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… 19/06/1938 – Brasil 4 x 2 Suécia

Três pontos sobre…
… 19/06/1938 – Brasil 4 x 2 Suécia


(Imagem: CBF / Correio da Manhã)

● A bem da verdade, a Suécia chegou tão longe por causa dos “atalhos”. Foi sorteada na chave da Áustria, em jogo que não ocorreu (como contamos detalhadamente aqui). Nas quartas de final, enfrentou a inexpressiva seleção de Cuba e goleou por 8 a 0. E foi reprovada logo em seu primeiro teste, ao perder para a Hungria nas semifinais por 5 a 1. Assim, sem fazer força alguma, a Suécia estava entre os quatro melhores da Copa.

Por sua vez, a Seleção Brasileira só enfrentou adversários com alto grau de dificuldade. Nas oitavas, precisou da prorrogação para bater a Polônia por 6 a 5. Nas quartas, foram necessárias duas partidas para passar pela Tchecoslováquia (1 x 1 no primeiro duelo e 2 x 1 no jogo desempate). Na semi, não contou com Leônidas, mas mesmo assim vendeu caro a derrota por 2 a 1 para a então campeã Itália.

Confiante na vitória sobre a Itália, os dirigentes brasileiros já haviam comprado as passagens aéreas de Marselha a Paris, onde seria a final da Copa. Depois da derrota, tomados pela raiva, os brasileiros se recusaram a ceder as passagens aos italianos – que tiveram de fazer a viagem de trem. Também foi de trem a volta do Brasil para Bordeaux.

Aliás, certamente o Brasil foi a seleção mais prejudicada pelas viagens em toda a história das Copas. Jogou contra a Polônia em Estrasburgo. De lá, viajou 758 quilômetros até Bordeaux para enfrentar a Tchecoslováquia. Depois, andou mais 503 km até Marselha, onde enfrentou a Itália. E, pra encerrar, voltou até Bordeaux (mais 503 km). Ao todo foram 1.764 km, ou seja, quase dois dias em viagem de trem.

Assim, Brasil e Suécia se encontraram na partida que decidiu o 3º lugar da Copa de 1938. Curiosamente, esse jogo ocorreu simultaneamente à final, que foi disputada entre Itália e Hungria.

Leônidas não pôde jogar contra a Itália, mas se recuperou a tempo de atuar contra os suecos.


O Brasil atuava no sistema clássico, o 2-3-5, com muita fragilidade no sistema defensivo.


A Suécia também atuava no 2-3-5, como era comum na época, mas mais obediente taticamente do que o Brasil.

● O que mais chamava a atenção da imprensa estrangeira em relação à Seleção Brasileira na Copa de 1938 foi o abismo entre o alto nível técnico dos jogadores e a disposição tática rudimentar. As duas equipes eram escaladas no sistema clássico, mas a linha de meio-campo brasileira era mais estática, ao invés de ser mais combativa e focar na marcação. Afinal, no esquema 2-3-5, a defesa e o meio campo deveriam ser os responsáveis pela marcação da linha de frente adversária. Mas os médios brasileiros costumavam deixar os zagueiros muito expostos. Um pouco devido às características dos jogadores tupiniquins, mas também por causa da falta de entrosamento e da bagunça feita pelo técnico Ademar Pimenta.

A Suécia era uma equipe que passava muito longe de ter o talento brasileiro, mas era melhor distribuída em campo.

O confronto começou com certo equilíbrio, mas logo o Brasil começou a tomar conta do jogo. E desperdiçou várias oportunidades com Leônidas, Patesko e Roberto.

Aos 28′, Brandão errou o passe, Harry Andersson interceptou e lançou Sven Jonasson, que chutou forte para abrir o placar.

O escrete brasileiro tentou reagir, mas continuou errando muitos gols.

Os nórdicos aproveitaram para marcar o segundo, aos 38′. O perigoso Jonasson avançou pelo lado esquerdo e cruzou para Arne Nyberg, que driblou Machado e finalizou para notar o segundo tento de sua equipe.

No último minuto da etapa inicial, Zezé Procópio lançou Romeu, que driblou dois adversários e chutou para marcar. Esse gol aliviou um pouco a situação e permitiu que o Brasil fosse para o vestiário com menos peso sobre os ombros.

A Seleção voltou para o segundo tempo pressionando em busca do empate e teve a chance logo aos dois minutos. Domingos lançou para Romeu, que passou para Roberto. Ele invadiu a área e foi derrubado por Erik Almgren. O árbitro belga John Langenus assinalou o pênalti. Patesko foi o encarregado da cobrança, mas bateu por cima do gol.

O empate veio aos 18′. Zezé tocou para Romeu (o artífice da criação do ataque brasileiro), que cruzou para a área. Leônidas se antecipou e deu um toquinho para encobrir o goleiro Henock Abrahamsson.

A partir dali, o Brasil passou a ter o controle da partida e os brasileiros, enfim, conseguiram transformar a superioridade técnica em gols.

O terceiro saiu aos 29′. Leônidas fez uma triangulação com Roberto e Romeu pelo lado direito e, contrariando as suas características, chutou de longe para virar o jogo.

A dez minutos do fim, Romeu (sempre ele) trocou passes com Leônidas, que lançou Perácio. O atacante do Botafogo mandou uma bomba de fora da área, sem chances para o goleiro sueco.

Cabe ressaltar que esse foi o único jogo em que Domingos da Guia passou sem cometer algum pênalti. Ele havia cometido três nos três jogos anteriores – justamente pela falta de proteção à defesa.


(Imagem: Pinterest)

● Essa até hoje é a maior virada brasileira na história das Copas.

No fim, ambos os países estavam orgulhosos por terem emplacado suas melhores campanhas em Copas até então.

A classificação final fez nascer no Brasil inteiro um sentimento de orgulho pelo bom desempenho da Seleção.

A delegação chegou de volta ao Rio de Janeiro 15 dias depois e teve uma recepção “apoteótica”, segundo o cronista Thomas Mazzoni, de A Gazeta Esportiva. Antes, o navio Almanzora teve que fazer escalas em Recife e Salvador e a recepção foi igualmente frenética. Na Bahia, um torcedor chegou a roubar o sapato de Leônidas. No Rio, às 15h30 de 02 de julho, o navio iniciou as manobras para atracar no porto e a polícia teve dificuldades para manter o cordão de isolamento que impedia o público de se aproximar do cais.

Em seguida, os jogadores desfilaram em carros abertos pela Avenida Rio Branco. Leônidas era o mais assediado e precisou ser conduzido em um veículo de transportes de soldados do Corpo de Fuzileiros Navais, protegido por uma brigada inteira de militares. Ainda assim, o cortejo não se movia e a polícia teve que fazer uso de força para que o público deixasse o desfile acontecer. A alegria era tamanha que os torcedores esqueceram todas as críticas anteriores. Até o técnico foi aplaudido e carregado pela multidão.

Como sempre, as autoridades políticas fizeram questão de posar para fotos com os jogadores, especialmente os mais populares segundo um concurso feito na época pelo Cigarro Magnólia: Leônidas, Domingos da Guia e Romeu.

Leônidas da Silva foi o artilheiro do certame com sete gols, sendo o único brasileiro a marcar gols em todas as partidas que disputou em Copas (fez um gol também em 1934). Aproveitando-se da popularidade de Leônidas, a Lacta lançou a barra de chocolate “Diamante Negro”, em referência ao apelido que o craque tinha recebido dos uruguaios em 1932.


A multidão se aglomera para receber a delegação brasileira (Imagem: CBF / Correio da Manhã)

FICHA TÉCNICA:

 

BRASIL 4 x 2 SUÉCIA

 

Data: 19/06/1938

Horário: 17h00 locais

Estádio: Parc Lescure

Público: 12.000

Cidade: Bordeaux (França)

Árbitro: John Langenus (Bélgica)

 

BRASIL (2-3-5):

SUÉCIA (2-3-5):

Walter (G)

Henock Abrahamsson (G)

Domingos da Guia

Ivar Eriksson

Machado

Erik Nilsson

Zezé Procópio

Erik Almgren

Brandão

Arne Linderholm

Afonsinho

Kurt Svanström (C)

Roberto

Åke Andersson

Romeu Pellicciari

Sven Jonasson

Leônidas da Silva (C)

Arne Nyberg

Perácio

Harry Andersson

Patesko

Erik Persson

 

Técnico: Ademar Pimenta

Técnico: József Nagy

 

SUPLENTES:

 

 

Batatais (G)

Gustav Sjöberg (G)

Jaú

Olle Källgren

Nariz

Harry Nilsson

Britto

Sven Jacobsson

Martim Silveira

Karl-Erik Grahn

Argemiro

Curt Bergsten

Lopes

Lennart Bunke

Luisinho Mesquita de Oliveira

Knut Hansson

Niginho

Tore Keller

Tim

Sven Unger

Hércules

Gustav Wetterström

 

GOLS:

28′ Sven Jonasson (SUE)

38′ Arne Nyberg (SUE)

44′ Romeu Pellicciari (BRA)

63′ Leônidas da Silva (BRA)

74′ Leônidas da Silva (BRA)

80′ Perácio (BRA)

Imagens da partida:

… 12/06/1938 – Itália 3 x 1 França

Três pontos sobre…
… 12/06/1938 – Itália 3 x 1 França


(Imagem: Calciopédia)

● Como tradicionalmente acontece, a seleção francesa era majoritariamente formada por “estrangeiros”. Havia um jogador nascido na Guiana Francesa, mas origem senegalesa (Raoul Diagne), um nascido em Luxemburgo (Julien Darui), um uruguaio (Hector Cazenave), um austríaco (Auguste Jordan), um suíço (Roger Courtois), quatro alemães (Oscar Heisserer, Émile Veinante, César Povolny e Ignace Kowalczyk) e cinco argelinos (Jean Bastien, Abdelkader Ben Bouali, Lucien Jasseron, Michel Brusseaux e Mario Zatelli).

O técnico Gaston Barreau também apostava muito na experiência de atletas que já haviam disputado as Copas anteriores. Eram três remanescentes de 1930 e 1934 (Étienne Mattler, Edmond Delfour e Veinante) e cinco de 1934 (Alfred Aston, Jean Nicolas, René Llense, Jules Vandooren e Courtois).

O ponto forte de Les Bleus era a defesa, com o goleiro Laurent Di Lorto e os zagueiros Cazenave e o capitão Mattler. O sistema defensivo era chamado de “Linha Maginot” – uma linha de fortificações e de defesa construída pela França ao longo de suas fronteiras com a Alemanha e a Itália entre 1930 e 1936.

Na estreia, nas oitavas de final, a França venceu a Bélgica por 3 a 1. Nas quartas, a adversária era a fortíssima Itália.


(Imagem: Wikipédia)

● Como não poderia deixar de ser, a Squadra Azzurra era a maior favorita ao título. Campeã em 1934, a seleção do técnico Vittorio Pozzo vinha bastante renovada e ainda melhor do que quatro anos antes. Com um time mais leve e mais técnico, apenas Giuseppe Meazza e Giovanni Ferrari permaneciam como titulares.

O principal craque do time era Silvio Piola, um centroavante de muita mobilidade, capaz de criar e concluir as jogadas. Ele estava em seu auge técnico e mostrou todas suas qualidades no Mundial.

O ditador Benito Mussolini, “Il Duce”, ainda era o principal catalisador para que os atletas italianos jogassem como se fossem o último dia de suas vidas. Às vésperas da Segunda Guerra Mundial, ainda permanecia o lema “vitória ou morte”.

O primeiro obstáculo foi a Noruega. E os italianos suaram bastante para vencer os nórdicos por 2 x 1 na prorrogação.


A Itália jogava em uma adaptação do sistema 2-3-5 chamada “Metodo”, que consistia no ligeiro recuo de dois atacantes, deixando o ataque em uma espécie de “W”, com dois meia-atacantes, dois pontas bem abertos e um centroavante.


A França atuava no sistema W-M, que já começava a ser o mais usual entre os europeus.

● Com 58.455 expectadores, esse foi o jogo com o maior público da Copa de 1938. O público excedeu em 15% a capacidade do estádio olímpico de Colombes – sem contar as outras dez mil pessoas ficaram do lado de fora.

As seleções tinham empatado sem gols em março, em um amistoso disputado em Paris. Esse resultado deu certa esperança aos franceses. Mas dessa vez os italianos não deram chances aos rivais.

Aproveitando que os franceses tradicionalmente também jogavam de camisa azul, a Itália aproveitou para fazer outro agrado a Mussolini: entrou em campo com o uniforme todo preto, a cor símbolo oficial do fascismo e das fardas de seu exército. A “Squadra Azzurra” se transformou em “Squadra Nera”.

