… 31/03/1963 – Bolívia 5 x 4 Brasil

Três pontos sobre…
… 31/03/1963 – Bolívia 5 x 4 Brasil


Em pé: Max Ramírez, Eduardo Espinoza, Wilfredo Camacho, Roberto Caínzo, Eulogio Vargas e Arturo López. Sentados: Ramiro Blacut, Máximo Alcócer, Víctor Agustín Ugarte, Ausberto García e Fortunato Castillo (Imagem: historiadoresdosesportes.com)

● A Copa América teve sua primeira edição em 1916. Desde então, ela passou a ser disputada com frequência, mas de forma intermitente. Entre 1916 e 1929, a competição só não ocorreu em 1918 e 1928. Voltaria em 1935 de forma bianual, mas continuaria irregular até 1967. Tanto, que em 1959 houve dois torneios.

Em 1963, a Bolívia foi sede do torneio pela primeira vez. Os bolivianos não tinham uma grande tradição no futebol. Haviam participado apenas de nove das 27 edições anteriores do torneio. Disputou a Copa do Mundo de 1930 (perdeu para a Iugoslávia e para o Brasil, ambos por 4 x 0).

Mas para compreender melhor as circunstâncias dessa partida histórica, precisamos voltar até a fatídica Copa do Mundo de 1950, sediada no Brasil. A seleção boliviana ganhou a vaga de presente após a desistência dos argentinos, que estavam com relações futebolísticas cortadas com o Brasil na época. A Bolívia foi sorteada no Grupo D, juntamente com Uruguai, França e Portugal. Franceses e portugueses desistiram antes mesmo de viajarem e a FIFA não preencheu suas vagas na competição. Ou seja: a Copa teria quatro grupos de quatro seleções, mas o Grupo C teve três (a Índia desistiu) e o Grupo D contou apenas com Uruguai e Bolívia. Ambos se enfrentaram em 02/07/1950, no estádio Independência, em Belo Horizonte, com massacre dos charruas por 8 a 0.


O povo boliviano ficou em festa com o título (Imagem: historiadelfutbolboliviano.com)

● Treze anos depois, a Bolívia sediaria o Campeonato Sul-Americano. Tinha um elenco fraco, mas contava com seu grande aliado desde sempre: a altitude – maior fator histórico do pouco sucesso das equipes boliviana e até mesmo de sua seleção. Os atletas locais, mais adaptados a jogar no mítico estádio Hernando Siles, na capital La Paz, a 3.600 metros acima do mar, costumam ter vantagem por sofrer menos com o ar rarefeito e seus impactos, como falta de ar, dor de cabeça e cansaço excessivo.

As três potências do continente se revoltaram por disputar a competição na altitude. O Uruguai desistiu e nem enviou sua delegação. A Argentina enviou uma equipe de jovens inexperientes. O Brasil, então bicampeão do mundo, optou por poupar seus principais atletas e convocou uma lista de jogadores de pouco prestígio até mesmo em seu próprio país. Os mais “famosos” eram o zagueiro Procópio, do Atlético-MG, e o atacante Flávio Minuano, do Inter.


Danilo Alvim, “O Príncipe” (Imagem: tardesdepacaembu.wordpress.com)

O técnico da Bolívia também nos faz recordar a Copa de 1950. Era o brasileiro Danilo Alvim, apelidado de “O Príncipe” pelo seu estilo refinado de jogo. Era um jogador muito técnico, mesmo sendo um volante marcador. Foi um dos pilares do CR Vasco da Gama das décadas de 1940 e 1950, que ficou conhecido como “Expresso da Vitória”.

Danilo foi um dos criticados após o Maracanazzo. Pendurou as chuteiras em 1956, no nosso amado Uberaba Sport Club e já emendou a carreira de técnico no clube mineiro, onde durou um ano. Mesmo sem experiência na função, foi descoberto e convidado pela Federação Boliviana de Futebol para ser o comandante da seleção anfitriã na Copa América de 1963. Discípulo do uruguaio Ondino Vieira (que o treinou no Vasco), Danilo armou o time no sistema tático WM – bastante ofensivo e desprotegido, se comparado com o 4-2-4 que já tinha virado moda desde o início da década.

A dona da casa contava com a liderança de Víctor Agustín Ugarte, “El Maestro”, que estava prestes a completar 37 anos e era remanescente da Copa de 1950. Citado por muitos como o maior jogador da história do país, já não tinha um rendimento físico e técnico como os companheiros e adversários, mas compensava com inteligência e bom posicionamento.


Víctor Agustín Ugarte, “El Maestro”, encerrou a carreira nos braços de seu povo (Imagem: historiadelfutbolboliviano.com)

● Mas a Bolívia não começou bem o torneio, ao empatar com o Equador por 4 x 4. Depois, com direito a catimba e retranca, virou sobre a Colômbia por 2 x 1. Na sequência, venceu o Peru por 3 x 2 e o Paraguai por 2 x 0. O sonho ficou mais próximo de se tornar realidade ao vencer a combalida Argentina por 3 x 2.

O formato do torneio era de pontos corridos. Àquela altura, na última rodada, bastava uma vitória diante do Brasil para garantir a taça. Mas a Bolívia foi além. Danilo teve todos méritos ao conter a empolgação de seus comandados, não os deixando levar pela torcida e pela imprensa. Nada estava decidido.

