linha lateral. E o primeiro gol saiu assim, aos 21′, em um desses incessantes cruzamentos. Bryan Douglas cruzou da direita. De dentro da pequena área, Derek Kevan cabeceou para baixo e a bola entrou à direita de Yashin.
O English Team seguiu atacando em busca da igualdade, principalmente apostando na bola aérea.
Em um bom lance, o veterano Tom Finney passou por Vladimir Kesarev, foi até a linha de fundo e cruzou da esquerda. Yashin segurou, mas Kevan atingiu o goleiro na dividida. A bola sobrou livre para Bobby Robson marcar o gol, mas o árbitro húngaro István Zsolt já havia marcado corretamente a falta no lance.
Yashin tinha dificuldades até para repor a bola em jogo, pois os atacantes ingleses ficavam em cima, impedindo a saída rápida do arqueiro soviético.
Mas McDonald também trabalhava. Aleksandr Ivanov cruzou da ponta direita e o goleiro inglês saiu para tirar a bola de Simonyan e evitar o gol.
O empate veio a cinco minutos do fim em um pênalti muito polêmico. Johnny Haynes foi derrubado quase na linha da grande área. Mal posicionado, o juiz assinalou o pênalti. Tom Finney bateu com precisão, forte e rasteiro, no canto direito de Yashin – que até acertou o lado, mas não conseguiu pegar.
No fim, o placar de 2 a 2 foi um empate honroso, que justificou a qualidade das duas seleções.
Tom Finney converte a cobrança de pênalti sobre o goleiro Lev Yashin (Imagem: Popperfoto / Getty Images)
Aliás, o equilíbrio tomou conta da fase de grupos. Tanto, que foram necessários três jogos desempate para definir os classificados para as quartas de final. Somente o Grupo 2 classificou dois países de forma direta. No Grupo 1, a Irlanda do Norte bateu a Tchecoslováquia por 2 x 1. Pelo Grupo 3, o País de Gales venceu a Hungria também por 2 x 1. No Grupo 4, União Soviética e Inglaterra voltaram a se enfrentar nove dias depois da primeira partida.
E, no dia 17/06/1958, qualquer uma das duas equipes poderiam ter vencido. Os soviéticos jogaram melhor na primeira etapa, mas não conseguiram abrir o placar. O segundo tempo foi dominado pelos ingleses e, mais especificamente, pelo atacante estreante Peter Brabrook, do Chelsea. Ele mandou duas bolas na trave e ainda teve um gol anulado (ele tocou a bola com a mão antes de finalizar no ângulo direito). Mas foi a URSS quem fez o único gol do jogo, aos 23′ da etapa final. O goleiro McDonald saiu jogando errado e entregou a bola nos pés de Valentin Ivanov. Após uma rápida troca de passes, o ponta esquerda Anatoli Ilyin ficou com a bola dentro da área e finalizou antes da chegada de dois marcadores. A bola tocou na trave direita antes de entrar. Depois do gol, os soviéticos recuaram para segurar o resultado. Os britânicos foram para o abafa, mas a defesa russa se sobressaiu, com destaques para o goleirão Lev Yashin e o zagueiro Yuriy Voynov.
Na sequência, o “futebol científico” soviético foi por água abaixo nas quartas de final ao ser eliminado pela Suécia, a dona da casa, com uma derrota por 2 x 0.
Lance do jogo desempate, quando a URSS eliminou a Inglaterra com vitória por 1 a 0 (Imagem: Popperfoto / Getty Images)
● Era um duelo entre duas seleções muito fortes. Ambas constavam no grupo das favoritas ao título. O Brasil era o candidato natural, por ter vencido as duas Copas anteriores (1958 e 1962). A Inglaterra era a dona da casa. A Espanha havia conquistado a Eurocopa de 1964. E a Alemanha Ocidental tinha um bom elenco, onde brilhavam o veterano atacante Uwe Seeler e uma jovem dupla no meio campo: Franz Beckenbauer e Wolfgang Overath.
A União Soviética estava na melhor fase de sua história. Em um espaço de dez anos, havia conseguido quase todos os títulos de sua sala de troféus, além de campanhas de destaque. Conquistou a medalha de ouro nos Jogos Olímpicos de 1956, em Melbourne. Se sagrou vencedora da primeira edição da Eurocopa, em 1960, além de ter sido vice-campeã da Euro de 1964. Um nome se destacava dentre os demais e permaneceu como unanimidade durante todo esse período: Lev Yashin, o Aranha Negra, único goleiro a ter sido eleito o Bola de Ouro da revista France Football como o melhor jogador da Europa, em 1963. Nas eliminatórias, a URSS foi a líder do Grupo 7 da UEFA, com cinco vitórias e uma única derrota (para o País de Gales, quando já estava classificada), deixando para trás, além dos galeses, a Grécia e a Dinamarca.
Em termos de qualidade, a Hungria não ficava atrás. No qualificatório europeu, terminou com três vitórias e um empate, deixando para trás a Alemanha Oriental e a Áustria. Com esse mesmo time base, havia conquistado a medalha de bronze nas Olimpíadas de Roma, em 1960. Depois, terminou em 3º lugar na Eurocopa de 1964 e ficou com a medalha de ouro dos Jogos Olímpicos de Tóquio, também em 1964. Os maiores destaques eram o volante Kálmán Mészöly, o ponta direita Ferenc Bene e o atacante Flórián Albert, que seria eleito o Bola de Ouro de 1967.
Em sua estreia, a União Soviética venceu a Coreia do Norte por 3 x 0. Depois, venceu a Itália por 1 x 0. Terminou a primeira fase com 100% de aproveitamento ao vencer o Chile por 2 x 1.
A Hungria perdeu para Portugal por 2 x 1 na primeira partida. Depois, venceu por 2 x 1 a Seleção Brasileira, então bicampeã do mundo. Encerrou sua participação com o segundo lugar do Grupo 3, após vencer a Bulgária por 3 x 1.
Ambas as equipes jogavam no sistema tático 4-2-4.
● Os dois goleiros acabariam por ser os dois principais destaques da partida. Enquanto Lev Yashin salvou a URSS, o goleiro húngaro fez o contrário. József Gelei era o terceiro goleiro de sua seleção. Ele tinha 28 anos e jogava FC Tatabánya, um time médio de seu país – o mesmo clube que havia revelado Gyula Grosics, maior arqueiro da história da Hungria, que disputou as Copas de 1954, 1958 e 1962. O titular era Antal Szentmihályi, do Újpest LK, mas ele não fez uma boa partida na estreia diante de Portugal e foi sacado pelo técnico Lajos Baróti. O reserva imediato era István Géczi, do Ferencváros TC, que estava lesionado. Assim, coube a Gelei defender a meta contra o Brasil. Fez um bom papel e foi mantido como titular para a sequência da competição. Mas, contra os soviéticos, ele falhou logo na primeira vez em que precisou mostrar serviço.
Logo aos cinco minutos, antes que o jogo esquentasse, aconteceu um lance curioso. O soviético Anatoliy Banishevskiy avançou pela ponta esquerda e, em disputa de bola, jogou o zagueiro húngaro Sándor Mátrai para cima dos repórteres. Ele demorou um pouco a se recuperar, mas voltou inteiro para o jogo. O árbitro espanhol Juan Gardeazábal Garay deu apenas escanteio.
Valeriy Porkujan cobrou escanteio curto, recebeu de volta e chutou fraco e rasteiro da ponta esquerda. Era uma bola fácil, mas Gelei deixou a bola passar por baixo de seu corpo. Igor Chislenko estava ligado no lance e chegou de carrinho para empurrar a bola que estava quase em cima da linha de gol, antes que o goleiro tivesse tempo para recuperar a bola.
(Imagem: Pinterest)
No restante do primeiro tempo, os húngaros tentaram recobrar o controle dos nervos, mas não conseguiram. O técnico Nikolai Morozov deu uma mostra de humildade rara entre os soviéticos e decidiu escalar Valery Voronin com a única e exclusiva obrigação de acompanhar Florián Albert por todo o campo – principal articulador das jogadas de ataque da seleção húngara.
No primeiro minuto do segundo tempo, Vasiliy Danilov deu um chutão para frente e foi prensado por Benő Káposzta. Em um lance bastante inusitado, a bola furou e caiu já murcha fora de campo. Uma cena muito rara na história das Copas.
Logo aos 2′, Gelei falhou novamente. Galimzyan Khusainov cobrou uma falta da direita, levantando a bola na pequena área da Hungria. O goleiro ficou parado e Porkujan cabeceou. A bola tocou na trave esquerda e entrou no gol.
(Imagem: Magyarfutball.hu)
Mas, em uma estratégia arriscada, os soviéticos recuaram diante do bom time húngaro.