Ao entrar em campo, os italianos cumprimentaram as tribunas com a tradicional saudação fascista: braço direito estendido e a mão espalmada para baixo. A reação da torcida não poderia ter sido outra: vaias e mais vaias, que duraram muitos minutos.

Mas o novo fardamento fez bem ao time, que estava mais solto que na partida anterior.

O goleiro francês Laurent Di Lorto já havia feito duas boas intervenções ainda no início do jogo.

Mas o placar foi aberto logo aos nove minutos de jogo, com um dos gols mais cômicos de todas as Copas. O ponta esquerda Gino Colaussi deu um chute de média distância, a bola subiu muito e desceu de repente. O goleiro Di Lorto foi surpreendido e tentou fazer a defesa, mas se chocou com a trave direita enquanto a bola caía para dentro do gol. Falha feia. E 1 a 0 no placar para os italianos.

Os franceses não se deixaram abater e empataram no minuto seguinte, com Oscar Heisserer.

Mas, no segundo tempo, Silvio Piola resolveu o jogo para a Itália e marcou dois gols: aos 6′ e aos 26′.


(Imagem: Pinterest)

● Placar final: atual campeã e maior favorita 3, dona da casa e eliminada 1.

Com a eliminação de sua seleção, a torcida local elegeu outro time para torcer: o Brasil.

Na semifinal, a Itália teve na Seleção Brasileira um adversário duríssimo, mas venceu por 2 x 1 com um pênalti polêmico.

Na decisão, a Azzurra venceu a Hungria por 4 x 2 e se tornou o primeiro bicampeão mundial.


Sorteio e cumprimentos iniciais entre o trio de arbitragem e os capitães Giuseppe Meazza e Étienne Mattler (Imagem: AFP / Getty Images)

FICHA TÉCNICA:

 

ITÁLIA 3 x 1 FRANÇA

 

Data: 12/06/1938

Horário: 17h00 locais

Estádio: Olympique de Colombes

Público: 58.455

Cidade: Colombes (França)

Árbitro: Louis Baert (Bélgica

 

ITÁLIA (2-3-5):

FRANÇA (W-M):

Aldo Olivieri (G)

Laurent Di Lorto (G)

Alfredo Foni

Hector Cazenave

Pietro Rava

Étienne Mattler (C)

Pietro Serantoni

Jean Bastien

Michele Andreolo

Auguste Jordan

Ugo Locatelli

Raoul Diagne

Amedeo Biavati

Alfred Aston

Giuseppe Meazza (C)

Oscar Heisserer

Silvio Piola

Jean Nicolas

Giovanni Ferrari

Edmond Delfour

Gino Colaussi

Émile Veinante

 

Técnico: Vittorio Pozzo

Técnico: Gaston Barreau

 

SUPLENTES:

 

 

Guido Masetti (G)

René Llense (G)

Carlo Ceresoli (G)

Julien Darui (G)

Eraldo Monzeglio

Abdelkader Ben Bouali

Bruno Chizzo

César Povolny

Aldo Donati

Jules Vandooren

Renato Olmi

François Bourbotte

Mario Genta

Lucien Jasseron

Mario Perazzolo

Michel Brusseaux

Sergio Bertoni

Roger Courtois

Pietro Ferraris

Ignace Kowalczyk

Pietro Pasinati

Mario Zatelli

 

GOLS:

9′ Gino Colaussi (ITA)

10′ Oscar Heisserer (FRA)

51′ Silvio Piola (ITA)

72′ Silvio Piola (ITA)

Imagens da partida:

… 05/06/1938 – Suécia W.O. Áustria

Três pontos sobre…
… 05/06/1938 – Suécia W.O. Áustria

“Anschluß”


Seleção sueca na Copa do Mundo de 1938 (Imagem: O Curioso do Futebol)

● O Grupo 1 das eliminatórias da Copa dava direito a duas vagas no torneio. A Alemanha venceu a Finlândia (2 x 0) e a Estônia (4 x 1). Por sua vez, a Suécia também bateu a Finlândia (4 a 0) e a Estônia (7 x 2). Assim, alemães e suecos já estavam classificados quando se enfrentaram em Hamburgo. A Suécia foi com o time reserva e acabou sendo goleada por 5 x 0. De qualquer forma, a vaga no Mundial já estava garantida antecipadamente. Na definição do chaveamento da Copa, a Suécia foi sorteada na chave que teria a Áustria. Aliás, “não teria” a Áustria.


“Wunderteam” austríaco dos anos ’30 (Imagem: Trivela)

● Contando com vários jogadores remanescentes do “Wunderteam” (“time maravilha”), a seleção austríaca conquistou sua vaga na Copa do Mundo de 1938, mas, na época do torneio, não tinha um país para representar.

A Áustria teve certa facilidade no Grupo 8 das eliminatórias para a Copa. Foi beneficiada com a vantagem de fazer uma única partida, em casa, contra o vencedor do duelo entre Letônia e Lituânia. Os letões venceram os lituanos nos dois jogos (4 x 2 Riga e 5 x 1 em Kaunas).

Prevendo facilidade na partida, os austríacos mandaram a campo uma seleção experimental (na prática, um time reserva). A Letônia abriu o placar com Iļja Vestermans logo aos 6′, mas os austríacos viraram ainda no primeiro tempo, com Camillo Jerusalem aos 15′ e Franz Binder aos 33′. Vencendo por 2 a 1, a Áustria passou o restante da partida sufocada pela modesta e entusiasmada Letônia, mas conseguiu se segurar e garantir a vaga no Mundial.


Multidão aplaude os nazistas em Viena (Imagem: Wikipédia)

● Na véspera do torneio, a Europa estava às portas da Segunda Guerra Mundial, que ocorreu oficialmente entre 1939 e 1945. E o conflito político interferiu diretamente no Mundial organizado pela França.

No dia 12 de março de 1938, pouco menos de três meses antes do início da Copa, a Alemanha nazista deu um choque no mundo. Os tanques de guerra de Adolf Hitler invadiram Viena. Sem precisar disparar nenhum tiro e não encontrando qualquer oposição, o exército germânico foi recebido entusiasticamente pela maioria da população austríaca, surpreendendo até os próprios alemães.

No dia seguinte, o Führer (que era austríaco de nascimento) decretou oficialmente o “Anschluß”, a anexação político-militar da Áustria por parte da Alemanha, que abrangeu todos os aspectos da vida do país. Assim, a Áustria deixou de ser um estado independente e foi convertido em uma província do Terceiro Reich, com o nome de Ostmark.

Em 10 de abril houve um referendo que avalizou a anexação com 99% de aprovação da população austríaca. Esse resultado claramente foi manipulado para legitimar o “Anschluß”, mas, de fato, existia um certo apoio a Hitler, especialmente das camadas mais pobres e menos esclarecidas – até porque toda a oposição clara era duramente reprimida.

O mundo assistiu a situação de forma passiva e só Reino Unido e França condenaram a invasão.


O Reich alemão, em rosa, e a Áustria, em vermelho (Imagem: Wikipédia)

Imediatamente, a Federação de Futebol Alemã comunicou à FIFA que a Áustria havia “deixado de existir como país” e os jogadores nascidos em seu território poderiam representar a nova pátria. Resumindo: o “Wunderteam” teria jogadores sendo obrigados a “prestar serviços” à seleção alemã no Mundial.

No dia 03 de abril foi realizado um último jogo amistoso entre Alemanha e Áustria para festejar a unificação. Foi o “Anschlussspiel” (“jogo de conexão”). O lema era “Ein Volk, ein Reich, ein Führer” (“Um povo, um império, um líder”). A partida estava empatada sem gols, em um ritmo morno, até que Matthias Sindelar fez o gol da vitória austríaca. O atacante comemorou como se esse tivesse sido o maior feito de sua vida – ele era um opositor claro ao regime nazista. Karl Sesta ainda anotou o segundo tento, com a partida finalizando em 2 x 0 para os “anexados” diante dos “anexadores”. Mas o foco permaneceu em Sindelar. Comemorando a vitória, ele ensaiou uma valsa em frente a tribuna das autoridades alemãs – que não esconderam seu desagrado.


Matthias Sindelar, “Der Papierene” (Imagem: Trivela)

Matthias Sindelar, conhecido como “Der Papierene” (“Homem de Papel”) pelo seu físico magro, leveza e mobilidade é considerado o melhor jogador de seu país em todos os tempos. Na época, ele já era veterano, aos 35 anos, e se recusou a defender a seleção da Alemanha. Juntando tudo isso, ele se tornou “persona non grata” para os nazistas. Sindelar faleceu asfixiado por monóxido de carbono em 23/01/1939, pouco depois de sua esposa. A versão oficial é que ele se matou. A história romântica diz que ele “foi suicidado” pelo regime nazista por ser judeu.

Pega de surpresa e com certo temor pelo expansionismo territorial teutônico, a FIFA reagiu sem nenhum rigor. Com a maior naturalidade possível e tentando contornar a situação, a entidade convidou a Inglaterra a ocupar a vaga austríaca, mas o English Team – sabiamente – declinou o convite. Então, a Letônia solicitou sua inclusão na Copa, invocando sua condição de vice-campeã do Grupo 8 das eliminatórias. Seria a saída mais lógica, mas a FIFA negou o pedido.

Com isso, a Copa teve 15 participantes ao invés dos 16 previstos.


Hitler anuncia o Anschluss na Heldenplatz (Praça dos Heróis), em Viena, dia 15 de março de 1938 (Imagem: AP Images / Britannica)

● Assim, a partida das oitavas de final entre Suécia e Áustria que estava marcada para ser jogada no estádio Gerland, em Lyon, no dia 05 de junho de 1938, não pôde ser realizada. De forma ridícula e passiva, a FIFA considerou que a Áustria “não havia comparecido para jogar” – embora vários atletas austríacos estivessem vestindo a camisa da seleção alemã contra a Suíça no dia anterior.

Sem time contra quem jogar, a Suécia passou automaticamente para as quartas de final.

Curiosamente, a sigla inglesa “W.O.” (“Walk Over”), que significa “segue adiante”, ainda não era utilizada na época. O que se falava era o termo francês “Forfeit” (“desistir”).

Até hoje esse é o único caso de W.O. da história das Copas.


Cédula de votação do referendo de 10 de abril de 1938, com o texto: “Você concorda com a unificação da Áustria com o Império Germânico sob o Führer Adolf Hitler? Sim/Não” (Imagem: Wikipédia)

● Beneficiada pelo sorteio, a Suécia enfrentou a fraca seleção de Cuba nas quartas de final e fez valer a goleada por 8 a 0. Nas semifinais, mostrou todas suas fragilidades e perdeu para a Hungria por 5 a 1. Na decisão do 3º lugar, abriu 2 a 0 de vantagem sobre o Brasil, mas a Seleção Brasileira virou para 4 a 2. A classificação final da Suécia em 4º lugar pode ser colocada na conta da sorte.

A Áustria só voltou a ser uma nação soberana ao final da Segunda Guerra Mundial.

A seleção austríaca ainda teve outros bons times, como o que conquistou o 3º lugar na Copa de 1954, mas nunca mais formou uma seleção de classe mundial como foi o “Wunderteam” da década de 1930 – destruído por Adolf Hitler e cia.


Hitler cruza a fronteira com a Áustria em março de 1938 (Imagem: Wikipédia)

FICHA TÉCNICA:

 

SUÉCIA W.O. ÁUSTRIA

 

Data: 05/06/1938

Estádio: Gerland

Cidade: Lyon (França)

… 04/06/1938 – Suíça 1 x 1 Alemanha

Três pontos sobre…
… 04/06/1938 – Suíça 1 x 1 Alemanha


(Imagem: Impromptuinc)

● O Grupo 5 das eliminatórias para a Copa do Mundo de 1938 tinha Suíça e Portugal. Houve uma única partida para decidir a vaga no Mundial, realizada no dia 01/05/1938, em campo neutro, no estádio San Siro, em Milão. Portugal tinha um ligeiro favoritismo, pois havia deixado uma boa impressão ao empatar com a Alemanha por 1 x 1 em Frankfurt, uma semana antes. Além disso, ainda contava com o fantástico centroavante Fernando Peyroteo. Mas a Suíça resolveu logo o jogo no primeiro tempo, com dois gols em cinco minutos. Georges Aeby marcou aos 23′ e Lauro Amadò fez aos 28′. Portugal só reagiu com um gol de pênalti de Peyroteo, aos 28′ da etapa final. Depois, os suíços se trancaram na defesa e garantiram a classificação para o Mundial. Nas tribunas de honra do San Siro, foi impossível deixar de notar a ilustre presença dos ditadores Benito Mussolini e Adolf Hitler, que pareciam inseparáveis naqueles tempos que antecederam a Segunda Guerra Mundial.

