… 19/06/1958 – Brasil 1 x 0 País de Gales

Três pontos sobre…
… 19/06/1958 – Brasil 1 x 0 País de Gales


(Imagem: CBF / Baú do Futebol)

● Na fase de grupos, a Seleção Brasileira bateu a Áustria por 3 a 0 e empatou sem gols com a Inglaterra (no primeiro 0 x 0 da história das Copas, depois de 116 jogos). Na partida derradeira, o Brasil enfrentou o futebol científico da União Soviética, na estreia de Zito, Garrincha e Pelé. Após começar o jogo com tudo e venceu por 2 a 0, com dois gols de Vavá. Seu adversário nas quartas de final era a seleção do País de Gales.

Gales é um principado e não uma nação autônoma. Fica na ilha da Grã-Bretanha e faz parte do Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte. Não participa dos Jogos Olímpicos como país independente, mas possui seleção própria no futebol (e em alguns poucos outros esportes) pela sua importância histórica. Foi um dos responsáveis por solidificar o futebol no século XIX e até hoje faz parte do IFAB – International Football Association Board, instituição responsável pelos regras do futebol.

Os britânicos estavam longe de serem uma potência no futebol. Conseguiram a classificação para a única Copa de sua história porque a Indonésia, o Egito e o Sudão (todos de maioria muçulmana) se negaram a jogar conta Israel e foram desclassificados. Assim, para que os israelenses não se qualificassem para o Mundial sem jogar as eliminatórias, foi feito um sorteio para definir qual país europeu disputaria a repescagem da zona asiática, dentre os segundos colocados em cada chave. Os galeses tiveram essa sorte, depois de terem ficado em segundo lugar no Grupo 4 das eliminatórias europeias, atrás da Tchecoslováquia e à frente da Alemanha Oriental. Foram duas vitórias fáceis e sonolentas sobre Israel, ambas por 2 x 0 – primeiro em Tel Aviv e depois em Cardiff.

Pela primeira e única vez, as quatro seleções britânicas disputaram uma Copa do Mundo: Inglaterra, Escócia, País de Gales e Irlanda do Norte. Apenas galeses e norte-irlandeses se classificaram para a segunda fase.


(Imagem: Ultrajano)

● Os dois times jogaram desfalcados de seus centroavantes. O Brasil estava sem Vavá, que sofreu um profundo corte na canela na jogada do segundo gol contra a União Soviética. Mazzola ganhou nova chance no time titular.

Na primeira fase, os britânicos empataram as três partidas: 1 x 1 com a Hungria, 1 x 1 com o México e 0 x 0 com a Suécia. No jogo desempate, bateu a Hungria por 2 x 1.

Esse era o terceiro jogo de Gales em cinco dias. Havia jogado no domingo (contra os suecos), na terça (contra os húngaros) e agora jogava na quinta contra o Brasil. O escrete canarinho teve todos esses dias para descansar e chegava mais inteiro.

Gales não tinha sua estrela, seu melhor jogador, o grandalhão John Charles, que se machucou no estafante jogo-extra contra a Hungria. Relatos afirmam que ele foi derrubado pelos húngaros por mais de vinte vezes. Além dele, vários jogadores galeses jogaram reclamando de dores musculares.


O Brasil atuava em um falso 4-2-4, se transformando em um 4-3-3 com o recuo voluntário de Zagallo. Mazzolla era mais técnico que Vavá (mais brigador).


O País de gales jogava no sistema WM.

● O Brasil era amplamente favorito. O País de Gales era um equipe modesta, mas bem consciente de suas limitações e que sabia usar suas armas. O técnico Jimmy Murphy armou seu time de forma bem fechada, com marcação individual – especialmente em Garrincha, Pelé e Didi. Sem John Charles, os galeses não tinham tanto poder na bola aérea e, portanto, não tinha mais sua única estratégia de ataque. O negócio foi fechar o time todo na defesa e deixar apenas Colin Webster na frente – o substituto de Charles.

Com isso, a partida teve apenas um roteiro durante os noventa minutos: um duro duelo entre o ataque brasileiro e a defesa galesa. A bem da verdade, os britânicos se defendiam em bloco e se seguraram muito bem, dificultando muito o trabalho da linha de frente do escrete canarinho.

Bem marcados, os craques pouco podiam fazer. E, quando conseguiam chegar na área, paravam no goleiro Jack Kelsey, do Arsenal. Ele era o grande destaque individual da partida, responsável por grandes defesas e por fazer muita cera. Os beques Stuart Williams, Mel Charles e Mel Hopkins faziam marcação agressiva e chegaram a salvar lances em cima da linha de gol. Contaram com a sorte em um lance que Mazzola cabeceou e a bola bateu na trave, na linha de gol e não entrou.

Em compensação, Gylmar não tinha feito nenhuma defesa e havia recebido apenas duas bolas recuadas pelos zagueiros.

O primeiro tempo terminou 0 a 0. No intervalo, Vicente Feola fez uma preleção de acordar o time, que voltou mais vivo do vestiário.