Na base da força de vontade e superação os magiares saíram em busca do empate e chegaram a colocar os dez jogadores no campo de ataque. Era o volante Kálmán Mészöly quem liderava o time na técnica e no grito. A pressão foi tanta que o goleiro Lev Yashin precisou fazer pelo menos quatro defesas de grande envergadura. Mas só resultou em um único e insuficiente gol.
Mészöly se lançou de vez para o ataque. Aos 12′ , ele abriu na direita para Ferenc Bene tocar cruzado por cima de Yashin, que saía no lance.
A Hungria continuava atacando em busca do empate.
Gyula Rákosi cruzou da esquerda para a área. Mészöly dominou no peito e bateu de primeira, de esquerda, mas Porkujan fechou o espaço e impediu o empate. A defesa da URSS não conseguiu tirar de vez, a bola viajou e Rákosi chutou da entrada da área, mas a bola saiu à direita do gol de Lev Yashin.
Mais para o fim do jogo, Ferenc Bene deu uma bicicleta da entrada da grande área e a bola passou muito perto do travessão, chegando a tocar no suporte da rede e assustar Yashin.
Mas já era tarde demais para os húngaros. A URSS estava classificada para a única semifinal de sua história nas Copas do Mundo.
Três pontos sobre… … 15/06/1958 – Brasil 2 x 0 União Soviética
(Imagem: FIFA)
● Na estreia, o Brasil havia vencido a Áustria com propriedade por 3 a 0. Depois, no segundo jogo, o empate sem gols e o ponto perdido contra a Inglaterra esfriou os ânimos e deixou os brasileiros apreensivos. Ainda assombrada pelo “complexo de vira-latas”, o fantasma dos jogos decisivos voltava a assombrar a Seleção Brasileira. E a última partida do Grupo 4 reservava um duro duelo com a temida União Soviética.
A campanha soviética estava semelhante à brasileira: empate com a Inglaterra (2 x 2) e vitória sobre a Áustria (2 x 0). Assim, ambas equipes precisavam da vitória para se classificar de forma direta para as quartas de final. Foi a primeira partida entre os dois países na história.
Os soviéticos haviam conquistado a medalha de ouro nos Jogos Olímpicos de 1956 e eram considerados favoritos. Mas tiveram dificuldades para se qualificarem para o Mundial na Suécia. No Grupo 6 das eliminatórias europeias, terminaram empatados em número de pontos com a Polônia e precisaram do jogo desempate, quando derrotaram os poloneses por 2 x 0 em Leipzig, na Alemanha Oriental.
A União Soviética iria disputar a sua primeira Copa sob imensa curiosidade de todo o mundo. Tudo que vinha da URSS tinha uma aura misteriosa e moderna que dava medo ao mundo ocidental, em todos os âmbitos: no esporte, na ciência, nos equipamentos bélicos e em tudo mais. Politicamente, protagonizava a Guerra Fria com os Estados Unidos. Intimidava os adversários com a camisa vermelha com a inscrição CCCP em letras garrafais. A sigla significava União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. No alfabeto cirílico, o C tem o som de S e o P de R. Assim, o original em russo era Союз Советских Социалистических Республик. A transcrição fonética no alfabeto latino era Soyuz Sovetskikh Sotsialisticheskikh Respublik e causava temor apenas a simples tentativa de pronunciar tudo isso. O brasileiro, que faz piada com tudo, dizia que o significado era “Cuidado, Camarada, com o Crioulo Pelé”.
O time soviético começava sua escalação com seu maior nome em todos os tempos. O camisa 1 era Lev Yashin, que estamparia o pôster oficial do Mundial de 2018, na Rússia. Com o uniforme todo preto e camisa de mangas longas, ganhou o apelido de “Aranha Negra” na América do Sul e “Pantera Negra” na Europa. Ele foi o primeiro a usar luvas de couro para proteger as mãos em um jogo de Copa. Até hoje ele é considerado pela maioria dos especialistas o melhor goleiro da história do futebol. Ele ainda disputaria as três Copas seguintes (1962, 1966 e 1970 – esta última já veterano como reserva, mais como uma homenagem).
O time praticava o chamado “futebol científico”, em que os atletas estavam preparados para correr sem parar durante 180 minutos e ainda ficarem inteiros para mais. A lenda dizia que eles faziam quatro horas de ginástica pela manhã em dia de jogo. Dizia-se que a KGB tinha espiões espalhados por todo o mundo filmando os adversários e que seus “cérebros eletrônicos” (computadores) haviam produzido um sistema perfeito para derrotar qualquer equipe. Segundo uma história contada na época, a comissão técnica soviética teria cruzado os dados dos rivais em computadores e, após os cálculos, o país seria campeão do mundo.
Ninguém se preocupou em refazer os cálculos quando chegou a notícia de que o Brasil jogaria sem Dino Sani, Joel e Mazzola – que jogaram bem nas primeiras partidas. Eles dariam lugar a “um tal de Zito”, um aleijado de pernas tortas e um moleque negro de 17 anos.
(Imagem: Estadão)
● Uma das lendas mais românticas da história do futebol, reza que houve uma pequena rebelião dos líderes do elenco – Bellini, Didi e Nílton Santos – exigindo a escalação de Pelé e Garrincha. Mas foi só lenda mesmo. Dois dias antes do jogo, a escalação de Pelé já era uma certeza. Recuperado de contusão, ele entraria no lugar de Mazzola – que já estava vendido ao Milan e não estaria colocando o pé nas divididas (diziam as más línguas).
Ficou decidido que jogaria apenas um centroavante e ele seria Vavá (de estilo mais rompedor), ao invés de Mazzola (mais técnico). Zito (também mais aguerrido) entraria no lugar de Dino Sani (mais clássico), que havia sofrido uma distensão na virilha. Com a marcação de Zito no meio, Didi ficaria mais à vontade para criar e atacar.
Quanto à Garrincha, a ideia de escalá-lo surgiu em uma conversa informal e não em uma rebelião. Foi uma reunião entre o técnico Vicente Feola, os jornalistas Armando Nogueira e Luiz Carlos Barreto e o lateral esquerdo Nílton Santos. Também foram consultados Paulo Machado de Carvalho, Didi e Bellini e todos foram favoráveis. Nos primeiros dois jogos, Joel havia recebido boas notas da imprensa por ser um ponta “moderno” que, assim como Zagallo do lado oposto, recuava para ajudar na marcação. E, com a entrada do marcador Zito no time, Feola teve a oportunidade de reforçar a linha de frente com um ponta que atacasse mais. E havia duas opções: trocar Zagallo por Pepe ou Joel por Garrincha. E como Joel estava sentindo dores no joelho, devido ao pisão de Bill Slater, na partida contra a Inglaterra, o Mané ganharia a vaga de titular. Compadre de Garrincha, Nilton Santos foi o responsável por dar a notícia ao ponta. “Acho que você vai entrar. Mané, se você entrar, capricha”, falou Nilton. “Se eu jogar, pode deixar”, respondeu Garrincha.
Na véspera da partida, o psicólogo João Carvalhaes fez um teste psicotécnico com os jogadores para verificar quais deles estavam em condições psicológicas para enfrentar a URSS. Dos onze que jogariam, apenas Pelé e Nilton Santos foram aprovados. Felizmente esses resultados não seriam levados em consideração pela comissão técnica.
(Imagem: O Globo)
● As delegações de Brasil e URSS estavam concentradas a cem metros uma da outra, em Hindås. A diferença era que o hotel dos russos ficava em uma pequena elevação que permitia ter uma visão privilegiada dos treinamentos do Brasil.
Sabia-se que os soviéticos se submetiam a uma carga de exercícios físicos descomunal. Da concentração brasileira, era possível vê-los correndo por várias horas seguidas em seu campo de treinamento. Os brasileiros, claro, ficavam cansados só de olhar.
Na quinta-feira, três dias antes do jogo, Feola comunicou à imprensa brasileira que a Seleção faria um treino coletivo no dia seguinte às 15h00, no campinho perto do hotel. Foi pedido sigilo, pois a comissão técnica não queria a presença de jornalistas estrangeiros, principalmente soviéticos. Na hora marcada, estavam todos presentes: a imprensa brasileira, a imprensa estrangeira e os espiões russos. E nenhum jogador no gramado. A Seleção havia treinado secretamente de manhã com todas as mudanças e, assim, escondeu bem o jeito que jogaria.
No fim da preleção antes da partida, Feola deu a instrução direta: “E não se esqueça, Didi. A primeira bola é para o Garrincha”. E disse para o Mané: “Tente descadeirá-los de saída”.
Os soviéticos conheciam Garrincha das excursões caça-níquéis afora. Só não sabiam como pará-lo.
O Brasil atuava em um falso 4-2-4, se transformando em um 4-3-3 com o recuo voluntário de Zagallo.
A URSS jogava em um sistema WM adaptado, com um homem na sobra, como um líbero.