O Grupo 1 do qualificatório dava direito a duas vagas no torneio. A Alemanha e Suécia haviam vencido Estônia e Finlândia e já estavam classificados quando se enfrentaram em Hamburgo. Sem levar isso em consideração, os alemães fizeram valer o status de favoritos e venceram os suecos por 5 x 0.

Como vamos detalhar amanhã, pouco menos de três meses antes do Mundial, o exército nazista invadiu a Áustria e decretou o “Anschluß”, a anexação da Áustria por parte da Alemanha, abrangendo todos os aspectos da vida do país. Com isso, a Federação de Futebol Alemã comunicou à FIFA que a Áustria havia “deixado de existir como país” e os jogadores nascidos em seu território poderiam representar a nova pátria. Resumindo: o “Wunderteam” austríaco teria jogadores sendo obrigados a “prestar serviços” à seleção alemã no Mundial.


(Imagem: Impromptuinc)

● O regulamento do Mundial era o mesmo da edição anterior. Sem fase de grupos, houve um torneio eliminatório direto, começando nas oitavas de final. Se uma partida terminasse empatada depois de 90 minutos, seriam jogados mais dois tempos de 15 minutos de prorrogação. Em caso de empate, os times disputariam mais uma prorrogação nos mesmos moldes. Persistindo a igualdade, haveria outro jogo-desempate dois ou três dias depois. Curiosamente, na decisão, se não houvesse vencedor após os dois jogos com duas prorrogações, a taça seria dividida entre os finalistas.

A Alemanha tem um histórico de dar longevidade aos seus treinadores. Otto Nerz deixou o comando da Mannschaft depois do fiasco nos Jogos Olímpicos de 1936. Mesmo jogando em Berlim, a Alemanha foi eliminada precocemente nas quartas de final para a Noruega. Quem assumiu o cargo de técnico da Nationalelf foi o ex-auxiliar de Nerz, Sepp Herberger – uma astuta raposa.

A seleção alemã contou com nove atletas da extinta equipe austríaca: o goleiro Rudolf Raftl, o zagueiro Willibald Schmaus, os meias Hans Mock, Stefan Skoumal e Franz Wagner, além dos atacantes Wilhelm Hahnemann, Leopold Neumer, Hans Pesser e Josef Stroh. Desses nove, quatro faziam parte do elenco da Áustria na Copa de 1934: Raftl, Schmaus, Wagner e Stroh.


Nos anos 1930, quase todas as equipes atuavam no ofensivo sistema “clássico” ou “pirâmide”, o 2-3-5. Uma das exceções era a adversária – Alemanha.


A Alemanha já atuava há alguns anos no sistema W-M, sendo uma das pioneiras a utilizar esse esquema entre as seleções. O esquema tático reforça melhor o sistema defensivo e dá ênfase ao trabalho do meio de campo.

● Quando a Alemanha entrou em campo no estádio Parc de Princes, em Paris, para a partida inaugural da Copa, a tradicional camisa branca seguia o mesmo padrão de quatro anos antes. A novidade foi a inclusão da gola vermelha e de símbolos nazistas ao escudo do lado esquerdo do peito.

A honra de dar o pontapé inicial coube ao presidente da França, Albert Labrun. E ele conseguiu a proeza de errar o chute, arrancando grama do chão e mal fazendo a bola se mover.

O time titular da Alemanha contava com cinco jogadores austríacos: Raftl, Schmaus, Hahnemann, Pesser e Mock – o capitão da equipe.

E saiu na frente com um gol de Josef Gauchel, aos 29 minutos da etapa inicial.

Mas a Suíça, um time mais organizado em campo, empatou ainda no primeiro tempo. André Abegglen marcou aos 43′.

Não houve gols na segunda etapa e nem nas duas prorrogações de 30 minutos seguintes.

Como mandava o regulamento, o placar em igualdade forçou um jogo extra para desempatar a peleja.

O ponta esquerda alemão/austríaco Hans Pesser foi o primeiro jogador expulso no Mundial, aos seis minutos do primeiro tempo da prorrogação. Ele cometeu uma falta muito violenta sobre o capitão suíço Severino Minelli. A falta foi tão dura que a própria Federação Alemã de Futebol o puniu, o suspendendo por seis meses em seu clube (Rapid Viena) e por um ano na seleção alemã.

Houve um enorme equilíbrio nas oitavas de final. Dos sete jogos disputados, cinco foram para a prorrogação (Alemanha 1 x 1 Suíça, Brasil 6 x 5 Polônia, Tchecoslováquia 3 x 0 Holanda, Cuba 3 x 3 Romênia e Itália 2 x 1 Noruega). Duas dessas prorrogações terminaram empatadas e foram necessários jogos extras (Cuba 2 x 1 Romênia e Suíça x Alemanha).

FICHA TÉCNICA:

 

SUÍÇA 1 X 1 ALEMANHA

 

Data: 04/06/1938

Horário: 17h00 locais

Estádio: Parc des Princes

Público: 27.152

Cidade: Paris (França)

Árbitro: John Langenus (Bélgica)

 

SUÍÇA (2-3-5):

ALEMANHA (W-M):

Willy Huber (G)

Rudolf Raftl (G)

Severino Minelli (C)

Paul Janes

August Lehmann

Willibald Schmaus

Hermann Springer

Andreas Kupfer

Sirio Vernati

Hans Mock (C)

Ernst Lörtscher

Albin Kitzinger

Lauro Amadò

Ernst Lehner

André Abegglen

Rudolf Gellesch

Alfred Bickel

Josef Gauchel

Eugen Walaschek

Wilhelm Hahnemann

Georges Aeby

Hans Pesser

 

Técnico: Karl Rappan

Técnico: Sepp Herberger

 

SUPLENTES:

 

 

Erwin Ballabio (G)

Fritz Buchloh (G)

Renato Bizzozero (G)

Hans Jakob (G)

Adolf Stelzer

Reinhold Münzenberg

Albert Guinchard

Jakob Streitle

Oscar Rauch

Ludwig Goldbrunner

Paul Aeby

Stefan Skoumal

Alessandro Frigerio

Franz Wagner

Tullio Grassi

Fritz Szepan

Leopold Kielholz

Leopold Neumer

Eugen Rupf

Otto Siffling

Fritz Wagner

Josef Stroh

 

GOLS:

29′ Josef Gauchel (ALE)

43′ André Abegglen (SUI)

 

EXPULSÃO: 96′ Hans Pesser (ALE)

Imagens da partida:


… 09/06/1938 – Suíça 4 x 2 Alemanha


A Suíça manteve o time e o esquema.


A Alemanha também manteve o sistema, mas mudou meio time.

● Para a partida desempate, o treinador suíço Karl Rappan mandou a campo o mesmo time que havia atuado no primeiro jogo.

Por sua vez, o técnico Sepp Herberger fez seis alterações na seleção alemã. Saíram o zagueiro Willibald Schmaus, os meias Hans Mock e Albin Kitzinger e os atacantes Rudolf Gellesch, Josef Gauchel e Hans Pesser. Entraram os zagueiros Jakob Streitle e Ludwig Goldbrunner, o meia Stefan Skoumal e os atacantes Josef Stroh, Leopold Neumer e Fritz Szepan.

Novamente eram cinco atletas nascidos na Áustria: Raftl, Skoumal, Hahnemann, Neumer e Stroh.

Essas mexidas fizeram bem aos alemães, que começaram melhor e abriram logo 2 a 0.

Wilhelm Hahnemann fez o primeiro aos 9′ e Ernst Lörtscher marcou um gol contra aos 22′.

Para dificultar a vida dos suíços, o ponta Georges Aeby teve de sair de campo com a cabeça machucada. Como não eram permitidas substituições à época, a Suíça teve que seguir na partida com um jogador a menos.

Apesar das dificuldades, Eugen Walaschek (russo naturalizado suíço) diminuiu o placar a três minutos do fim do primeiro tempo.

Mas a confiança germânica era tamanha que, no intervalo, integrantes da comissão técnica resolveram enviar um telegrama ao ditador Adolf Hitler, informando a vitória parcial e o fato de estar jogando com um homem a mais.


(Imagem: Impromptuinc)

Muitos acreditavam em uma goleada alemã. Mas o imponderável do futebol apareceu novamente e a sorte sorriu para os helvéticos.

Ainda com dez homens, Alfred Bickel empatou o jogo para a Suíça aos 19′.

Aos 25′, Aeby conseguiu retornar a campo para ajudar seu time e igualou também o número de atletas em campo.

A virada e a classificação suíça veio com dois gols de André Abegglen em três minutos, aos 30′ e aos 33′.


(Imagem: Impromptuinc)

● Curiosamente, o autor do segundo gol suíço diante dos alemães, Alfred Bickel, é um dos únicos jogadores que disputaram jogos de Copa antes de depois da Segunda Guerra Mundial, juntamente com o sueco Erik Nilsson.

Com a eliminação da Suíça para a Hungria nas quartas de final (derrota por 2 a 0), o austríaco Karl Rappan (técnico dos helvéticos), chegou a conclusão que sua equipe só conseguiria vencer adversários mais fortes se tivesse um sistema de jogo bastante defensivo. Essa foi a origem do chamado “ferrolho suíço”, que mudou a essência ofensiva do futebol.


(Imagem: Impromptuinc)

Com o resultado, a hostilidade da torcida alemã resultou em várias garrafas quebradas, vandalizando as ruas de Paris.

A derrota foi colocada na conta do treinador Sepp Herberger, que insistiu em colocar em campo cinco jogadores austríacos que ele foi obrigado a convocar. Era mesmo natural que o técnico tivesse dificuldade para mesclar estilos de jogo tão diferentes. Os austríacos tinham um futebol mais clássico, baseado no toque de bola. Os alemães privilegiavam a força e os passes longos.

Várias fontes culpam a proposital atitude derrotista dos austríacos. Um jornalista alemão comentou posteriormente que “alemães e austríacos preferiam jogar um contra o outro até mesmo estando no mesmo time”.

Para frustração da comunidade nazista, a teoria de superioridade da raça ariana não resistiu à primeira rodada. A eliminação acabou sendo uma grande surpresa.

Foi a primeira vez que a Nationalelf não passou da primeira fase em uma Copa do Mundo. Esse fato ocorreria novamente apenas oitenta anos depois, na Copa de 2018, na Rússia.


(Imagem: Impromptuinc)

FICHA TÉCNICA:

 

SUÍÇA 4 X 2 ALEMANHA

 

Data: 09/06/1938

Horário: 18h00 locais

Estádio: Parc des Princes

Público: 20.025

Cidade: Paris (França)

Árbitro: Ivan Eklind (Suécia)

 

SUÍÇA (2-3-5):

ALEMANHA (W-M):

Willy Huber (G)

Rudolf Raftl (G)

 Severino Minelli (C)

Paul Janes

August Lehmann

Jakob Streitle

Hermann Springer

Andreas Kupfer

Sirio Vernati

Ludwig Goldbrunner

Ernst Lörtscher

Stefan Skoumal

Lauro Amadò

Ernst Lehner

André Abegglen

Josef Stroh

Alfred Bickel

Wilhelm Hahnemann

Eugen Walaschek

Fritz Szepan (C)

Georges Aeby

Leopold Neumer

 

Técnico: Karl Rappan

Técnico: Sepp Herberger

 

SUPLENTES:

 

 

Erwin Ballabio (G)

Fritz Buchloh (G)

Renato Bizzozero (G)

Hans Jakob (G)

Adolf Stelzer

Reinhold Münzenberg

Albert Guinchard

Willibald Schmaus

Oscar Rauch

Albin Kitzinger

Paul Aeby

Hans Mock

Alessandro Frigerio

Franz Wagner

Tullio Grassi

Josef Gauchel

Leopold Kielholz

Rudolf Gellesch

Eugen Rupf

Hans Pesser

Fritz Wagner

Otto Siffling

 

GOLS:

8′ Wilhelm Hahnemann (ALE)

22′ Ernst Lörtscher (ALE) (gol contra)

42′ Eugen Walaschek (SUI)

64′ Alfred Bickel (SUI)

75′ André Abegglen (SUI)

78′ André Abegglen (SUI)

Imagens da partida:

… 05/06/1938 – Itália 2 x 1 Noruega

Três pontos sobre…
… 05/06/1938 – Itália 2 x 1 Noruega


(Imagem: Youtube)

Campeã em 1934, a Itália vinha bastante renovada e ainda melhor do que quatro anos antes. A dupla de zaga, Foni e Rava era mais jovem e mais segura que a anterior (Allemandi e Monzeglio). Na posição de centromédio, o truculento Luisito Monti deu lugar a outro oriundi, o uruguaio Michele Andreolo, mais técnico e mais criativo. O ataque estava melhor e mais móvel com Silvio Piola, um centroavante de muita mobilidade, capaz de criar e concluir as jogadas. Só dois jogadores da Copa anterior permaneceram no time titular: o agora capitão Giuseppe Meazza e o atacante Giovanni Ferrari.