Garrincha entrou na área, driblou um adversário cortando para a direita e bateu forte. Mesmo a queima-roupa, Kelsey espalmou para cima.

Em uma rara ocasião, o ponta direita Terry Medwin cortou Nilton Santos e chutou, mas Gylmar encaixou sem dificuldades.


(Imagem: AFP / FIFA)

O empate sem gols castigava a atuação brasileira e os 25.923 expectadores presentes no estádio Nya Ullevi, em Gotemburgo.

Mas a retranca foi furada aos 28 minutos do segundo tempo, quando já começavam os sinais de nervosismo.

Da direita, Mazzola levantou a bola de bicicleta para a linha da grande área. Didi veio na corrida e escorou de cabeça. Pelé dominou dentro da área e, de costas para o gol, tocou com o pé direito para tirar Mel Charles da jogada, deixou a bola quicar e finalizou de pé direito antes da chegada de Williams na cobertura. A rapidez de raciocínio e da finalização de Pelé pegou de surpresa o goleiro Kelsey, que nem foi na bola.

Um golaço. Pelé não poderia entrar para a história com um gol qualquer. Foi o primeiro de seus doze gols em Copas do Mundo. Era o início do reinado de um menino negro de apenas 17 anos de idade.

Depois do gol, Pelé foi buscar a bola dentro do gol galês com a intenção de gastar algum tempo. Segundo ele, o jogo estava “muito difícil naquele momento”. Mas Garrincha, Didi e Zagallo não quiseram saber de mais nada e pularam em cima dele para comemorar, se amontoando dentro do gol mesmo. A cena propiciou uma das mais belas fotos do Mundial de 1958.

Os galeses perderam o ânimo totalmente, até porque sabiam que não tinham poder de fogo para empatar a partida. Assim, surgiram outras chances para a Seleção Brasileira ampliar. Aos 36′, Mazzola fez um lindo gol de bicicleta, estranhamento anulado pelo árbitro austríaco Fritz Seipelt por jogo perigoso, apesar de nenhum galês estar por perto.

O Brasil estava classificado para a semifinal da Copa do Mundo.


(Imagem: O Globo)

● O goleiro Gylmar continuava invicto, sem sofrer gols na competição.

Didi foi considerado o melhor em campo, mas todos os olhares e aplausos eram para Pelé. Ele é até hoje o jogador mais jovem a marcar gol em Copas, com 17 anos e 239 dias.

No fim do ano 2000, esse gol de Pelé foi eleito por um júri da revista Placar como o gol mais importante do futebol brasileiro no século XX.

O presidente da República, Juscelino Kubitschek, convidou o Sr. Amaro, pai de Garrincha, para ouvirem o jogo juntos pelo rádio no palácio do Catete. Quando saiu o gol de Pelé, o desbocado Amaro queria soltar um palavrão, mas se conteve na frente de pessoas tão importantes e desconhecidas. Mas JK foi mais espontâneo e disse o palavrão por ele.

No fim da partida, a seleção rumaria a Estocolmo para as semifinais. Mas, antes de partir, soube cativar o povo de Gotemburgo: Bellini comandou uma volta olímpica com os jogadores carregando a bandeira sueca.

No estádio Råsunda, o Brasil ainda venceria a França na semifinal por 5 x 2. Na decisão, venceria a Suécia, dona da casa, pelo mesmo placar de 5 x 2 e se consagraria o legítimo campeão da Copa do Mundo de 1958.


(Imagem: Pinterest)

FICHA TÉCNICA:

 

BRASIL 1 x 0 PAÍS DE GALES

 

Data: 19/06/1958

Horário: 19h00 locais

Estádio: Nya Ullevi

Público: 25.923

Cidade: Gotemburgo (Suécia)

Árbitro: Fritz Seipelt (Áustria)

 

BRASIL (4-2-4):

PAÍS DE GALES (WM):

3  Gylmar (G)

1  Jack Kelsey (G)

4  Djalma Santos

2  Stuart Williams

2  Bellini (C)

5  Mel Charles

15 Orlando

3  Mel Hopkins

12 Nilton Santos

4  Derrick Sullivan

19 Zito

6  Dave Bowen

6  Didi

7  Terry Medwin

11 Garrincha

8  Ron Hewitt

18 Mazzola

19 Colin Webster

10 Pelé

10 Ivor Allchurch

7  Zagallo

11 Cliff Jones

 

Técnico: Vicente Feola

Técnico: Jimmy Murphy

 

SUPLENTES:

 

 

1  Castilho (G)

12 Ken Jones (G)

14 De Sordi

13 Graham Vearncombe (G)

16 Mauro

14 Trevor Edwards

9  Zózimo

20 John Elsworthy

8  Oreco

15 Colin Baker

5  Dino Sani

16 Vic Crowe

13 Moacir

21 Len Allchurch

17 Joel

17 Ken Leek

20 Vavá

18 Roy Vernon

21 Dida

22 George Baker

22 Pepe

9  John Charles

 

GOL: 73′ Pelé (BRA)

Chute de Garrincha e gol de Pelé:

Gol de Pelé e gol (mal) anulado de Mazzola, de bicicleta:

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