● Quando o árbitro francês Maurice Guigue apitou o início da partida, a Seleção Brasileira precisou apenas de 180 segundos para demonstrar o melhor que o futebol já produziu, deixando assombrados os 50.928 expetadores no estádio Nya Ullevi, em Gotemburgo. Mesmo sendo um jogo da primeira fase, esse foi o maior público da Copa.
Decidido a nocautear o adversário rapidamente, o Brasil teve um começo simplesmente arrasador. Garrincha começou o jogo endiabrado, em uma exibição fenomenal. Logo no primeiro lance, aos 40 segundos, ele entortou diversas vezes o zagueiro Boris Kuznetsov, passou como se ele não existisse, entrou na área e chutou forte, mas a bola carimbou a trave esquerda de Yashin e foi para fora.
Garrincha desmontou a defesa soviética em geral, e o pobre Kuznetsov em particular. Era a marca registrada do ponta brasileiro: ele deixava a bola entre ele e o marcador, ameaçava a arrancada jogando o corpo para a direita e voltava à posição inicial. Kuznetsov seguia o movimento do Mané uma, duas, três, todas as vezes, e a bola continuava parada entre os dois. Quando o russo ficava parado e ia direto na bola, Garrincha o driblava.
Enquanto Mané driblava Kuznetsov uma porção de vezes, o técnico Gavriil Kachalin perguntava atônito para o banco de reservas quem era o reserva de Joel, com aquelas pernas tortas. Desesperado, o treinador russo precisou reforçar a marcação no ponta, com Konstantin Krizhevsky. Mas nada pararia Garrincha. Percebendo a cintura dura dos seus adversários, ele era pura fantasia com a bola nos pés, gingando e driblando os desesperados soviéticos. Essa partida foi responsável pela lenda de que pela dificuldade em falar o nome dos russos, Garrincha passou a chamar os marcadores de “João”. E todos se tornaram os “Joãos” de Mané. Garrincha se divertia e divertia a todos dentro e fora do campo.
Quando os soviéticos recolocaram a bola em jogo, logo o escrete canarinho a recuperou. Garrincha fez mais uma de suas jogadas e lançou para Pelé, que arriscou o chute, mas a bola explodiu no travessão. O relógio ainda não tinha dado uma volta no ponteiro e o Brasil já havia carimbado a trave por duas vezes. O gol era questão de tempo.
E ele viria pouco mais de um minuto depois. Didi, realmente mais solto em campo, fez um lançamento de curva preciso pelo chão. Vavá se infiltrou na defesa soviética e, da meia-lua, tocou na saída de Yashin para abrir o placar.
O jornalista francês Gabriel Hanot, do jornal L’Equipe (ex-jogador, técnico e um dos idealizadores da atual UEFA Champions League) classificou aquele início brasileiro como “os três maiores minutos da história do futebol”, tal foi a força e a qualidade com que os jogadores brasileiros atacaram os soviéticos, sobretudo Garrincha.
(Imagem: O Globo)
● Os soviéticos estavam perdidinhos. Na tentativa de dominar o meio de campo, o técnico Gavriil Kachalin havia promovido a estreia de seu melhor jogador de linha, o capitão Igor Netto, que se recuperava de contusão. Ele era muito técnico e criativo, uma espécie de “Didi russo”. E nem havia tocado na bola quando Vavá inaugurou o marcador.
Didi, inteligente como só ele, levou Netto, para uma faixa mais neutra do campo, impedindo que o adversário conseguisse criar perigo. E o Príncipe Etíope ainda conseguia ditar o ritmo do jogo e entregava a bola a Garrincha sempre que podia.
Os soviéticos somente chegaram à área brasileira aos quinze minutos, em um lançamento longo para Anatoli Ilyin, que Gylmar saiu para interceptar.
Mas o baile continuou por todo o primeiro tempo, principalmente com um Mané diabolicamente incontrolável, provocando uma devastação na defesa soviética. Os russos pensavam que era um problema de ajuste de marcação e começaram a discutir entre si. Mas nada adiantou e o jogador do Botafogo continuou a fazer fila. Em certo momento, Garrincha deixou um marcador no chão, parou a bola e estendeu a mão para ajudá-lo a levantar. E seguiu o jogo normalmente, de forma inocente.
A partida teve duas fases: algumas poucas de algum equilíbrio e os muitos momentos de domínio brasileiro. Por isso, o segundo gol até demorou.
No segundo tempo, os soviéticos tiveram um de seus raros ataques. Anatoli Ilyin recuperou a bola e deixou com Igor Netto. Valentin Ivanov e Netto tabelaram pelo meio. Ivanov driblou De Sordi e chutou de esquerda. Gylmar encaixou firme, sem dar rebote.
Pelé foi discreto, deixando seu melhor para o jogo seguinte, contra o País de Gales. Ele perdeu dois gols que certamente faria se estivesse com mais ritmo de jogo e não tão nervoso. Normal, para um adolescente.
Aos 31 minutos do segundo tempo, em uma troca de passes entre Pelé e Vavá na área soviética, a bola sobrou entre Vavá e dois zagueiros. Conhecido como Peito de Aço por sua impetuosidade, Vavá esticou a perna esquerda, mesmo com a bola estando mais para o zagueiro Vladimir Kesarev e chutou para o fundo do gol. Em troca, Vavá ficou com um enorme corte na canela esquerda, causada pelas travas da chuteira de Kesarev – tentou tirar a bola no lance, mas chegou atrasado e atingiu em cheio o brasileiro.
O segundo gol trouxe um alívio tão grande que a comemoração passou do ponto: seis jogadores se empilharam sobre um lesionado Vavá, formando uma pirâmide humana até então desconhecida em campos europeus. O centroavante não aguentou de dor no corte e precisou deixar o campo alguns minutos depois. Com essa contusão, imaginava-se que Vavá estaria fora do restante do Mundial.
Aos 37, o ponta Ilyin acertou um chutaço que obrigou Gylmar a fazer a sua defesa mais difícil na Copa até então. E Gylmar terminou a primeira fase com a meta invicta, bem guarnecida por uma defesa irrepreensível formada por De Sordi, o capitão Bellini, Orlando e Nilton Santos. Do outro lado, Yashin evitou uma goleada histórica. O Brasil atacou 36 vezes, sendo a metade com perigo.
(Imagem: Globo Esporte)
● Nos minutos finais, a plateia viu um pequeno baile. Dos 38 aos 40, a bola rolou de pé em pé, de um lado para o outro e de volta ao ponto inicial, o capitão Bellini, sem que nenhum soviético conseguisse tocá-la. A até então comportada torcida sueca foi ao delírio. Deliciados com a arte dos brasileiros, os suecos riam à vontade com o futebol fantasia de Mané. Bastava ele receber a bola que o estádio se punha de pé. E aplaudiam com entusiasmo todo o time, de Gylmar a Zagallo.
O baile serviu para esfriar o ânimo dos soviéticos. Ateus, os comunistas russos pareciam rezar para que o juiz apitasse para que aquele pesadelo acabasse logo.
Os críticos presentes já não tinham mais adjetivos superlativos para descrever a Seleção Brasileira. Garrincha foi considerado “um assombro”. Os ingleses chamaram o ponta de “mercurial” (de outro mundo). Os jornais brasileiros disseram que Garrincha “arrombou a Cortina de Ferro”.
O decantado futebol científico da URSS se dobrava diante da malemolência do brasileiro: a genialidade de Didi, os dribles de Garrincha, o oportunismo de Vavá e tudo de Pelé.
No fim da partida, Garrincha resumiu tudo: “Eu tava com fome de bola”. No dia seguinte, ele recebeu o bicho direto das mãos do tesoureiro Adolpho Marques: cinquenta dólares. No Brasil, foi eleito o “desportista da semana” e ganhou uma bicicleta Gulliver.
(Imagem: Mais Futebol)
● No dia seguinte, em uma demonstração de esportividade, a delegação soviética visitou a concentração brasileira. Entre elogios e brincadeiras, principalmente com Garrincha, o zagueiro Kesarev se desculpou pelo rasgo na canela de Vavá. A URSS teve que jogar uma partida desempate com a Inglaterra pelo segundo lugar do grupo e venceu por 1 x 0. Nas quartas de final, caiu para a Suécia, dona da casa, por 2 x 0.
A principal ausência na seleção soviética foi a do centroavante Eduard Streltsov, artilheiro do time nas eliminatórias. Ele foi impedido de sair de seu país por estar respondendo a um processo criminal por estupro. Diz a lenda que ele era inocente e seu julgamento teria sido todo armado porque ele bateu de frente com o regime comunista russo. Porém, essa é uma história polêmica que fica pra outro momento. Mas ele fez muita falta à equipe e que, talvez, se estivesse em campo, a URSS poderia ter ido mais longe do que as quartas de final.