Os italianos contavam com o mesmo “incentivador” de 1934: o ditador fascista Benito Mussolini. Mas como a Copa agora não era em seu território, “Il Duce” não pôde pressionar FIFA e arbitragem como quatro anos antes. Mas nem precisava, pois a Itália tinha a melhor seleção do mundo.

Um dos motivos para isso era a continuidade do técnico Vittorio Pozzo. Uma das suas principais virtudes era saber explorar a natural autoconfiança dos italianos para formar uma seleção forte.


(Imagem: Youtube)

● A Squadra Azzurra parecia imbatível e não perdia há quase três anos. Em 1935, enfrentou o Wunderteam da Áustria em Viena e venceu por 2 x 0, com dois gols de Silvio Piola – que acabaria se tornando um dos atacantes mais letais de seu tempo. Chegou embalada ao Mundial, com duas goleadas nos últimos amistosos: 6 x 1 na Bélgica, no dia 15/05 em Milão, e 4 x 0 na Iugoslávia, em 22/05 na cidade de Gênova.

O primeiro obstáculo foi a Noruega, que tinha um time jovem, alto e forte.

Mesmo com uma mais qualificada, a Noruega sofreu para eliminar a Irlanda no Grupo 2 das eliminatórias. Na primeira partida, disputada em Oslo no dia 10/10/1937, vitória por 3 x 2. No jogo disputado em Dublin, em 07/11/1937, os nórdicos venciam por 3 x 1, mas cederam o empate e levaram um sufoco. Essa partida entrou para a história porque, pela primeira vez em uma competição da FIFA, os dois times usaram camisas numeradas – o que permitia aos torcedores e à imprensa a identificação imediata dos jogadores em campo. Mas essa novidade não seria utilizada na Copa de 1938.


(Imagem: Footforever.com)

● Aqui cabe um parêntese sobre a semifinal dos Jogos Olímpicos de 1936. No dia 10/08, italianos e noruegueses se enfrentaram para 90 mil pessoas no Estádio Olímpico de Berlim. A partida foi apitada pelo húngaro Paul von Hertzka. A Itália de Pozzo foi representada por uma seleção amadora. Apenas quatro de seus jogadores estariam presentes no Mundial dois anos depois (Alfredo Foni, Pietro Rava, Ugo Locatelli e Sergio Bertoni) e só dois seriam titulares na partida de abertura (Rava e Locatelli).

Do lado nórdico, o time era praticamente o mesmo. Devido ao amadorismo do futebol do país, o técnico Asbjørn Halvorsen pôde levar seu time principal para as Olimpíadas (que não aceitava profissionais à época). Doze dos 14 presentes em Berlim estariam entre os 22 que disputariam a Copa na França. Só houve três alterações no time titular: o médio direito Kristian Henriksen era reserva e ganhou a titularidade de Frithjof Ulleberg. O zagueiro Rolf Johannessen entrou na vaga de Jørgen Juve e o centroavante Knut Brynildsen substituiu Alf Martinsen.

Naquela partida, Alfonso Negro abriu o placar aos 15′, Arne Brustad empatou aos 58′ e Annibale Frossi fez o segundo tento italiano aos 6′ da prorrogação.

Na final, a Itália bateu a Áustria por 2 x 1. E a Noruega ficou com a honrada medalha de bronze ao vencer a Polônia por 3 x 2.


A Itália jogava em uma adaptação do sistema 2-3-5 chamada “Metodo”, que consistia no ligeiro recuo de dois atacantes, deixando o ataque em uma espécie de “W”, com dois meia-atacantes, dois pontas bem abertos e um centroavante.


A Nuruega atuava como praticamente todas as equipes da época, no ofensivo sistema “clássico” ou “pirâmide”, o 2-3-5.

● Valeu a pena der feito esse parêntese, porque a partida das oitavas de final da Copa do Mundo de 1938 teve praticamente o mesmo roteiro da que havia ocorrido 664 dias antes.

Dessa vez, a poderosa Squadra Azzurra vinha com seus renomados profissionais, liderada pela lenda Giuseppe Meazza.

E inaugurou o marcador logo na segunda volta do ponteiro, com Giovanni Ferrari.

Quando todos achavam que o jogo estava ganho, o bom ponta esquerda Arne Brustad empatou aos 38′ do segundo tempo e levou o jogo para a prorrogação.

A Azzurra passou à frente no início do tempo extra, logo aos quatro minutos. O ponta direita Pietro Pasinati chutou cruzado, rasteiro e forte. O goleiro Henry Johansen espalmou e Piola escorou para o gol.

Com um pouquinho de boa vontade, podemos dizer que o jogo de Marselha foi praticamente o replay de Berlim. Por uma incrível coincidência, o resultado se repetiu quase nos mesmos detalhes: a Itália abriu o placar no início do jogo, Brustad empatou para a Noruega no segundo tempo e a Itália venceu o jogo no início da prorrogação.


(Imagem: Keystone Franc /Gamma Keystone / Getty Images)

● A tão aguardada estreia dos campeões do mundo decepcionou os 19 mil presentes no estádio Vélodrome, em Marselha, que esperavam uma goleada. Juntou-se a essa decepção o fato de o time italiano ter feito a saudação fascista antes e depois da partida. Estava dado o sinal para a enorme vaia ouvida logo ao apito final.

A primeira fase do Mundial de 1938 foi marcada pelo equilíbrio. Das sete confrontos, cinco foram para a prorrogação (Itália 2 x 1 Noruega, Brasil 6 x 5 Polônia, Tchecoslováquia 3 x 0 Holanda, Alemanha 1 x 1 Suíça e Cuba 3 x 3 Romênia). Duas dessas partidas terminaram empatadas e foram necessários jogos extras.

Nas quartas de final, a Itália jogou toda de preto (cor do fascismo) e venceu a anfitriã França por 3 x 1. Nas semifinais, arbitragem foi conivente com os azuis e acabou com o sonho brasileiro, na polêmica vitória dos italianos por 2 x 1. Na decisão, derrotou a Hungria por 4 x 2 e, de forma incontestável, se se sagrou bicampeã do mundo.


(Imagem: AP)

FICHA TÉCNICA:

 

ITÁLIA 2 x 1 NORUEGA

 

Data: 05/06/1938

Horário: 17h00 locais

Estádio: Vélodrome

Público: 19.000

Cidade: Marselha (França)

Árbitro: Alois Beranek (Áustria / Alemanha)

 

ITÁLIA (2-3-5):

NORUEGA (2-3-5):

Aldo Olivieri (G)

Henry Johansen (G)

Eraldo Monzeglio

Rolf Johannessen

Pietro Rava

Øivind Holmsen

Pietro Serantoni

Kristian Henriksen

Michele Andreolo

Nils Eriksen (C)

Ugo Locatelli

Rolf Holmberg

Pietro Pasinati

Odd Frantzen

Giuseppe Meazza (C)

Reidar Kvammen

Silvio Piola

Knut Brynildsen

Giovanni Ferrari

Magnar Isaksen

Pietro Ferraris

Arne Brustad

 

Técnico: Vittorio Pozzo

Técnico: Asbjørn Halvorsen

 

SUPLENTES:

 

 

Guido Masetti (G)

Anker Kihle (G)

Carlo Ceresoli (G)

Sverre Nordby (G)

Alfredo Foni

Roald Amundsen

Bruno Chizzo

Oddmund Andersen

Aldo Donati

Gunnar Andreassen

Renato Olmi

Sverre Hansen

Mario Genta

Frithjof Ulleberg

Mario Perazzolo

Jørgen Juve

Sergio Bertoni

Hjalmar Andresen

Amedeo Biavati

Arne Ileby

Gino Colaussi

Alf Martinsen

 

GOLS:

2′ Pietro Ferraris (ITA)

83′ Arne Brustad (NOR)

94′ Silvio Piola (ITA)

Veja algumas imagens da partida:

Veja abaixo também a ficha técnica da partida válida pelas semifinais dos Jogos Olímpicos de 1936.

FICHA TÉCNICA:

 

ITÁLIA 2 x 1 NORUEGA

 

Data: 10/08/1936

Horário: 17h00 locais

Estádio: Olímpico

Público: 95.000

Cidade: Berlim (Alemanha)

Árbitro: Pál von Hertzka (Hungria)

 

ITÁLIA (2-3-5):

NORUEGA (2-3-5):

Bruno Venturini (G)

Henry Johansen (G)

Alfredo Foni (C)

Nils Eriksen

Pietro Rava

Øivind Holmsen

Giuseppe Baldo

Frithjof Ulleberg

Achille Piccini

Jørgen Juve (C)

Ugo Locatelli

Rolf Holmberg

Annibale Frossi

Odd Frantzen

Libero Marchini

Reidar Kvammen

Sergio Bertoni

Alf Martinsen

Carlo Biagi

Magnar Isaksen

Alfonso Negro

Arne Brustad

 

Técnico: Vittorio Pozzo

Técnico: Asbjørn Halvorsen

 

SUPLENTES:

 

 

Luigi Scarabello

Fredrik Horn

Giulio Cappelli

Sverre Hansen

Francesco Gabriotti

Magdalon Monsen

 

GOLS:

15′ Alfonso Negro (ITA)

58′ Arne Brustad (NOR)

96′ Annibale Frossi (ITA)

… 12/06/1938 – Brasil 1 x 1 Tchecoslováquia

Três pontos sobre…
… 12/06/1938 – Brasil 1 x 1 Tchecoslováquia

“A Batalha de Bordeaux”


(Imagem: UOL)

● A partida marcou a inauguração do novíssimo estádio Parc Lescure, em Bordeaux. Isso obrigou as duas delegações a fazerem longos percursos de trem. Os tchecos viajaram 521 quilômetros desde Le Havre e os brasileiros 758 quilômetros desde Estrasburgo (uma viagem de quase 12 horas).

Nas oitavas de final, as duas equipes precisaram da prorrogação para eliminar seus respectivos rivais. A Tchecoslováquia bateu a Holanda por 3 a 0 (gols de Košťálek aos 93′, Nejedlý aos 111′ e Zeman aos 118′). O Brasil teve mais dificuldades para passar pela Polônia. Foi uma chuva de gols na vitória por 6 a 5, como já contamos aqui. Agora, a Seleção teria ainda mais problemas. Se o embate contra os poloneses foi duro, o duelo contra os tchecos seria ainda mais. Para ver o nível, bastava ver o confronto direto entre Polônia e Tchecoslováquia: em nove partidas até então, haviam sido oito vitórias da seleção tcheca.

No Mundial anterior, em 1934, o Brasil tinha decepcionado, sendo eliminado logo na primeira partida, em derrota para a Espanha por 3 x 1. Por sua vez, a Tchecoslováquia tinha uma bela equipe, que chegou até a final, quando perdeu de forma controversa para a anfitriã Itália apenas na prorrogação por 2 x 1, de virada.


(Imagem: Arquivo CBF)

Enquanto o Brasil tinha como remanescentes quatro jogadores (o capitão Martim Silveira, Luisinho Mesquita de Oliveira, Patesko e Leônidas da Silva), a seleção eslava ainda permanecia com seu time base, mantendo todo o sistema defensivo (Plánička, Burgr e Daučík) e o meio de campo (Košťálek, Bouček e Kopecký), além de seus dois melhores atacantes (Puč e Nejedlý). Assim, embora os sul-americanos tivessem um talento inegável, os centro-europeus eram favoritos.

Era um confronto de extremos. Os tchecos tinham um futebol metódico e jogadores experientes. Os brasileiros jogavam de forma artística e quase amadora. Para o adversário e para a imprensa estrangeira, o Brasil tinha um ataque extraordinário, mas a defesa “algo fraca”. De fato, os cinco gols sofridos contra a Polônia ligaram o alerta do técnico Ademar Pimenta, mas ele só fez uma mudança: o goleiro Walter entrou no lugar de Batatais. Domingos da Guia, mesmo com febre, foi para o jogo.


O Brasil atuava no sistema clássico, o 2-3-5, com muita fragilidade no sistema defensivo.


A Tchecoslováquia jogava em uma adaptação do 2-3-5 chamada “Sistema Danubiano”, que consistia na maior aproximação dos homens do ataque, com muitas tabelas e toques rápidos.

● Mas ambos fugiram de suas características, esqueceram a bola e partiram para o jogo violento. Tanto que essa partida ficou eternizada como “A Batalha de Bordeaux”.

Foi uma verdadeira guerra campal. Três das quatro expulsões dessa edição da Copa aconteceram nessa partida (a outra foi do alemão Hans Pesser, aos 6′ da prorrogação do empate com a Suíça por 1 x 1). Zezé Procópio foi o primeiro, logo aos 14 minutos da etapa inicial, depois de dar um chute sem bola em Nejedlý. Aos 44′ do segundo tempo, Machado e Říha trocaram agressões e também foram convidados a sairem do campo pelo árbitro húngaro Pal von Hertzka. Mas a verdade é que se o juiz fosse mais rigoroso, pelo menos a metade dos atletas deveria ter ido para o chuveiro mais cedo. O número de três expulsões em uma única partida só foi superado 68 anos depois, no confronto das oitavas de final de 2006 entre Portugal e Holanda, que teve quatro jogadores recebendo o cartão vermelho (Costinha, Deco, Khalid Boulahrouz e Gio van Bronckhorst).

O clima tenso seguiu por todo o jogo. Leônidas era o principal alvo dos tchecos, levando pontapés constantes. Um deles, desferido por Košťálek no fim do jogo, fez com que o craque brasileiro saísse carregado de campo e ficasse quase cinco minutos sendo atendido.

Em um dos raros momentos que foi possível praticar o futebol, o próprio Leônidas abriu o placar quando o relógio apontava meia hora jogada.

Mas aos 20′ da etapa final, Nejedlý e Šimůnek fizeram uma tabela no meio da área e Domingos da Guia tentou cortar com o peito, mas conduziu a bola com o braço. Pênalti indiscutível. Oldřich Nejedlý cobrou e converteu.

No fim da prorrogação, o empate por 1 x 1 persistiu e o saldo da guerra era altamente preocupante para os dois lados. O grande goleiro eslavo František Plánička havia jogado mais de meia hora e fechado o gol mesmo com a clavícula deslocada após um choque com Perácio e o artilheiro Oldřich Nejedlý (goleador da Copa de 1934) tinha fraturado o pé direito. Ambos estavam fora da partida de desempate, marcada para apenas 48 horas depois. Do lado brasileiro, Perácio saiu arrebentado e Leônidas, que tanto apanhou, não tinha condições de jogo.


Gol de Leônidas (Imagem: Arquivo CBF)

FICHA TÉCNICA:

 

BRASIL 1 x 1 TCHECOSLOVÁQUIA

 

Data: 12/06/1938

Horário: 17h00 locais

Estádio: Parc Lescure

Público: 22.021

Cidade: Bordeaux (França)

Árbitro: Pal von Hertzka (Hungria)

 

BRASIL (2-3-5):

TCHECOSLOVÁQUIA (2-3-5):

Walter (G)

František Plánička (G)(C)

Domingos da Guia

Jaroslav Burgr

Machado 

Ferdinand Daučík

Zezé Procópio

Josef Košťálek

Martim Silveira (C)

Jaroslav Bouček

Afonsinho

Vlastimil Kopecký

Lopes

Jan Říha

Romeu Pellicciari

Ladislav Šimůnek

Leônidas da Silva

Josef Ludl

Perácio

Oldřich Nejedlý

Hércules

Antonín Puč

 

Técnico: Ademar Pimenta

Técnico: Josef Meissner

 

SUPLENTES:

 

 

Batatais (G)

Karel Burket (G)

Jaú

Karel Černý

Nariz

Josef Orth

Britto

Karel Kolský

Brandão

Otakar Nožíř

Argemiro

Vojtěch Bradáč

Roberto

Václav Horák

Luisinho Mesquita de Oliveira

Arnošt Kreuz

Niginho

Oldřich Rulc

Tim

Karel Senecký

Patesko

Josef Zeman

 

GOLS:

30′ Leônidas da Silva (BRA)

65′ Oldřich Nejedlý (TCH) (pen)

 

EXPULSÕES:

14′ Zezé Procópio (BRA)

89′ Machado (BRA)

89′ Jan Říha (TCH)

Algumas imagens da partida:


… 14/06/1938 – Brasil 2 x 1 Tchecoslováquia (Partida de Desempate)


(Imagem: Arquivo CBF)

● Dois dias depois do empate por 1 x 1, Brasil e Tchecoslováquia voltaram a campo, mas com times bastante diferentes, em grande parte devido às contusões da partida anterior.

Os tchecos não tinham o goleiro Plánička (clavícula deslocada) e os atacantes Puč (lesão na perna esquerda) e Nejedlý (fratura no pé direito), além de duas alterações feitas pelo técnico tcheco Josef Meissner. Ele imaginou que iria surpreender o seu colega brasileiro Ademar Pimenta ao fazer tantas alterações em sua equipe. Mas na hora que os dois times entraram em campo, Meissner só se convenceu que aquele era mesmo o Brasil quando viu Leônidas uniformizado. À exceção do centroavante e do goleiro Walter, todos os jogadores eram diferentes do que atuaram dois dias antes. O novo time era o “branco”, mais pesado, com a adição do combalido Leônidas.

Comparado à guerra que foi no primeiro jogo, o segundo foi bem mais tranquilo. Mas ainda assim o brasileiro Nariz quebrou o braço e o tcheco Kopecký teve que deixar o campo carregado aos 30 minutos do segundo tempo.

Mas o fato é que os 18 mil torcedores presentes no Parc Lescure apreciaram uma boa partida.


O Brasil mudou nove jogadores em relação ao jogo anterior. Agora, era um time mais pesado. Permanecia o sistema tático 2-3-5 e o craque Leônidas, o grande diferencial daquela seleção.


Os tchecos jogaram novamente no 2-3-5, mas mudaram meio time que atuou dois dias antes.

● A partida foi tensa. Os tchecos começaram controlando o ritmo da partida e abriram o placar aos 25 minutos com Vlastimil Kopecký.

O segundo tempo foi todo do Brasil, que voltou mais incisivo e empatou aos 12′, com o imparável Leônidas.

Três minutos depois, um susto. Senecký chutou rasteiro e Walter fez a defesa, mas a bola escapou de suas mãos e pareceu ter entrado cerca de um palmo no gol, antes que o goleiro pudesse puxá-la de volta. O árbitro francês Georges Capdeville não viu o segundo gol da Tchecoslováquia e mandou o jogo seguir.

Logo em seguida, aos 17′, Roberto vira o jogo com um gol de voleio.

Mas o grande jogador da partida foi o meia Tim, de 23 anos, que estreava na Copa. Encantado com sua visão de jogo, um jornal francês o chamou de “Criador”. Ele ainda ganharia o apelido de “El Péon”, dado pelos argentinos quatro anos depois, por “conduzir o time brasileiro como um peão (‘peón‘) conduz a sua manada”. Uma grande pena que esse foi seu único jogo em Copas do Mundo.


Gol de Leônidas (Imagem: Arquivo CBF)

● O entusiasmo pela vitória foi tão grande que o Ministro das Relações Exteriores, Gustavo Capanema, enviou um telegrama para a França, cumprimentando e exaltando os “invencíveis lutadores”. A CBD, também por telegrama, chamou os jogadores de “bravos legionários”. O interventor do Governo Federal no estado do Rio de Janeiro, o comandante Amaral Peixoto, divulgou uma nota promovendo o autor do segundo gol brasileiro, Roberto, a subchefe da Polícia Especial de Niterói, corporação a que o jogador pertencia.

No dia seguinte, enquanto esperavam para embarcar no trem que os levaria de Bordeaux para Marselha, alguns jogadores ficaram fazendo embaixadinhas (ou altinha, dependendo da região). Foi um verdadeiro show coletivo. Algo muito corriqueiro em todo território brasileiro desde sempre, mas que nunca tinha sido visto na Europa. Segundo os relatos, durante vários minutos uma bola foi sendo passada de pé em pé sem tocar o chão. Foi uma grande demonstração da habilidade brasileira no controle de bola, impressionando os jornalistas europeus.


Gol de Roberto (Imagem: Arquivo CBF)

Eliminada a Tchecoslováquia, vice em 1934, o Brasil agora iria encarar a campeã Itália. Mas nos dois dias que antecederam o jogo, duas perguntas estavam na boca de todos. Qual time seria escalado por Ademar Pimenta, o que enfrentou a Polônia (azul, mais leve) ou o do segundo jogo contra a Tchecoslováquia (branco, mais pesado)? E ainda a maior preocupação: Leônidas iria jogar? Ele era o único que havia participado dos três jogos e o que mais tinha sofrido com a violência adversária. Mas na véspera da semifinal, o centroavante já sabia que não tinha a mínima condição de jogo.

A participação de Leônidas na partida de desempate contra a Tchecoslováquia custou muito caro. Ele já não estava fisicamente bem e só entrou em campo porque seu reserva imediato, Niginho, então no Vasco, não tinha condições legais de jogo. Em 1935, quando atuava pela Lazio de Mussolini, Niginho abandonou a Itália devido à ameaça de ser convocado para defender o país na guerra com a Etiópia. Seu clube pagou sua viagem para o Brasil, mas não o autorizou a assinar com o Palestra Itália (atual Palmeiras). A Itália chegou a informar à FIFA sobre a irregularidade e os dirigentes brasileiros preferiram nem correr riscos e decidiram que o jogador não seria escalado. Por isso Leônidas foi para o sacrifício contra os tchecos. Depois, em uma carta de próprio punho à revista carioca Sport Ilustrado, Leônidas escreveu: “Joguei esta partida porque Niginho não está com a situação regularizada. Porém, fui infeliz, me machuquei e não posso jogar amanhã contra a Itália”.


(Imagem: Arquivo CBF)

FICHA TÉCNICA:

 

BRASIL 2 x 1 TCHECOSLOVÁQUIA

 

Data: 14/06/1938

Horário: 18h00 locais

Estádio: Parc Lescure

Público: 18.141

Cidade: Bordeaux (França)

Árbitro: Georges Capdeville (França)

 

BRASIL (2-3-5):

TCHECOSLOVÁQUIA (2-3-5):

Walter (G)

Karel Burket (G)

Jaú

Jaroslav Burgr (C)

Nariz

Ferdinand Daučík

Britto

Josef Košťálek

Brandão

Jaroslav Bouček

Argemiro

Vlastimil Kopecký

Roberto

Václav Horák

Luisinho Mesquita de Oliveira

Karel Senecký

Leônidas da Silva (C)

Josef Ludl

Tim

Arnošt Kreuz

Patesko

Oldřich Rulc

 

Técnico: Ademar Pimenta

Técnico: Josef Meissner

 

SUPLENTES:

 

 

Batatais (G)

František Plánička (G)

Domingos da Guia

Karel Černý

Machado

Josef Orth

Zezé Procópio

Karel Kolský

Martim Silveira

Otakar Nožíř

Afonsinho

Vojtěch Bradáč

Lopes

Jan Říha

Romeu Pellicciari

Oldřich Nejedlý

Niginho

Antonín Puč

Perácio

Ladislav Šimůnek

Hércules

Josef Zeman

 

GOLS:

25′ Vlastimil Kopecký (TCH)

57′ Leônidas da Silva (BRA)

62′ Roberto (BRA)

Algumas imagens da partida:

… 19/06/1938 – Itália 4 x 2 Hungria

Três pontos sobre…
… 19/06/1938 – Itália 4 x 2 Hungria


(Imagem: The Score)

● Um mês e meio antes da Copa, o jornal France Soir dizia que o Brasil era uma incógnita. E arriscou uma previsão certeira: a final seria entre Itália e Hungria, com amplo e maciço favoritismo dos italianos.

A Itália vinha bastante renovada e ainda melhor do que em 1934. Só dois jogadores permaneceram no time titular: o agora capitão Giuseppe Meazza e o atacante Giovanni Ferrari.