O desempenho dos brasileiros contra os soviéticos foi tamanho, que o placar foi considerado injusto, pois o Brasil teria merecido vencer por uma diferença mais expressiva no placar. Mas a vitória foi mais que o suficiente para classificar a Seleção Brasileira como líder do grupo. Cheia de confiança, enfrentaria o País de Gales nas quartas de final quatro dias depois. Esperamos contar essa história no próximo dia 19.
Enfim, Vicente Feola havia encontrado a escalação ideal. Pelé e Garrincha estrearam em Copas do Mundo e começaram a se transformarem em mitos. Com os dois juntos em campo, a Seleção Brasileira nunca foi derrotada. Foram oito anos e quarenta jogos (incluindo não oficiais) e o Brasil nunca perdeu: foram 35 vitórias e cinco empates). O título mundial era possível. Havia esperança e ela estava mais viva do que nunca.
(Imagem: Mais Futebol)
● FICHA TÉCNICA:
BRASIL 2 x 0 UNIÃO SOVIÉTICA
Data: 15/06/1958
Horário: 19h00 locais
Estádio: NyaUllevi
Público: 50.928
Cidade: Gotemburgo (Suécia)
Árbitro: Maurice Guigue (França)
BRASIL (4-2-4):
UNIÃO SOVIÉTICA (WM):
3Gylmar (G)
1Lev Yashin (G)
14 De Sordi
2 Vladimir Kesarev
2 Bellini (C)
4Boris Kuznetsov
15 Orlando
5Yuriy Voynov
12 Nilton Santos
3 Konstantin Krizhevsky
19 Zito
16 Viktor Tsaryov
6Didi
17 Aleksandr Ivanov
11 Garrincha
8 Valentin Ivanov
20 Vavá
9 Nikita Simonyan
10 Pelé
6Igor Netto (C)
7Zagallo
11 Anatoli Ilyin
Técnico: Vicente Feola
Técnico: GavriilKachalin
SUPLENTES:
1Castilho (G)
12 Vladimir Maslachenko (G)
4Djalma Santos
13 Vladimir Belyayev (G)
16 Mauro
14 LeonīdsOstrovskis
9Zózimo
22 Vladimir Yerokhin
8Oreco
15 AnatoliMaslyonkin
5DinoSani
19 GennadiGusarov
13 Moacir
20 Yuri Falin
17 Joel
7GermanApukhtin
18 Mazzola
18 Valentin Bubukin
21 Dida
10 Sergei Salnikov
22 Pepe
21 GenrikhFedosov
GOLS:
3′ Vavá (BRA)
77′ Vavá (BRA)
Veja imagens raras da partida:
Lance inicial e gols do jogo:
Algumas imagens da partida:
● Sobre “aqueles primeiros três minutos”, no livro “Estrela Solitária: um brasileiro chamado Garrincha”, Ruy Castro reproduz o relato do repórter Ney Bianchi na revista Manchete Esportiva e depois complementa:
“Monsieur Guigue, gendarme nas horas vagas, ordena o começo da partida. Didi centra rápido para a direita: 15 segundos de jogo. Garrincha escora a bola com o peito do pé: 20 segundos. Kuznetzov parte sobre ele. Garrincha faz que vai para a esquerda, não vai, sai pela direita. Kuznetzov cai e fica sendo o primeiro João da Copa do Mundo: 25 segundos. Garrincha dá outro drible em Kuznetzov: 27 segundos. Mais outro: 30 segundos. Outro. Todo o estádio levanta-se. Kuznetzov está sentado, espantado: 32 segundos. Garrincha parte para a linha de fundo. Kuznetzov arremete outra vez, agora ajudado por Voinov e Krijveski: 34 segundos. Garrincha faz assim com a perna. Puxa a bola para cá, para lá e sai de novo pela direita. Os três russos estão esparramados na grama, Voinov com o assento empinado para o céu. O estádio estoura de riso: 38 segundos. Garrincha chuta violentamente, cruzado, sem ângulo. A bola explode no poste esquerdo da baliza de Iashin e sai pela linha de fundo: 40 segundos. A platéia delira. Garrincha volta para o meio do campo, sempre desengonçado. Agora é aplaudido.”
“A torcida fica de pé outra vez. Garrincha avança com a bola. João Kuznetzov cai novamente. Didi pede a bola: 45 segundos. Chuta de curva, com a parte de dentro do pé. A bola faz a volta ao lado de Igor Netto e cai nos pés de Pelé. Pelé dá a Vavá: 48 segundos. Vavá a Didi, a Garrincha, outra vez a Pelé, Pelé chuta, a bola bate no travessão e sobe: 55 segundos. O ritmo do time é alucinante. É a cadência de Garrincha. Iashin tem a camisa empapada de suor, como se já jogasse há várias horas. A avalanche continua. Segundo após segundo, Garrincha dizima os russos. A histeria domina o estádio. E a explosão vem com o gol de Vavá, exatamente aos três minutos.”
Foi assim que o repórter Ney Bianchi reproduziu em Manchete Esportiva aquele começo de jogo, como se tivesse um olho na bola e outro no cronômetro. Mas não estava longe da verdade. Outro jornalista, Gabriel Hannot, diria que aqueles foram os maiores três minutos da história do futebol e, com mais de setenta anos, ele fora testemunha ocular dessa história. A avalanche fora tão impressionante que, assim que se viu vazado, Iashin cumprimentou o primeiro brasileiro que lhe passou por perto – por acaso, Pelé.
E ainda faltavam 87 minutos para o jogo acabar! A continuar daquele jeito, já havia russos contemplando uma temporada na Sibéria. Nunca o orgulho do “científico” futebol soviético fora tão desmoralizado, e pelo mais improvável dos seres: um camponês brasileiro, mestiço, franzino, estrábico e com as pernas absurdamente tortas. A anticiência por excelência, o anti-Sputnik, o anticérebro eletrônico ou qualquer cérebro. Kessarev, Krijveski, Voinov, Tsarev e, mais que os outros, Kuznetzov, todos os zagueiros russos foram driblados por Garrincha em algum momento do jogo: um de cada vez, dois, três ou, em fila, todos ao mesmo tempo. Garrincha deixava um russo sentado e dizia, como se ele pudesse entendê-lo:
Três pontos sobre… … 02/06/1986 – União Soviética 6 x 0 Hungria
(Imagem: World Cup Archive)
● A Hungria é detentora de feitos históricos no futebol, tendo como maior destaque os vice-campeonatos nas Copas do Mundo de 1938 e 1954. É a maior vencedora da modalidade nos Jogos Olímpicos, com três medalhas de ouro (1952, 1964 e 1968), uma de prata (1972) e uma de bronze (1960). Aplicou as duas maiores goleadas da história das Copas do Mundo: 10 x 1 sobre El Salvador em 1982 e 9 x 0 sobre a Coreia do Sul em 1954.
Mas esse histórico não tem a força que tinha antes e a Hungria não disputa uma Copa do Mundo desde 1986. O Mundial do México, inclusive, foi palco de um dos maiores vexames dos magiares nos gramados. Principalmente a estreia, que foi mesmo para ser esquecida.
(Imagem: Futebol Comunista)
● A Hungria havia sido eliminada na primeira fase em 1978 e 1982. Sofria com o dilema sobre como adaptar seu tradicional estilo refinado de jogo a um futebol cada vez mais físico, com mais estatura e velocidade. E em 1983, György Mezey assumiu o comando técnico da seleção. Os resultados melhoraram de imediato. E, aos poucos, o treinador foi renovando quase toda a equipe.
O grande destaque era o jovem meia Lajos Détári. Preciso nos passes e lançamentos longos, era apelidado de “Platini húngaro”. Era o principal responsável por municiar o veloz ponta direita József Kiprich e o centroavante Márton Esterházy, que se movimentava por todo o setor.
Nas eliminatórias, passou com tranquilidade em um grupo difícil: Holanda (de Gullit, Van Basten, Rijkaard e Ronald Koeman), a eterna rival Áustria e o fraco Chipre. Depois, mostrou sua força também nos jogos amistosos, nas vitórias sobre Alemanha Ocidental (1 x 0 em Hamburgo), País de Gales (3 x 0 em Cardiff) e Brasil (3 x 0 em Budapeste). A Hungria tinha um time encaixado e jogava bonito como não se via desde 1954. Por tudo isso, chegou ao México cotada como surpresa da Copa, com potencial para chegar longe.
A URSS chegava ao México com uma mudança importante no comando técnico. Eduard Malofeyev (que fez história levando o Dinamo Minsk ao título soviético) o deu lugar a Valeriy Lobanovs’kyi. O novo técnico apostou na base do Dínamo de Kiev, time que treinava e havia se sagrado campeão da Recopa Europeia naquela temporada recém finalizada. Dos 22 atletas convocados, 11 pertenciam ao clube ucraniano. Curiosamente, Kiev fica a pouco mais de 100 km de Chernobyl, que havia sofrido um gravíssimo acidente nuclear menos de dois meses antes do início da Copa de 1986. Era um time coeso, mas sem muito brilho individual.