Parte da renovação comandada pelo técnico Vittorio Pozzo veio com a medalha de ouro nos Jogos Olímpicos de 1936. A dupla de zaga, Foni e Rava era mais jovem e mais segura que a anterior (Allemandi e Monzeglio). Na posição de centromédio, o truculento Luisito Monti deu lugar a outro oriundi, o uruguaio Michele Andreolo, mais técnico e mais criativo. O ataque estava melhor e mais móvel com Silvio Piola, um centroavante de muita mobilidade, capaz de criar e concluir as jogadas.

Veja mais:
… 05/06/1938 – Itália 2 x 1 Noruega
… 16/06/1938 – Itália 2 x 1 Brasil

A Itália era a atual campeã do mundo e vinha de uma semifinal difícil contra o Brasil, na qual precisou demonstrar todo seu potencial. Antes, teve que passar pela Noruega (2 a 1) e pela anfitriã França (3 a 1). Já a Hungria, para chegar à final, tinha vencido as Índias Holandesas (atual Indonésia, 6 a 0), a Suíça (2 a 0) e a Suécia (5 a 1).

A Squadra Azzurra era a favorita contra a Hungria. Nos quatro anos anteriores, as duas seleções tinham se enfrentado quatro vezes, com três vitórias italianas e um empate.

Os italianos contavam com o mesmo “incentivador” de 1934: o ditador fascista Benito Mussolini. Mas como a Copa agora não era em seu território, o Duce não pôde pressionar FIFA e arbitragem como quatro anos antes. Assim, ele foi se despedir dos atletas antes do embarque para a França. Eis que na véspera da decisão o técnico Vittorio Pozzo recebeu um telegrama assinado pelo secretário-geral do Partido Fascista, Achille Starece, com uma ordem clara de Mussolini: “Vencer ou morrer”. Assim, a Squadra Azzurra não tinha escolha. Posteriormente, o goleiro húngaro Antal Szabó disse que não se importava de ter tomado quatro gols, pois sabia que tinha salvado vidas. Mas a ameaça do Duce nem era necessária, pois a Itália tinha a melhor seleção do mundo.


A Itália jogava em uma adaptação do sistema 2-3-5 chamada “Metodo”, que consistia no ligeiro recuo de dois atacantes, deixando o ataque em uma espécie de “W”, com dois meia-atacantes, dois pontas bem abertos e um centroavante.


A Hungria atuava como praticamente todas as equipes da época, no ofensivo sistema “clássico” ou “pirâmide”, o 2-3-5.

● A Itália abriu o placar logo 6 minutos de partida. Após cruzamento alto da direita, a defesa húngara não cortou e o ponta Colaussi, que entrava livre pela esquerda, dominou e, sem deixar a bola cair, chutou de primeira no canto direito do goleiro Szabó.

Em seu primeiro ataque, a Hungria empatou apenas dois minutos depois. Sárosi ergue a bola pelo meio, Sas desviou de cabeça para trás e encontrou Titkos. No bico esquerdo da pequena área, ele mata no peito e bate alto, sem chances de defesa para Olivieri.

Apesar de ter conseguido a igualdade rapidamente, em momento algum os húngaros deram a impressão de que esperavam algo melhor que o vice-campeonato.

Aos 16 minutos, o gol mais bonito do jogo. A Itália trocou passes dentro da área adversária. Começou com Colaussi na esquerda, foi para Piola no meio, que tocou para Ferrari. Mesmo com o gol aberto à sua frente, Ferrari passou para Meazza, na direita. O capitão ainda driblou seu marcador e rolou para Piola, na marca do pênalti. O melhor jogador do torneio dominou e acertou o ângulo esquerdo.

A vantagem italiana aumentou aos 35 do primeiro tempo. Colaussi recebeu um lançamento de 30 metros feito por Meazza. O ponta ganhou na corrida de Polgár e entrou na área. O goleiro Szabó não saiu e Colaussi, quase da linha da pequena área, teve calma para finalizar no canto esquerdo.

A Hungria mostrava clara dificuldade em marcar o jogo mais veloz dos italianos, ficando muito exposta em sua própria área.

No segundo tempo, a Hungria ainda diminuiu. Aos 15 minutos, em um rápido contra-ataque, Titkos avança pela direita e rola a bola no bico da área. Sárosi apareceu de surpresa entre os zagueiros e chutou de primeira no canto esquerdo. Mas nem assim se mandou ao ataque, apesar de todo o apoio da torcida francesa.

A Itália continuou dominando facilmente o jogo, enquanto a Hungria só tentava se defender. A oito minutos do fim, Piola fechou o placar. Biavatti foi lançado pela direita, foi até a linha de fundo e cruzou para trás. Da marca do pênalti, Piola chegou antes da marcação e bateu prensado, mas a bola foi no cantinho direito de Szabó. Foi seu quinto gol no campeonato (dois a menos que o artilheiro Leônidas).

Daí em diante, os húngaros só ficaram esperando o tempo passar e o jogo acabar.


(Imagem: FIFA)

● Quando o árbitro francês Georges Capdeville apitou o fim da partida, a torcida vaiou o time campeão, em uma atitude jamais vista. As vaias só aumentaram quando o capitão Giuseppe Meazza fez a saudação fascista antes de depois de receber a Taça Jules Rimet das mãos do presidente francês, Albert Lebrun, nas tribunas de honra do estádio.

Assim, a Itália, merecidamente, se sagrou bicampeã da Copa do Mundo, feito que apenas o Brasil de 1958 e 1962 conseguiu repetir. O técnico Vittorio Pozzo ainda hoje é o mais vitorioso à frente da seleção, a qual comandou por 19 anos. Além das duas Copas, ele conquistou também a medalha de ouro nos Jogos Olímpicos de Berlim, em 1936.

Na volta à “Velha Bota”, os campeões foram recebidos por Mussolini em Roma, no Palazzo Venezia, a sede do governo. Após abraços e saudações oficiais, cada um recebeu míseras 8.000 liras pela conquista do título (equivalente ao carro mais popular do país em 1938, um Fiat Topolino).

Como curiosidade, o autor do segundo gol da Hungria, o centroavante “Dr. György Sárosi” era um brilhante advogado em seu país. Na Copa de 1934 ele já tinha deixado de participar de um jogo de sua seleção devido ao seu trabalho num escritório de advocacia. Em 1938, às vésperas da Copa, ele estava diante de um caso importante, que poderia lhe render bom retorno profissional e financeiro e, por isso, comunicou à comissão técnica que não disputaria o torneio. Mas devido à sua importância para a equipe, toda a delegação o convenceu a mudar de ideia. Ele foi o capitão do time e um dos destaques da Copa, com cinco gols anotados em quatro jogos.


Cumprimentos iniciais entre os capitães Giuseppe Meazza e György Sárosi (Imagem: The Score)

FICHA TÉCNICA:

 

ITÁLIA 4 x 2 HUNGRIA

 

Data: 19/06/1938

Horário: 17h00 locais

Estádio: Olímpico de Colombes

Público: 45.000

Cidade: Paris (França)

Árbitro: Georges Capdeville (França)

 

ITÁLIA (2-3-5):

HUNGRIA (2-3-5):

Aldo Olivieri (G)

Antal Szabó (G)

Alfredo Foni

Sándor Bíró

Pietro Rava

Gyula Polgár

Pietro Serantoni

Gyula Lázár

Michele Andreolo

György Szűcs

Ugo Locatelli

Antal Szalay

Amedeo Biavati

Pál Titkos

Giuseppe Meazza (C)

Gyula Zsengellér

Silvio Piola

György Sárosi (C)

Giovanni Ferrari

Jenő Vincze

Gino Colaussi

Ferenc Sas

 

Técnico: Vittorio Pozzo

Técnicos: Károly Dietz / Alfréd Schaffer

 

SUPLENTES:

 

 

Guido Masetti (G)

József Háda (G)

Carlo Ceresoli (G)

József Pálinkás (G)

Eraldo Monzeglio

Lajos Korányi

Bruno Chizzo

János Dudás

Aldo Donati

István Balogh

Renato Olmi

József Turay

Mario Genta

Béla Sárosi

Mario Perazzolo

Mihály Bíró

Sergio Bertoni

László Cseh

Pietro Ferraris

Vilmos Kohut

Pietro Pasinati

Géza Toldi

 

GOLS:

6′ Gino Colaussi (ITA)

8′ Pál Titkos (HUN)

16′ Silvio Piola (ITA)

35′ Gino Colaussi (ITA)

70′ György Sárosi (HUN)

82′ Silvio Piola (ITA)

Lances da partida:

… 16/06/1938 – Itália 2 x 1 Brasil

Três pontos sobre…
… 16/06/1938 – Itália 2 x 1 Brasil


Piola passa pela defesa brasileira (Imagem: Pinterest)

● Nenhuma partida é fácil em uma Copa do Mundo. Em 1938, após a vitória na estreia sobre a Polônia por 6 a 5 na prorrogação, o Brasil enfrentou a Tchecoslováquia (vice-campeã da Copa anterior). Após um empate em 1 a 1, foi necessário o jogo desempate, vencido pelos brasileiros por 2 a 1. Nessa segunda partida, o técnico Ademar Pimenta escalou a equipe com nove alterações em relação à anterior. As exceções era o goleiro Walter e o centroavante Leônidas da Silva, que só foi escalado porque Niginho, seu reserva imediato, estava com a documentação irregular junto à FIFA.

Veja mais:
… 05/06/1938 – Brasil 6 x 5 Polônia
… 12/06/1938 – Brasil 1 x 1 Tchecoslováquia

… Domingos da Guia: o maior zagueiro da história do Brasil
… Patesko: ponta esquerda craque e letal
… Luís Mesquita de Oliveira: ícone do futebol paulista nos anos 1930

Por ironia do destino, Leônidas (já combalido pelos pontapés do primeiro embate contra os tchecos) se exauriu no jogo seguinte e não pôde jogar a semifinal contra a Itália. Por muito tempo Ademar Pimenta foi acusado de ter poupado Leônidas contra a Itália para resguardá-lo para a final, o que não é verdade, pois ele era imprescindível para todos os jogos.

Sem Leônidas e sem Tim (melhor da segunda partida contra os tchecos), o Brasil perdeu seu encanto e se tornou um time comum. Romeu, que era meia, foi improvisado como centroavante. A linha de frente do Brasil foi formada por Lopes, Luisinho, Romeu, Perácio e Patesko. Esse ataque nunca havia atuado junto.

Campeões em 1934, os italianos renovaram e fortaleceram toda a seleção, especialmente no ataque, com a entrada de Silvio Piola na equipe. Ele foi o melhor jogador da Copa de 1938, na qual anotou cinco gols.


A Itália jogava em uma adaptação do sistema 2-3-5 chamada “Metodo”, que consistia no ligeiro recuo de dois atacantes, deixando o ataque em uma espécie de “W”, com dois meia-atacantes, dois pontas bem abertos e um centroavante.

O Brasil também atuava no “sistema clássico”, o 2-3-5. Com Romeu improvisado como centroavante, ninguém atuou fixo na área. Por mais que o ataque tenha tido mais mobilidade, pois outro lado, faltou presença física na área adversária.

● O jogo começa com as duas seleções pressionando as defesas contrárias. O Brasil esteve bem no primeiro tempo, com tabelas rápidas e dribles imprevisíveis no ataque, mas sem criar chances claras de gols. Em uma etapa equilibrada, as duas defesas se sobressaiam aos ataques. Mas a situação foi bem diferente no segundo tempo.

Logo aos seis minutos, na primeira vez que conseguiu escapar da marcação, o atacante Piola se antecipou a Domingos da Guia e tocou na esquerda para Gino Colaussi, livre para chutar forte e rasteiro, à esquerda do goleiro Walter e fazer 1 a 0.

A Seleção Brasileira correu atrás do empate, mas aos 15 minutos houve o lance capital da partida. Do meio campo, o árbitro suíço Hans Wüthrich flagrou uma agressão de Domingos sobre Piola dentro da área e assinalou pênalti. O zagueiro brasileiro aproveitou que a bola estava longe da área e, fora do lance, deu um chute no joelho do atacante, revidando as inúmeras provocações feitas pelo italiano. Domingos jura que a partida estava paralisada, mas a verdade é que, naquele momento, a defesa brasileira havia rebatido uma bola para o meio campo e o jogo estava em andamento.

“O jogo estava parado. Piola vinha na corrida e me atingiu com um pontapé, que eu revidei. Admitiria que o juiz fosse rigoroso comigo. Mas não podia prejudicar o time com o jogo parado.” — Domingos da Guia, em sua versão sobre o pênalti.

Domingos da Guia, considerado por muitos como o melhor e mais técnico zagueiro brasileiro da história, cometeu três pênaltis em quatro partidas na Copa de 1938. Neste sobre Piola, Domingos foi irresponsável.