A URSS jogava no 4-5-1, com um líbero atrás da linha de três defensores. Os meias laterais tinham muita habilidade e apoiavam Belanov no ataque.
A Hungria jogava no 4-4-2 clássico, com Lajos Détári carimbando todas as jogadas do time pelo meio.
● Desde o início, os soviéticos atropelaram. Logo no segundo minuto, Aleksandr Zavarov cobrou falta, a defesa se atrapalhou com a bola e Pavel Yakovenko chutou no canto. Placar aberto: 1 a 0 para a URSS.
Dois minutos depois, Sergey Aleynikov tabelou com Igor Belanov, que fez o pivô e devolveu para Aleynikov disparar no ângulo, sem chances para o goleiro.
Aos 24′, Zavarov avançou e sofreu pênalti. O craque Belanov cobrou forte e alto, no meio do gol.
O marcador foi ampliado aos 21 minutos do segundo tempo. Yakovenko avançou pelo meio e lançou Ivan Yaremchuk na área. O meia driblou o goleiro Péter Disztl e tocou para as redes. Não perca a conta: 4 a 0.
Aos 30, Yaremchuk fez o segundo. Ele tabelou com Belanov e chutou prensado com um zagueiro. A bola saiu do alcance do goleiro e tocou na trave antes de entrar.
O placar de 6 a 0 foi fechado aos 35′. Aleynikov avançou sem marcação e Disztl saiu para dividir a jogada. A bola sobrou para Rodionov tocar para dentro.
Durante todo o tempo, a URSS demonstrou uma excepcional organização tática e surpreendente resistência física. Os soviéticos desperdiçaram inúmeras oportunidades claras.
Os húngaros estavam tão perdidos em campo, que só não sofreram mais gols porque Belanov cobrou um pênalti por cima quando o jogo já estava 5 a 0. Foram falhas individuais gritantes, especialmente no setor defensivo. O zagueiro Antal Róth, inclusive, foi substituído antes dos 15 minutos. O time sentiu muito a falta de seu capitão, o experiente meia Tibor Nyilasi, que teve que se submeter a uma cirurgia na coluna, em março e ficou fora do Mundial.
Em noventa minutos, a Hungria despencou de candidata a surpresa para maior decepção da Copa.
(Imagem: Pinterest)
● Essa partida foi fonte de várias piadas prontas, como “clássico comunista”, “goleada atômica” e até os dizeres que os soviéticos estavam “dopados com radiação”.
Essa foi a maior goleada do torneio. E foi bastante dolorosa, pois não foi para um adversário qualquer. Foi justamente para a União Soviética, líder do bloco comunista, conhecido como “Cortina de Ferro”. O regime cairia no país do leste europeu no dia 23 de outubro de 1989. Mas, naquele ano de 1986, completavam-se três décadas da invasão soviética que sufocou o levante político húngaro de 1956, com consequências eternas em âmbitos político, social, econômico e esportivo.
A União Soviética terminou a primeira fase como líder do grupo C, com vitórias sobre a Hungria (goleada por 6 a 0) e Canadá (2 a 0), além de um empate com a fortíssima França (1 a 1). Os soviéticos eram favoritos nas oitavas de final, mas perderam para a Bélgica por 4 x 3 na prorrogação – na qual foram claramente prejudicados pela arbitragem em dois lances cruciais.
Após a derrota para os soviéticos, mesmo jogando de forma displicente, a Hungria venceu o Canadá por 2 x 0 e perdeu para a França por 3 x 0. Com dois pontos, ficou em terceiro lugar no Grupo. Foi eliminada na primeira fase. Perdeu a vaga nas oitavas de final no saldo de gols, bastante prejudicado pela goleada sofrida na estreia.
Esse foi o fiasco húngaro em sua última participação em Copas do Mundo. Com o passar do tempo, o futebol do país foi se enfraquecendo e perdendo a força e o respeito que tinha em todo o mundo. Ficam as histórias, que parecem cada vez mais pertencer a um passado muito distante.
Três pontos sobre… … 14/06/1982 – Brasil 2 x 1 União Soviética
(Imagem: Blog do Barath)
● A Copa do Mundo de 1982 foi a porta de entrada para muitos amantes do futebol. Se ela não faz parte das boas memórias de muitos brasileiros, deixou saudades nos amantes do esporte. Analisando friamente os Mundiais seguintes, chega-se à conclusão de que aquele foi o início do fim do belo futebol, com três ou quatro craques em várias equipes.
Existia um favorito destacado: o Brasil de Zico, Falcão, Sócrates, Cerezo, Júnior e companhia ilimitada. Mas havia várias outras seleções com muita técnica e elevado nível tático, como a França de Michel Platini, Rocheteau, Giresse e Tigana; a Itália, de Dino Zoff, Scirea, Bruno Conti e Paolo Rossi; a Polônia, de Lato, Boniek e Zmuda; a Alemanha de Rummenigge, Paul Breitner e Littbarski; a então campeã Argentina de Passarella, Ardiles, Mario Kempes e do jovem Maradona; a injustiçada Argélia de Madjer e Belloumi; a União Soviética do goleiro Dasayev e do atacante Oleg Blokhin. Isso sem falar em seleções tradicionais, como Inglaterra, Espanha, Iugoslávia, Bélgica, Áustria e Escócia.
Mesmo diante de todos esses enormes adversários, o futebol refinado da Seleção Brasileira se destacava e sua torcida esbanjava alegria e auto-confiança, também influenciada pelo ufanismo da imprensa nacional. Onde quer que o esquadrão de Telê Santana estivesse, estava junto uma caravana de torcedores fanáticos e barulhentos, proporcionando um verdadeiro carnaval.
Para nós, apaixonados por futebol, aquela Seleção encarnou como poucas o conceito de futebol-arte. A escalação está sempre fresca na memória. Porém, faltaram duas unanimidades: o goleiro Leão, por opção de Telê, e o centroavante Careca, que era titular da equipe, mas se lesionou a menos de um mês do início do Mundial.
Com um toque de bola refinado e objetivo, aquela equipe encantou o mundo. Tinha um goleiro experiente (Waldir Peres), uma dupla de zaga que se completava (Oscar e Luizinho), dois laterais ofensivos (Leandro e Júnior), dois volantes extremamente técnicos (Falcão e Cerezo), dois meias geniais (Zico e Sócrates) e dois atacantes fortes (Éder e Serginho). Todos dirigidos pelo Mestre Telê Santana.
O retrospecto antes da Copa referendava o favoritismo brasileiro: em 31 partidas, foram 23 vitórias, seis empates e apenas duas derrotas, com 75 gols marcados e 19 sofridos. Com tudo isso, o Brasil chegou à Espanha cheio de expectativas.
Taticamente, o Brasil foi a campo tendo o 4-3-3 como referência, com Dirceu escalado inicialmente como um falso ponta direita. Sem a bola, defendia em um 4-2-3-1. Com a bola, avançava em um 4-1-4-1, com Sócrates e Falcão se revezando na proteção à defesa.
A URSS também foi escalada baseada no 4-3-3. Sem a bola, a defesa e o meio fazia uma linha de quatro jogadores. Com a bola, Gavrilov era o jogador chave para emular o 4-3-1-2, se posicionando à frente de Bal’, Daraselia e Bessonov e sendo o principal articulador das tramas ofensivas. Mais avançados, Shengelia e Blokhin se movimentavam intensamente pelos dois lados do ataque.
● Finalmente havia chegado o dia 14 de junho! O país inteiro parou diante da TV para assistir à estreia brasileira na Copa do Mundo.
O time soviético havia vencido o Brasil dois anos antes, em pleno Maracanã. Era uma boa equipe, com jogadores de alto nível, como o goleiro Dasayev, o zagueiro e capitão Chivadze, os meias Dem’yanenko e Bessonov e, principalmente, o atacante Blokhin. Ainda assim, o mínimo que se esperava era um “baile” do Brasil.
Telê surpreendeu a todos já na escalação, ao colocar Dirceu na vaga do suspenso Toninho Cerezo, barrando Paulo Isidoro, que tinha passado quase toda a preparação no time titular.
Após o apito inicial, a Seleção Canarinho foi logo protagonizando uma bela troca de passes entre Falcão, Leandro, Dirceu e Sócrates.
Logo aos dois minutos, Dirceu roubou a bola de Chivadze e tocou para Zico, que avançou, passou por um adversário e chutou forte. Dasayev espalmou para escanteio, já mostrando logo de cara que seria muito difícil passar pela parede do goleiro soviético.
Aos 3′, Éder cobrou escanteio da direita, com muito efeito. Dasayev não conseguiu afastar e Serginho perdeu um gol feito ao furar a cabeçada.
Os soviéticos acordaram dois minutos depois. O perigosíssimo Oleg Blokhin passou como quis por Leandro e cruzou para Bal’ cabecear com perigo.
No lance seguinte, Zico arrancou com liberdade e passou para Júnior, que avançava pela meia esquerda. O lateral brasileiro finalizou, mas Dasayev fez uma defesa segura.
Aos 8, Sócrates lançou Chulapa no costado da zaga, mas o camisa 9 pegou mal na bola e chutou por cima do gol.
A defesa soviética estava sempre muito fechada e atenta (Imagem: Blog do Ramon Paixão)
Aos 18, Luizinho deu uma mostra do seu nervosismo pela estreia. Ele puxou Shengelia dentro da área. Pênalti claríssimo, ignorado pelo árbitro espanhol Augusto Lamo Castillo.
Era uma belíssima partida, muito intensa. A URSS saía para o jogo e o Brasil fazia transições ofensivas rápidas, em contra-ataques perigosos.
Mas era muito difícil que as duas equipes mantivessem o ritmo forte e o jogo teve uma queda no nível, mas a Seleção Brasileira continuou controlando melhor as ações.
Porém, aos 34 minutos de jogo, depois de uma troca de passe soviética na intermediária ofensiva, Bal’ arriscou um chute despretensioso, da intermediária. A bola foi fraca, no meio do gol, em cima de Waldir Peres. Mas ele não a segurou, deixando escapar para esquerda e entrar no gol. Waldir engoliu um dos maiores frangos da história das Copas. Injusto com a história desse grande goleiro, mas uma falha indesculpável para seu nível.
Aos 36′, a bola bateu no braço de Baltacha dentro da grande área russa. Depois da grande reclamação dos brasileiros, especialmente de Sócrates, Castillo resolveu marcar apenas a jogada perigosa do zagueiro, ao invés de pênalti.
Aos 42, grande chance perdida pelos soviéticos. A defesa brasileira falhou e Bessonov perdeu um gol feito ao chutar na trave o rebote de um cruzamento.
O capitão Sócrates foi fundamental para que o Brasil pudesse virar o marcador (Imagem: Anotando Fútbol)
Telê não gostou muito do que viu de Dirceu em campo e o substituiu por Paulo Isidoro no intervalo. Essa nova formação era mais próxima técnica e taticamente da que fora treinada e testada nos dois anos anteriores ao Mundial. Com isso, o Brasil passou a trabalhar melhor a bola e pressionar mais no segundo tempo.
Aos 15 minutos, a superioridade dos sul-americanos era clara. Mas mesmo com o domínio territorial e físico, o Brasil abusava dos chuveirinhos na área em busca de uma finalização de Serginho, em vez de seguir seu próprio estilo de troca de passes. Era um time nervoso e ansioso para definir logo as jogadas.
A URSS se fechava toda e mantinha praticamente nove jogadores entrincheirados dentro de sua intermediária defensiva. Com o perdão do trocadilho, era uma “Cortinha de Ferro” difícil de ser ultrapassada. Assim, mesmo com toda a qualidade técnica e posse de bola, o Brasil só conseguia assustar com tiros de longa distância.
Leandro parou nas mãos de Dasayev e depois em um desvio do capitão Chivadze. Éder primeiro chutou perigosamente, mas por cima. Depois, aos 25′, o canhão do camisa 11 obrigou Dasayev a desviar para escanteio.
Enquanto a URSS segurava o placar, o Brasil tentava igualar e o tempo passava rápido. Estava claro qual seria a solução para os brasileiros: uma jogada de um de seus gênios e finalização de fora da área.
Sócrates passa por dois adversários e chuta forte para empatar a partida (Imagem: Memória Globo)
Foi o que aconteceu aos 30 minutos. A defesa vermelha afastou um cruzamento de Éder. Sócrates ficou com a sobra, passou por dois marcadores e chutou da intermediária. Foi um verdadeiro “pombo sem asas”, que morreu no ângulo direito do grande goleiro soviético, que dessa vez nada pôde fazer. A quinze minutos do fim, finalmente a partida estava empatada.
Aos 32′, enfim Serginho ganhou uma bola pelo alto da zaga rival e ajeitou para Zico na pequena área. O Galinho, mesmo desequilibrado, se esticou todo e finalizou com o bico da chuteira e a bola passou rente a trave direita de Dasayev.
Aos 36′, o ansioso Luizinho cometeu novo pênalti, novamente não marcado pelo juiz. Ele cortou com a mão um lançamento longo de Blokhin. Os equívocos da arbitragem ajudavam o Brasil: dois graves erros a favor e apenas um contra.
Os soviéticos voltaram a assustar e marcaram um gol em impedimento, mas desta vez o árbitro acertou ao invalidar logo o lance.
Éder decidiu a partida, com um foguete de fora da área (Imagem: Blog do Barath)
A dois minutos do apito final, enquanto o comentarista da TV Globo Márcio Guedes tentava justificar o empate, o Brasil atacava. Paulo Isidoro dominou na direita e tocou para o meio. O genial Falcão abriu as pernas, fazendo o corta-luz. Da meia-lua, Éder já dominou levantando a bola e, sem a deixar cair, emendou um petardo no contrapé do goleiro. Desaev teve a lucidez de notar que não havia nada a fazer.
Era a virada. Agora estava 2 a 1 para a Seleção que não merecia perder nunca.
Dasayev pegou tudo que deu. Entre defesas difíceis e cruzamentos interceptados, foram 18 intervenções.
Mas ainda havia tempo para mais. Serginho fez uma grande jogada, passando pelo seu marcador e batendo cruzado. Zico tentou chegar de carrinho, mas não alcançou a bola.
Foram dois minutos de acréscimos, nos quais Luciano do Valle, então na TV Globo, narrava dramaticamente os instantes finais da estreia brasileira. Justamente quando Falcão entrava cara a cara com o goleiro russo, o péssimo árbitro Lamo Castillo encerrou a partida. Provavelmente seria o terceiro gol do Brasil.
De qualquer forma, apesar do aparente nervosismo de alguns jogadores, valeu pela vitória de virada e pela demonstração de que o Brasil era, sim, o grande favorito ao título da Copa de 1982.
Ficaram alguns questionamentos. Waldir Peres sofreu um gol ridículo. Leandro não conseguiu parar Blokhin. Luizinho cometeu dois pênaltis. Serginho cansou de perder gols.
Éder comemora o gol da virada (Imagem: Blog do Ramon Paixão)
● Falcão fez um belo trabalho cobrindo as subidas dos dois laterais. Dirceu e Paulo Isidoro preencheram bem o lado direito, dando equilíbrio ao time. Nas partidas seguintes, com a volta de Toninho Cerezo ao time titular e sem ninguém de ofício na posição, o lado direito ficou fragilizado e esse equilíbrio não existiu mais.
Sobre essa partida, Zico fez algumas ponderações para o excelente livro “Sarriá 82”, de Gustavo Roman e Renato Zanata:
“Eu sei que naquele jogo deu pena do Serginho, porque ele teve tantas oportunidades, desperdiçou tantos gols. Nós entramos massacrando a União Soviética, Dasayev pegou tudo, e aí os caras foram lá e fizeram um gol. Dasayev foi o melhor jogador em campo, e, para vazá-lo, só mesmo daquela forma que os gols acabaram saindo. Aconteceu o lance dos pênaltis (não marcados em favor da URSS). Eu acho que o mais vergonhoso foi o do segundo tempo. De onde eu estava, não vi direito. Depois é que eu vi na televisão e falei ‘não é possível’, foi muito vergonhoso. No primeiro tempo acho que o cara (Shengelia) forçou um pouquinho.”
Telê Santana confessaria também: “Sofri muito, mas este foi um dos maiores jogos que vi na minha vida”.
Falcão (Roma, Itália) e Dirceu (Atlético de Madrid, Espanha) foram oficialmente os dois primeiros jogadores que atuavam fora do Brasil a serem convocados para uma Copa do Mundo. Em 1934, Patesko e Luiz Luz atuavam no Nacional, do Uruguai, mas foram inscritos como atletas da CBD, porque naquela época o Brasil só permitia amadores na Seleção e os times uruguaios eram profissionais.
A Roma, inclusive, exigiu que a CBF fizesse um seguro de 5 milhões de dólares para que Falcão pudesse atuar na Copa. Felizmente ele não teve nenhum problema físico e seria um personagem fundamental em seu clube na temporada 1982/83, liderando a Roma na conquista da Serie A.
Curiosamente, nessa vitória brasileira sobre a URSS, os travessões do estádio Sánchez Pizjuán, em Sevilha, estavam 2,5 centímetros mais baixos que o estipulado pelas regras do futebol (2,44 metros). O problema foi detectado por um ex-goleiro iugoslavo no dia seguinte à partida e o estádio só foi utilizado novamente na semifinal entre Alemanha e França, já com as traves corrigidas.