Mesmo com protestos brasileiros, a penalidade foi ratificada. Na hora de bater o pênalti, o italiano Giuseppe Meazza resolveu amarrar melhor o calção, mas acabou rompendo o cordão. Assim, com a mão na cintura para segurar o calção, ele converteu o pênalti, no ângulo direito. Ao comemorar o gol, Meazza levantou os dois braços e deixou o calção cair, em uma cena hilária. Depois do gol, ele finalmente trocou a vestimenta para terminar a partida.

Depois do segundo gol, a Itália se retraiu. No fim da partida, Romeu fez uma bela jogada individual e tocou no canto de Olivieri, para diminuir o marcador. Mas insuficiente para levar o Brasil à sua primeira decisão de Copa.

A Itália chegava em sua segunda final consecutiva, como favorita.


A defesa brasileira rechaça um cruzamento italiano (Imagem: FIFA)

● Horas após o jogo, a Rádio Tupi soltou o furo de reportagem de que a partida seria anulada e disputada novamente, por causa do erro da arbitragem na marcação do pênalti. Mas não era verdade. O médico brasileiro Castello Branco realmente fez uma reclamação formal, mas a verdade é que a FIFA nunca considerou a possibilidade da anulação.

O Brasil estava tão confiante na vitória sobre a Itália, que já havia comprado as passagens aéreas de Marselha para Paris, onde seria a final da Copa. Depois da derrota, por pura raiva, os brasileiros se recusaram a ceder as passagens aos italianos, obrigando-os a fazer essa viagem de trem.

A qualidade técnica dos jogadores brasileiros era bastante apreciada pela torcida e pelos jornais franceses, mas não repercutia bem no resto do mundo. A pecha de “artistas da bola” não era vista como uma coisa boa, pois não resultava em títulos. Assim, o Brasil foi aplaudido pelo bom futebol que demonstrou, mas era criticado por ser frágil tática e psicologicamente. Com excessivas trocas de passes curtos e laterais, o ataque brasileiro era muito lento, permitindo o melhor posicionamento das equipes adversárias. Era um estilo bonito, mas não dava resultados em campo.

A imprensa brasileira também via os defeitos da Seleção. Segundo o jornal Sport Ilustrado, a Itália mereceu vencer, pois tinha jogado melhor e que o Brasil tinha tido “um ataque inoperante e sem energia e uma linha média parada e pouco combatida, salvando-se apenas a defesa”.

Brasil e Itália certamente foram as duas melhores equipes da competição. Pena que se encontraram na semifinal e não na decisão.

A polícia brasileira teve que intervir em algumas capitais, detendo várias pessoas raivosas e frustradas pela derrota para a Itália.

Com Leônidas da Silva de volta, o Brasil fez história na decisão do 3º lugar. Após sair perdendo por 2 a 0, a Seleção virou o placar para 4 a 2 e fez a sua melhor campanha em Copas até então. Essa foi a maior virada do Brasil em uma Copa até hoje.

Leônidas da Silva foi o artilheiro do certame com sete gols, sendo o único brasileiro a marcar gols em todas as partidas que disputou em Copas (fez um gol também em 1934).

Aproveitando-se da popularidade de Leônidas, a Lacta lançou a barra de chocolate “Diamante Negro”, em referência ao apelido que o craque tinha recebido dos uruguaios em 1932.


Cumprimentos iniciais entre os capitães Martim Silveira e Giuseppe Meazza (Imagem: Pinterest)

FICHA TÉCNICA:

 

ITÁLIA 2 x 1 BRASIL

 

Data: 16/06/1938

Horário: 18h00 locais

Estádio: Vélodrome

Público: 33.000

Cidade: Marselha (França)

Árbitro: Hans Wüthrich (Suíça)

 

ITÁLIA (2-3-5):

BRASIL (2-3-5):

Aldo Olivieri (G)

Walter (G)

Alfredo Foni

Domingos da Guia

Pietro Rava

Machado

Pietro Serantoni

Zezé Procópio

Michele Andreolo

Martim Silveira (C)

Ugo Locatelli

Afonsinho

Amedeo Biavati

Lopes

Giuseppe Meazza (C)

Luisinho Mesquita de Oliveira

Silvio Piola

Romeu Pellicciari

Giovanni Ferrari

Perácio

Gino Colaussi

Patesko

 

Técnico: Vittorio Pozzo

Técnico: Ademar Pimenta

 

SUPLENTES:

 

 

Guido Masetti (G)

Batatais (G)

Carlo Ceresoli (G)

Jaú

Eraldo Monzeglio

Nariz

Bruno Chizzo

Britto

Aldo Donati

Brandão

Renato Olmi

Argemiro

Mario Genta

Roberto

Mario Perazzolo

Niginho

Sergio Bertoni

Leônidas da Silva

Pietro Ferraris

Tim

Pietro Pasinati

Hércules

 

GOLS:

51′ Gino Colaussi (ITA)

60′ Giuseppe Meazza (ITA) (pen)

87′ Romeu Pellicciari (BRA) 

Lances da partida:

… 05/06/1938 – Brasil 6 x 5 Polônia

Três pontos sobre…
… 05/06/1938 – Brasil 6 x 5 Polônia

Seleção Brasileira perfilada (Imagem: FIFA)

● Após os conflitos internos e consequentes frustrações de 1930 (por causa do bairrismo de cariocas e paulistas) e 1934 (por incompatibilidades entre amadores e profissionais), finalmente a Seleção Brasileira pode contar com o que tinha de melhor e ainda teve tempo para se preparar.

Satisfeita com o trabalho do técnico Ademar Pimenta (que treinava o pequeno Madureira-RJ) no Sul-Americano de 1937, a CBD o manteve como técnico para a Copa do ano seguinte. Apesar de bem intencionado, não era muito firme nas decisões e era constante vítima das pressões dos dirigentes dos clubes para escalar esse ou aquele jogador. Mas ele não se atualizava. Criticado publicamente até pelo ponta esquerda Patesko, Ademar não conhecia, por exemplo, o sistema de jogo WM (formação implementada em 1925 pelo inglês Herbert Chapman no Arsenal), trazida para o Brasil pelo húngaro Dori Kürschner, quando veio treinar o Flamengo. O WM consistia em uma linha de três defensores, dois meio campistas recuados e dois mais avançados, além de três atacantes de ofício. O sistema já foi utilizado por algumas seleções naquela Copa e seria bastante utilizado no futuro pelas seleções europeias. O WM propiciava maior ocupação dos espaços do campo. Pimenta, porém, ainda usava o sistema clássico, a “pirâmide”, o 2-3-5.

Veja mais:
… 05/06/1938 – Brasil 6 x 5 Polônia
… 12/06/1938 – Brasil 1 x 1 Tchecoslováquia

… Domingos da Guia: o maior zagueiro da história do Brasil
… Patesko: ponta esquerda craque e letal
… Luís Mesquita de Oliveira: ícone do futebol paulista nos anos 1930

Em março de 1938, Pimenta relacionou 34 atletas para os treinamentos iniciais, na cidade mineira de Caxambu. Durante a preparação, ele montou dois times diferentes: o azul (mais leve) e o branco (mais pesado). E para se esquivar das pressões, nunca revelou qual dos dois seria titular. Ao ser questionado qual dos dois times seria titular, ele respondia: “Ou um ou o outro, ou uma mescla dos dois”. Apenas dois craques eram unanimidades: Leônidas da Silva e Domingos da Guia (ambos do Flamengo).

Dentre os cortados antes do embarque, destaque para o centromédio Fausto, do Flamengo (estrela brasileira da Copa de 1930 – que faleceu no ano seguinte, aos 34 anos, vítima de tuberculose); Waldemar de Brito, atacante do Flamengo; Carvalho Leite, atacante do Botafogo (com apenas 26 anos, mas com experiência de ter estado nas duas Copas anteriores); Santa Maria, zagueiro do Fluminense; Oswaldo, goleiro do São Christovam (atual São Cristóvão, clube que revelaria Ronaldo Fenômeno).

Agora profissionais, os atletas tiveram um desentendimento inicial com a CBD sobre os valores que receberiam (diárias, ajuda de custo, salário e “bicho” por vitória e/ou empate), mas logo tudo foi resolvido.

O zagueiro uberabense Nariz, que jogava no Botafogo-RJ, também foi o médico auxiliar do Dr. José Maria Castelo Branco. Nariz, o Dr. Álvaro Lopes Cançado, havia concluído o curso de medicina em 1936, na Faculdade de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro. Ele e o ponta Luisinho haviam pedido permissão à comissão técnica da Seleção Brasileira para levar suas esposas à França. O treinador aceitou o pedido, o que foi motivo de ciúmes dos demais atletas, que não gostavam do privilégio dos dois jogadores, chamados de “Acadêmicos” (um era médico e o outro advogado).

Apesar de tudo, a Seleção de 1938, ao contrário das anteriores, contava com duas coisas: seus melhores jogadores e a confiança do torcedor. Pela primeira vez acreditava-se, de verdade, que o Brasil poderia voltar da França campeão do mundo.

A travessia do Atlântico foi feita a bordo do navio inglês Arlanza, que custou 150 contos de réis à CBD. Os 18 dias de viagem para a França foram um problema para a seleção. Apesar dos exercícios físicos no convés, os jogadores engordavam. Romeu, o que tinha mais tendência a engordar, saiu do Brasil com 70 kg e chegou na França com 79. A seleção desembarcou em Marselha em 15 de maio, vinte dias antes da estreia na Copa. Teve tempo para se preparar devidamente, como nunca antes tivera.

A Polônia estava em sua primeira Copa do Mundo e os atletas se reuniram apenas uma semana antes do Mundial, devido aos jogos da Liga de futebol local, e chegaram à França a dois dias da estreia, após uma viagem de 36 horas de trem.

O Brasil atuava no sistema clássico, o 2-3-5, com muita fragilidade no sistema defensivo.

A Polônia também atuava no 2-3-5, como era comum na época, mas mais obediente taticamente do que o Brasil.

● No dia do jogo, o jornal “O Globo” anunciava: “Nada deterá o ímpeto do scratch branco!” Claro que se referia ao Brasil, mas… os poloneses também jogavam com camisas brancas. Por força de um sorteio, o Brasil teve que entrar em campo com um estranho uniforme: meias pretas, calção azul-bandeira e camisa num tom azul mais pálido. Foi a única vez que a Seleção Brasileira entrou em campo sem um distintivo no peito.

Aproveitando o campo pesado, consequência da forte chuva que caíra no dia anterior, os poloneses começaram atacando. O Brasil também partiu para o ataque, mostrando o que tinha de melhor: o individualismo, compensando a deficiência tática. O resultado foi um jogo cheio de gols.

Antes de Leônidas abrir o placar, aos 18 minutos, Perácio já havia acertado um de seus famosos petardos no travessão. Mas aos 23 minutos, o desprotegido Domingos foi obrigado a agarrar Wodarz dentro da área. Pênalti convertido por Scherfke, no canto direito do goleiro.

No minuto seguinte, Romeu ampliou. Aos 44, Perácio anotou o primeiro gol de cabeça da história do Brasil em Copas.

No segundo tempo, o gramado, que já era ruim, ficou em estado lastimável com a chuva. Isso privilegiou o estilo de jogo mais pesado dos poloneses, que empataram com dois gols de Ernest “Ezi” Wilimowski. Após parar a chuva, Perácio marcou outro aos 26 e Wilimowski empatou de novo, no penúltimo minuto, forçando a prorrogação. Aí brilhou Leônidas da Silva.

No quinto gol brasileiro, aos três minutos, Leônidas marcou – diz a lenda – sem a chuteira do pé direito, que havia se rompido na costura. O juiz Eklind não teria percebido a irregularidade porque, àquela altura, os jogadores já estavam com os pés e as pernas cheios de barro. Na semana seguinte, um texto na revista parisiense Foot-ball afirmava que o juiz Eklind, ao perceber que Leônidas tirara do pé a chuteira rasgada e dava a impressão de pretender continuar jogando sem ela, havia procedido corretamente ao pedir que o atacante deixasse o campo e calçasse uma nova. Mas não fazia menção ao célebre “gol descalço”. Já o jornal paulista Folha da Manhã foi mais preciso, ao informar que Leônidas descalçara a chuteira “logo após o quinto gol brasileiro”. Essa história nunca foi totalmente confirmada e ficou a lenda do gol descalço.

O persistente Wilimowski ainda marcou o quinto para a Polônia a dois minutos do fim da prorrogação, se tornando até hoje o jogador que mais fez gols sobre a Seleção Brasileira em um único jogo (quatro gols).

Leônidas da Silva disputa bola com a defesa polonesa (Imagem: Daily Mail)

● A Polônia jogou muito bem, mas o Brasil foi melhor e venceu pela primeira vez em uma estreia de Copa. Os dirigentes da CBD anunciaram ainda no vestiário que o bicho seria pago em dobro.

A Copa de 1938 (assim como a de 1934) foi no formato eliminatório, começando direto nas oitavas de final. Ou seja, com a derrota, a Polônia foi eliminada logo na primeira partida, terminando em 11º lugar entre as 15 seleções.

O estilo criativo do futebol brasileiro encantou a crítica, mas não era levado à sério devido a fragilidade de seu sistema defensivo. Segundo a imprensa francesa, os brasileiros jogavam um futebol “mais intuitivo do que inteligente”.

A vitória sobre a Polônia foi o primeiro jogo de Copa do Mundo transmitido por rádio para o Brasil. O narrador pioneiro (ou speaker, como se dizia na época) foi Gagliano Neto, da rede Byington, formada pelas rádios “Clube do Brasil” e “Cruzeiro do Sul”. Gagliano, narrava de forma extremamente patriótica, denegrindo os adversários do Brasil. Foi necessário um telegrama do Ministério das Relações Exteriores do Brasil, pedindo para ele ser menos parcial. Foi uma aventura. Durante a Copa, Gagliano chegou a narrar em pé, à beira do gramado, no meio da torcida, e até no telhado de uma casa vizinha.

FICHA TÉCNICA:

 

BRASIL 6 x 5 POLÔNIA

 

Data: 05/06/1938

Horário: 17h30 locais

Estádio: Meinau

Público: 13.452

Cidade: Estrasburgo (França)

Árbitro: Ivan Eklind (Suécia)

 

BRASIL (2-3-5):

POLÔNIA (2-3-5):

Batatais (G)

Edward Madejski (G)

Domingos da Guia

Władysław Szczepaniak (C)

Machado

Antoni Gałecki

Zezé Procópio

Wilhelm Góra

Martim Silveira (C)

Erwin Nyc

Afonsinho

Ewald Dytko

Lopes

Ryszard Piec

Romeu Pellicciari

Leonard Piątek

Leônidas da Silva

Fryderyk Scherfke

Perácio

Ernest “EziWilimowski

Hércules

Gerard Wodarz

 

Técnico: Ademar Pimenta

Técnico: Józef Kałuża

 

SUPLENTES:

 

 

Walter (G)

Walter Brom (G)

Jaú

Edmund Giemsa

Nariz

Edmund Twórz

Britto

Kazimierz Lis

Brandão

Wilhelm Piec

Argemiro

Jan Wasiewicz

Roberto

Stanisław Baran

Luisinho Mesquita de Oliveira

Ewald Cebula

Niginho

Bolesław Habowski

Tim

Józef Korbas

Patesko

Antoni Łyko

 

GOLS:

18′ Leônidas da Silva (BRA)

23′ Fryderyk Scherfke (POL) (pen)

25′ Romeu Pellicciari (BRA)

44′ Perácio (BRA)

53′ Ernest Wilimowski (POL)

59′ Ernest Wilimowski (POL)

71′ Perácio (BRA)

89′ Ernest Wilimowski (POL)

93′ Leônidas da Silva (BRA)

104′ Leônidas da Silva (BRA)

118′ Ernest Wilimowski (POL)

Melhores momentos da partida, com todas as limitações de 80 anos atrás:

… Polônia e a breve história de sua seleção de futebol

Três pontos sobre…
… Polônia e a breve história de sua seleção de futebol

(Imagem localizada no Google)

A seleção polonesa fez sua primeira partida oficial em 18/12/1921, perdendo por 1 x 0 em um amistoso com a Hungria, em Budapeste. Estreou em Copas do Mundo em 1938, caindo logo na estreia, mas vendendo muito caro uma derrota para o Brasil por 6 x 5 na prorrogação, com incríveis quatro gols de Ernest Wilimowski (apelidado de Ezi).

Pouco depois, a Polônia foi o país que mais sofreu com a Segunda Guerra Mundial e passou a se esconder atrás da cortina de ferro do bloco soviético. Devido ao regime comunista, o futebol não se profissionalizou e todos os jogadores eram considerados simples amadores. Mas isso não foi algo ruim, muito pelo contrário. Apenas amadores podiam participar dos Jogos Olímpicos e os comunistas podiam envias suas equipes completas, encobertas pelo amadorismo de fachada.

E é nesse momento que entra essa geração que colocou a Polônia de vez no mapa futebolístico e começou a fazer história. Nos Jogos Olímpicos de 1972, os poloneses conquistaram a medalha de ouro, derrotando a Hungria na final por 2 a 1, com dois gols de Deyna. Em toda a competição, foram 21 gols marcados em 7 jogos (média de três gols por partida).

Na Copa de 1974, na mesma Alemanha onde foi campeã olímpica, a Polônia chegou forte, mas desfalcada de seu maior craque, o centro-avante Włodzimierz Lubański, que foi o grande líder e destaque em 1972. Lubański atuou pela seleção entre 1963 e 1980, com 75 partidas e 48 gols (ainda é o maior artilheiro histórico). Ele se lesionou em 06/06/1973, contra a Inglaterra, nas eliminatórias para a Copa do Mundo. Teve uma lesão no ligamento cruzado que o tirou dos gramados por dois anos, inclusive do Mundial.


Włodzimierz Lubański
(Imagem: glamrap.pl)

Com a ausência de Lubański, foi necessário que outro craque chamasse o protagonismo para si. O careca ponta direita Grzegorz Lato (aniversariante de hoje, 08/04) tinha uma velocidade absurda, correndo 100 metros em incríveis 10,8 segundos. Lato não brilhou em um só verão (“Lato” significa “verão” em polonês). Ele foi o artilheiro da Copa de 1974, marcando sete gols, inclusive no 1 x 0 contra o Brasil, que valeu o 3º lugar do torneio à Polônia.

Mesmo não sendo uma equipe desconhecida, não estava entre as consideradas favoritas, principalmente devido ao fato de ser comunista e frequentar pouco o noticiário estrangeiro. Isso deu ainda mais tranquilidade ao técnico Kazimierz Górski. Ele sabia tirar o melhor de cada um de seus comandados, principalmente de Lato. Era uma seleção jovem, com muita disciplina tática, jogadores velozes e time entrosado, com um futebol rápido e envolvente, uma defesa segura e o talento de Deyna no meio campo, além de Lato e Gadocha nas pontas.


Grzegorz Lato
(Imagem localizada no Google)

O show começou nas eliminatórias, quando eliminou a forte Inglaterra (campeã oito anos antes), com uma vitória por 2 x 0 em casa e um empate por 1 x 1 em pleno Wembley, com Jan Tomaszewski fechando o gol.

Já na Copa, mesmo em um grupo difícil, a Polônia venceu os três jogos (3 x 2 na Argentina, 7 x 0 no Haiti e 2 x 1 na Itália), se classificando em primeiro lugar. A partir daquele instante, quem ainda duvidava do poder de fogo dos poloneses passou a rever seus conceitos.

Na segunda fase, as oito seleções classificadas foram divididas em dois grupos de quatro, com a primeira colocada garantindo vaga na final e a segunda na decisão do 3º lugar. Nos dois primeiros jogos, duas vitórias (1 x 0 na Suécia e 2 x 1 na Iugoslávia). A terceira e decisiva partida foi contra a anfitriã, Alemanha Ocidental, que também tinha vencido os dois jogos, mas jogava pelo empate por possuir maior saldo de gols (4, contra 2 dos poloneses). Assim, o jogo foi na prática uma semifinal direta, valendo vaga na decisão.

Durante todo o dia caiu uma chuva torrencial na cidade de Frankfurt, o que certamente prejudicava o futebol rápido da Polônia e favorecia a força física, principal arma da Alemanha Ocidental. Mesmo com o técnico Kazimierz Górski pedindo o adiamento da partida, ela aconteceu. E com um gol de Gerd Müller aos 31 minutos do segundo tempo, os alemães venceram por 1 x 0. Fim do sonho polonês e festa para os donos da casa.

Restou à Polônia disputar a decisão do 3º lugar contra o Brasil, que perdeu para a Holanda de Johan Cruijff (e do futebol total) no outro grupo. Em Munique, a 15 minutos do fim, Marinho Chagas errou o passe, Lato foi lançado em suas costas e arrancou sozinho para o gol. Mesmo sem ter o gosto de jogar a final, os poloneses comemoraram bastante a sólida campanha, terminando a competição em terceiro, com 6 vitórias e apenas 1 derrota. A partir desse momento, a Polônia passou a ser uma equipe respeitada e temida no mundo da bola.

Com o mesmo time base, nas Olimpíadas de 1976, em Montreal, a Polônia novamente foi finalista, mas ficou com a medalha de prata ao ser derrotada por 3 x 1 pela Alemanha Oriental.

Na Copa de 1978, a estrutura era basicamente a mesma, com o acréscimo do craque Włodzimierz Lubański, que já estava com 31 anos e em não tão boa forma quanto estaria quatro anos antes. Mas nesse torneio surgiu o jovem Zbigniew Boniek, com apenas 22 anos. Novamente a equipe foi comendo pelas beiradas e chegou em 5º lugar. Essa Copa marcou a despedida da maioria dos jogadores da era dourada. Do time de 1974, somente Andrzej Szarmach, Grzegorz Lato e Władysław Żmuda disputariam a Copa de 1982.

Na Copa da Espanha, um dos grandes destaques era Boniek. Ele era um jogador completo, atuando na ala esquerda, no meio, como ponta ou no ataque. Um jogador genial. Com ele, Lato e o novato Włodzimierz Smolarek juntos, a Polônia era cada vez mais temida. Classificou-se em primeiro lugar com dois empates e uma vitória. Na segunda fase, eliminou as fortes União Soviética e Bélgica. Caiu novamente de pé na semifinal em derrota por 2 x 0 para a futura campeã Itália, em partida que Boniek não disputou por estar suspenso pelo segundo cartão amarelo. Na decisão do 3º lugar, nova vitória, por 3 x 2 sobre a França de Michel Platini.


Zbigniew Boniek
(Imagem: Łączy-nas-piłka)

Em 1986, a Polônia disputou sua quarta Copa consecutiva, mas já não tinha a força de antes. Boniek ainda era o craque do time. Żmuda era o único remanescente de 1974, sendo também quem mais vestiu a camisa da Polônia em Copas do Mundo, com 21 partidas, entre 1974, 1978, 1982 e 1986. Mesmo assim, os poloneses passaram da primeira fase como um dos melhores 3º colocados, ao empatarem com o Marrocos, vencerem Portugal e perderem para a Inglaterra. Mas o sonho foi interrompido nas oitavas de final, ao serem impiedosamente goleados pela Seleção Brasileira por 4 x 0. Esse massacre foi um atestado de que os melhores dias já haviam passado para o futebol polonês.

Houve a medalha de prata nos Jogos Olímpicos de 1992, mas nenhum medalhista de prata se destacou posteriormente. Se classificou para a Copa de 2002, mas graças a um nigeriano naturalizado: Emmanuel Olisadebe. Com duas derrotas e uma vitória, pela primeira vez foram eliminados na fase de grupos, com sua pior campanha da história das Copas. Conseguiu também se qualificar para a Copa de 2006, mas também ficou na primeira fase, de novo com duas derrotas e uma vitória na última rodada.

Disputou pela primeira vez a Eurocopa, em 2008, ficando em último lugar no grupo. Foram duas derrotas e um empate, com um único gol marcado pelo brasileiro naturalizado Roger Guerreiro, lateral ex-Corinthians. Na Euro 2012, em casa, nova decepção, sendo logo eliminada com uma derrota e dois empates.

Já na Euro 2016, liderada por Robert Lewandowski, enfim a Polônia fez uma campanha digna. Na fase de grupos, venceu a Irlanda do Norte e a Ucrânia, segurando um empate sem gols com a Alemanha. Nas oitavas de final, empate com a Suíça em 1 a 1 e vitória por 5 a 4 nos pênaltis. Nas quartas de final, novo empate por 1 a 1, mas dessa vez foi derrotada na decisão das penalidades por 5 a 3 para Portugal, futuro campeão. No fim, o 7º lugar geral dentre as 24 seleções foi uma boa campanha, o que melhora as perspectivas para as próximas competições.


Robert Lewandowski
(Imagem: Kicker)