Enquanto seus principais concorrentes passavam apuros, o Brasil dava show. Foram exibições de gala e gols antológicos na sequência do Grupo 6 da primeira fase, quando golearia a Escócia por 4 a 1 e a Nova Zelândia por 4 a 0. No Grupo C da segunda fase, a Seleção deu um show na vitória por 3 a 1 sobre a Argentina e jogaria por um empate contra a Itália. Ah, Itália! Com três gols do eterno carrasco Paolo Rossi, os italianos venceram os brasileiros por 3 a 2 na “Tragédia do Sarriá” e seguiram caminho rumo ao seu tricampeonato.
A União Soviética ficou em segundo 6. Após a derrota para o Brasil, venceu a Nova Zelândia (3 x 0) e empatou com a Escócia (2 x 2). No Grupo A da fase seguinte, venceu a Bélgica por 1 a 0 e empatou sem gols com a Polônia. Ficou fora das semifinais apenas no saldo de gols, pois a Polônia havia vencido a Bélgica por 3 a 0.
Gol de empate do Brasil, marcado por Sócrates (Imagem: Marco Sousa / Fox Sports)
Muitos achavam que jogar contra os colombianos seria moleza para os soviéticos, já que estes eram considerados fortes favoritos inclusive para a conquista do título mundial.
A seleção colombiana debutava em Copas do Mundo. Tinha uma equipe técnica e ofensiva, mas era fraquíssima e desobediente taticamente.
A URSS vinha de excelentes resultados, como a medalha de ouro nos Jogos Olímpicos de 1956 e a conquista do título da primeira Eurocopa, disputada em 1960. Era mesmo uma grande geração, com destaques como o goleiro Lev Yashin, os meias Igor Netto e Igor Chislenko e o atacante Valentin Ivanov. Essa mesma base ainda seria vice-campeã da Euro em 1964 e 4º lugar na Copa do Mundo de 1966.
Ambas seleções atuavam no sistema 4-2-4
● Apenas 8.040 pessoas assistiram à partida no estádio Carlos Dittborn, em Arica.
Os colombianos começam com uma incrível demonstração de técnica, com toques de efeito na bola, mas logo os soviéticos dominam o jogo.
Aos oito minutos, Óscar López tenta tirar a bola da área e joga nos pés de Ivanov, que chuta de primeira da entrada da área e fuzila o goleiro Sánchez.
Dois minutos depois, Ivanov lança para Chislenko, que entra na área, dribla um adversário e toca na saída do goleiro.
Tudo indicava uma enorme goleada, porque um minuto depois Ivanov chuta cruzado, do bico da área, e manda a bola no canto direiro de Sánchez. Com apenas 11 minutos de jogo, o placar já apontava 3 a 0 para a URSS.
Mas aos 21′, os colombianos furam a “Cortina de Ferro” soviética. Serrano toca para Germán Aceros, que gira e, com um toque, encobre o goleiro Yashin, que estava adiantado.
O gol parece dar vida nova aos colombianos e deixa os soviéticos sem saber o que esperar.
Na segunda etapa, os sul-americanos continuam pressionando e os europeus se postam bem na defesa.
Aos 11′, Ponedelnik recebe na área e chuta sem defesa para o goleiro. Agora, 4 a 1 para a URSS.
Aos 23 minutos, escanteio para a Colômbia. Marcos Coll cobra o corner. Chokheli se posiciona na primeira trave, mas deixa a bola passar e Yashin fica só olhando. Chokheli levou uma bronca de Yashin e os soviéticos não se entenderam mais em campo. Esse é o único gol olímpico da história das Copas.
Marcos Coll, autor do único gol olímpico na história das Copas (Imagem: Pinterest)
Aos 27′, Klinger toca para González na esquerda. Ele rola para o meio da área e Antonio Rada chega chutando de primeira.
O dramático empate veio aos 41 minutos do segundo tempo. Klinger recebe lançamento de Rada, ganha a dividida contra Yashin e toca para o gol vazio.
Uma incrível reação dos colombianos depois se estarem perdendo por 3 a 0.
(Imagem: Anotando Fútbol)
● Essa foi a partida com mais gols na Copa de 1962.
Por mais que a arbitragem não tivesse sido questionada em nenhum lance dessa partida, anos depois, o árbitro brasileiro João Etzel Filho confessou que deu uma “ajudinha” aos colombianos: “Fui eu que empatei aquele jogo. Sou descendente de húngaros e odeios os russos desde a invasão soviética na Hungria em 1956”.
A Colômbia já havia perdido para o Uruguai por 2 a 1. Depois, ainda perderia para a Iugoslávia por 5 a 0. Foi lanterna do Grupo 1. O único ponto conquistado foi esse empate com a URSS.
Já os soviéticos terminaram em primeiro do grupo. Além deste empate, venceram a Iugoslávia (2 x 0) e o Uruguai (2 x 1). Caíram para os anfitriões, chilenos, nas quartas de final, em derrota por 2 a 1.
Cumprimentos iniciais entre o trio de arbitragem e os capitães Efraín “El Caimán” Sánchez e Igor Netto (Imagem localizada no Google)
Três pontos sobre… … 15/06/1986 – Bélgica 4 x 3 União Soviética
O capitão Jan Ceulemans é perseguido pela marcação soviética (Imagem: Pinterest)
● Era uma tarde de sol escaldante no estádio Nou Camp, em León, estado mexicano de Guanajuato. Mais quente ainda seria a partida das quartas de final entre Bélgica e União Soviética.
As duas seleções vinham cumprindo papéis distintos no Mundial. Na primeira fase, os belgas ficaram em terceiro lugar no grupo B, com uma derrota (2 a 0 para o México), uma vitória (2 a 1 sobre o Iraque) e um empate (2 a 2 com o Paraguai). Foi um desempenho fraco, para quem ainda tinha como base a equipe vice-campeã da Eurocopa em 1980. Não era o time dos sonhos, mas aquela foi a primeira “ótima geração belga”. Aliando experiência e juventude, os destaques eram Eric Gerets, Stéphane Demol, Jan Ceulemans, Jean-Marie Pfaff (eleito melhor goleiro da Copa) e o prodígio Enzo Scifo (então com 20 anos).
Por outro lado, a União Soviética sempre foi uma equipe dura de ser batida. Terminaram a primeira fase como líderes do grupo C, com vitórias sobre a Hungria (goleada por 6 a 0) e Canadá (2 a 0), além de um empate com a fortíssima França (1 a 1). Com a base do Dínamo de Kiev, campeão da Recopa Europeia, o técnico Valeriy Lobanovs’kyi tinha em seu time destaques como Igor Belanov, Aleksandr Zavarov, o ótimo goleiro Rinat Dasayev (que tinha completado 29 anos dois dias antes) e o veterano Oleg Blokhin (Bola de Ouro em 1975).
Esses resultados colocavam a URSS amplamente favorita a passar para as quartas de final. O retrospecto histórico ainda era favorável, com quatro vitórias soviéticas em quatro jogos disputados entre eles.
A Bélgica era escalada no 3-5-2, com Ceulemans coordenando as ações entre o meio e o ataque.
A URSS jogava no 4-5-1, com um líbero atrás da linha de três defensores. Os meias laterais tinham muita habilidade e apoiavam Belanov no ataque.
● A partida começou com belas e contínuas trocas de passes entre os soviéticos. Mesmo pressionando, eles demoraram 27 minutos a abrirem o placar. Com uma ótima jogada, Zavarov encontrou Belanov entre as linhas e ele chutou forte da entrada da área para inaugurar o marcador.
Os soviéticos tentaram ampliar, mas Pfaff estava exuberante no gol.
No começo do segundo tempo, aos 11 minutos, a Bélgica foi para cima e Scifo (em posição duvidosa) finalizou com muita tranquilidade um cruzamento de Vercauteren.
O empate se seguiu até os 25 minutos, quando Ceulemans perdeu a bola na intermediária defensiva e, novamente, o ótimo Zavarov deu uma excelente assistência para Belanov marcar o segundo, chutando cruzado na saída de Pfaff.
Sete minutos depois, Demol faz um longo lançamento e Ceulemans (em posição de impedimento) dominou no peito, girou e finalizou ao gol. Era o empate.
No minuto final do tempo regulamentar, Dasayev faz uma defesa monumental em cabeçada de Ceulemans.
No tempo normal, empate em 2 a 2. Em uma partida em que a Bélgica jogava no contra-ataque e a URSS esbarrava em Pfaff, a prorrogação se tornou um caminho natural.
Os soviéticos saíram de campo pregados e reclamando bastante dos lances irregulares. A verdade é que a URSS foi prejudicada pela arbitragem em dois lances vitais na partida.
Além do bom preparo físico, os belgas voltaram com outra mentalidade e passaram a ter mais posse de bola. E foi assim que os “Diabos Vermelhos” começaram a criar suas chances.
Aos 12 minutos do tempo extra, Vercauteren cobra um escanteio curto e Gerets fez um cruzamento precioso na cabeça do zagueiro Demol, que apareceu como um foguete e cabeceou no ângulo.
Aos 5 do segundo tempo, a Bélgica ampliou. Após ótima jogada de Ceulemans, Lei Clijsters (pai da tenista Kim Clijsters) e Claesen tabelam pelo miolo da área. A bola sobe e Claesen, de primeira, acerta o canto direito.
O resto da partida foi toda de Pfaff.
Um minuto depois, Belanov é empurrado por Gerets dentro da área. O próprio Belanov cobrou, chutando forte, alto e no meio do gol.
A URSS continuou em busca do empate, mas sem sucesso.
Apesar da quantidade de gols, os dois goleiros foram protagonistas na partida.
Sergey Aleynikov tenta driblar o menino Scifo (Imagem: Pinterest)
● Esse jogo contra os soviéticos provavelmente foi o momento mais importante da história do futebol belga, pois foi o início de uma campanha histórica, que colocou de vez a Bélgica no hall das grandes seleções mundiais.
Na sequência, os embalados “Diabos Vermelhos” eliminaram a Espanha nos pênaltis (5 a 4, após um empate por 1 a 1 no tempo normal e prorrogação). Nas semifinais, caíram de pé para a Argentina (2 a 0), com um inspirado Maradona, autor dos dois gols.
Na decisão do 3º lugar, ainda perderiam para a França de Michel Platini na prorrogação por 4 a 2. Não faz mal. Já havia feito história.
Como curiosidade, a seleção soviética tinha onze jogadores que atuavam no Dínamo de Kiev, cidade a pouco mais de 100 km de Chernobyl, que sofreu um gravíssimo acidente nuclear menos de dois meses antes do desembarque da equipe no México.
A delegação belga repetiu o que os ingleses fizeram em 1970 e levaram mantimentos próprios para evitar o “mal de Montezuma“, que causa intoxicação alimentar em alguns estrangeiros no México. Dessa vez, no entanto, os mexicanos não se sentiram ofendidos com essa atitude (diferentemente de 1970, em relação à Inglaterra).
Igor Belanov, destaque da URSS e do Dínamo de Kiev, foi o segundo jogador em Copas do Mundo a fazer um “hat trick” (três gols no mesmo jogo) e sua equipe perder. [Falaremos do primeiro caso no dia 26/06.] No fim do ano de 1986, Belanov seria eleito Bola de Ouro pela revista France Football.
Vladimir Bessonov rouba a bola de Ceulemans (Imagem: Pinterest)
Três pontos sobre… … Mané Garrincha: “Anjo de Pernas Tortas”
(Imagem: paixaocanarinha.com.br)
● Em 1958, em testes antes da Copa, foi diagnosticado como “retardado” por João Carvalhaes, psicólogo da delegação brasileira. Por ser considerado irresponsável, não foi escalado como titular nos dois primeiros jogos do Brasil, mas, após dois jogos fracos da equipe, se tornou titular. No terceiro jogo, contra a União Soviética, o técnico Vicente Feola deu a ordem para atacarem diretamente na saída de bola, pelo lado direito, com Garrincha. Ele recebeu a bola na direita, driblou três adversários e chutou cruzado na trave. Ainda com menos de um minuto, deu uma assistência para Pelé também acertar a trave. Aos 2 minutos, Didi deu uma linda assistência para o gol de Vavá, que abriu o Placar. O jogo terminou com 2 a 0. Segundo o jornalista francês Gabriel Hanot (idealizador da Liga dos Campeões da Europa), aqueles foram “os três melhores minutos da história do futebol”. Foi campeão do mundo com a camisa 11, pois a 7 foi vestida por Zagallo. (O Brasil não enviou a numeração oficial e a FIFA “jogou” os números de forma aleatória.)
● Quando Pelé se contundiu logo no segundo jogo da Copa de 1962, Garrincha “fez papel de Pelé” e conduziu o Brasil ao título. Ele deu show nas quartas de final, no 3 a 1 contra a Inglaterra, com um gol de cabeça e outro em chute central da entrada da área. Em determinado momento, um cachorro invadiu o gramado e “driblou” vários jogadores, inclusive Garrincha, mas foi capturado pelo atacante Jimmy Greaves (apesar de ter ensopado a camisa do inglês de xixi). Após o jogo, o cão foi sorteado por um oficial chileno entre os jogadores brasileiros e Garrincha ganhou e lhe deu o nome de “Bi”. Nas semifinais diante dos anfitriões chilenos, Mané fez mais dois gols: um de perna esquerda e um de cabeça. Aos 38 minutos do segundo tempo, reagiu a uma cusparada e a um tapa na cara e revidou com um chute na bunda do chileno Eládio Rojas e foi expulso. Mas o julgamento foi marcado apenas para depois do último jogo da Copa. Foi a única expulsão em sua carreira. Na final contra a Tchecoslováquia, mesmo ardendo em febre, Garrincha liderou sua equipe e conquistou o segundo título mundial consecutivo. Na Copa de 1966, já atuava no Corinthians e estava completamente fora de forma, sem ritmo de jogo e se recuperando de uma lesão no joelho. Marcou um gol de falta no 2 a 0 contra a Bulgária, na estreia. No jogo seguinte, sem Pelé (lesionado), perdeu sua única partida com a camisa canarinho, para a Hungria, por 3 a 1. Não jogou contra Portugal no terceiro jogo e o Brasil foi eliminado ainda na fase de grupos.
● – Foi homenageado pela Mangueira no desfile das escolas de samba no Carnaval de 1980. Ele participou do desfile, mas estava completamente dopado por um remédio, pois tinha acabado de sair de uma internação por causa do alcoolismo.
– Diz a lenda que em um clássico entre Botafogo x Fluminense, o zagueiro Pinheiro se chocou com o ponta Quarentinha, se lesionando. A bole sobrou para Garrincha fazer o gol, livre, diante do goleiro, mas ele jogou a bola pela lateral para que seu adversário fosse atendido. Essa é uma das primeiras ocasiões conhecidas de “fair play“.
– Garrincha criou o “olé” no futebol. Em história contada no livro “Histórias do Futebol”, João Saldanha diz que foi no México, em 1957, no Estádio Universitário, em um amistoso contra o River Plate (ARG), quando Mané fez gato e sapato do lateral esquerdo adversário, Vairo. Segundo Saldanha, “toda vez que Mané parava na frente de Vairo, os espectadores mantinham-se no mais profundo silêncio. Quando Mané dava aquele seu famoso drible e deixava Vairo no chão, um coro de cem mil pessoas exclamava: ‘Ô ô ô ô ô ô-lê!’ Foi ali, naquele dia, que surgiu a gíria do ‘olé’. As agências telegráficas enviaram longas mensagens sobre o acontecimento e deram grande destaque ao ‘olé’. As notícias repercutiram bastante no Rio e a torcida carioca consagrou o ‘olé’”.
– Garrincha costumava chamar todos seus marcadores de “João”. Isso porque certa vez um repórter perguntou quem era o lateral que iria lhe marcar. Ele não sabia e respondeu: “Escreve aí que é um tal de João”. Ficou a lenda. Provavelmente mais uma das histórias inventadas pelo jornalista Sandro Moreyra, muito amigo de Garrincha.
– Na Copa de 1958, na Suécia, Garrincha foi a uma loja com o dentista Mário Trigo e se apaixonou pelo rádio Telefunken. O craque estava maravilhado com o radinho de pilha, quando o massagista Mário Américo disse: “Esse rádio não funcionará no Brasil, ele só fala sueco! Façamos o seguinte: você pagou 180 coroas, te dou 90 para diminuir seu prejuízo.” Ciente de que tinha feito um bom negócio se desfazendo do rádio, Mané foi reclamar com o Dr. Mário Trigo. O dentista desfez a confusão e pegou mais 180 coroas com Paulo Machado de Carvalho (chefe da delegação) e comprar outro aparelho para o inocente Mané. Há várias versões dessa história, mas essa foi a confirmada pelo Dr. Mário Trigo.
– Certa vez o Botafogo foi fazer uma excursão em Madri e Garrincha sumiu logo na primeira noite. O técnico Zezé Moreira, conhecendo seu jogador, partiu em busca dele nas “casas de tolerância”. Chamou um táxi e começou a percorrer as barulhentas ruas da capital espanhola, cheias de mulheres de oferecendo. Quando avistou Garrincha, mandou o taxista parar. Já ia descendo do carro quando Mané, que também o viu, gritou, fazendo a maior festa: “Aí, hein, seu Zezé! O senhor também aqui na zona?” Zezé não soube o que fazer e partiu no mesmo táxi que o trouxe.
P.S.: Essas e outras histórias viraram folclore. Na verdade, nunca se soube o que era fato sobre o Mané e o que era exagero ou pura “criatividade” de seu amigo jornalista Sandro Moreyra.