Três equipes tinham chances de título ou de forçar o jogo extra. A Bolívia tinha 9 pontos, o Paraguai 8, e o Brasil 7. A Bolívia dependia apenas de si precisava vencer o Brasil para ser campeã. O Paraguai necessitava vencer a Argentina e torcer por uma vitória (seria campeão) ou empate (forçaria o jogo extra) do Brasil sobre a Bolívia. O Brasil tinha que vencer a Bolívia para forçar o jogo extra, mas só se a Argentina derrotasse o Paraguai. Se isso acontecesse, Brasil, Argentina e Paraguai disputariam um triangular final – e a Bolívia estaria eliminada.

Contudo, na partida preliminar no estádio Hernando Siles, o Paraguai empatou com a Argentina no mesmo dia 31/03 e deixou os donos da casa a um empate do título.


A Bolívia jogou no já defasado sistema tático WM. Enquanto a defesa ficava desguarnecida, o ataque era fortalecido.


O Brasil, de Amyoré Moreira, foi escalado no seu já tradicional 4-2-4 – sistema tático que lhe rendeu as duas últimas Copas do Mundo.

● Sabendo do que precisava, a Bolívia começou com tudo. Abriu o placar com o ídolo Víctor Agustín Ugarte, aos 15 minutos de jogo.

O talismã Wilfredo Camacho ampliou aos 25′. Na partida anterior, contra a Argentina, Camacho tinha feito um gol de pura persistência, que deu origem à expressão “futebol camachista“, desde então usada para denominar a raça e entrega dos bolivianos durante uma partida.

O Brasil diminuiu logo na sequência, com Marco Antônio, que jogava no Comercial, de Ribeirão Preto.

Dois minutos depois, a Seleção Canarinho voltou a ter esperanças ao empatar, com gol de Almir, atleta do Taubaté.

Mas, aos 13 min do 2º tempo, o ídolo Ugarte frustrou os brasileiros e fez o terceiro dos locais. Ele não tinha feito nenhum gol na competição. Quando precisou, no jogo decisivo, fez logo dois. O camisa 10 se consagrou definitivamente como o maior mito do futebol local e encerrou a carreira ali mesmo.

Ausberto García ampliou aos 17′.

Flávio Minuano fez dois gols, aos 63′ e aos 66′ e deixou tudo igual novamente. Flávio era realmente muito bom e merecia ter disputado a Copa do Mundo de 1966, se não houvesse aquela bagunça generalizada na organização.

O placar se tornou definitivo em 5 x 4 a quatro minutos do fim, com o gol do ponta direita Máximo Alcócer, artilheiro boliviano no torneio com cinco gols.


(Imagem: historiadoresdosesportes.com)

● Com o resultado, a Bolívia (e sua altitude) conquistou o título da Copa América de 1963 de forma invicta, com cinco vitórias e um empate, marcando 19 gols e sofrendo 13. O sistema hiper-ofensivo de Danilo deu o resultado, embora sofresse na defesa.

A conquista rendeu aos heróis bolivianos uma pensão vitalícia garantida pelo Congresso Nacional do país.

O Paraguai foi o vice-campeão. O centroavante local Ramiro Blacut foi eleito o melhor jogador e o equatoriano Carlos Raffo foi o artilheiro, com seis gols marcados.

O Brasil terminou com o 4º lugar, com duas vitórias (1 x 0 no Peru e 5 x 1 na Colômbia), um empate (2 x 2 com o Equador) e três derrotas (2 x 0 para o Paraguai, 3 x 0 para a Argentina e os 5 x 4 para a Bolívia).


Os heróis do título reunidos em 2011 (Imagem: Jornal La Patria)

● A Copa América seguinte foi disputada no Uruguai, em 1967. A seleção boliviana, então detentora do troféu, terminou em último lugar, com um empate e quatro derrotas.

Desde então, a melhor classificação foi o vice-campeonato em 1997, quando voltou a jogar em casa. Perdeu a decisão para o Brasil de Ronaldo por 3 x 1.

Talvez essa geração da década de 1990 tenha sido a melhor do país em todos os tempos. Em 1994, jogadores como Erwin “Platini” Sánchez, Marco “El Diablo” Etcheverry e Julio César Baldivieso levaram a Bolívia de volta a uma Copa do Mundo. Nos EUA, perdeu para a Alemanha (1 x 0), empatou com a Coreia do Sul (0 x 0) e perdeu para a Espanha (3 x 1). Erwin Sánchez marcou o único gol dos bolivianos na história das Copas.


Seleção boliviana na Copa do Mundo de 1994 (Imagem: soccerfootballwhatever.blogspot.com)

FICHA TÉCNICA:

 

BOLÍVIA 5 x 4 BRASIL

 

Data: 31/03/1963

Estádio: Félix Capriles

Público: 25.000

Cidade: Cochabamba (Bolívia)

Árbitro: Ovidio Orrego (Colômbia)

 

BOLÍVIA (WM):

BRASIL (4-2-4):

Arturo López (G)

Silas (G)

Roberto Caínzo

Jorge

Eduardo Espinoza

Cláudio Danni

Eulogio Vargas

Procópio Cardoso (C)

Max Ramírez

Geraldino

Wilfredo Camacho

Ílton Vaccari

Máximo Alcócer

Marco Antônio

Ausberto García

Almir

Ramiro Blacut

Tião Macalé

Víctor Agustín Ugarte

Flávio Minuano

Fortunato Castillo

Oswaldo

 

Técnico: Danilo Alvim

Técnico: Aymoré Moreira

 

SUPLENTES:

 

 

Isaac Álvarez (G)

Marcial (G)

Hugo Palenque

Massinha

Alberto Torres Vargas

Amáury Horta

Osvaldo Villarroel

Mário Tito

Carlos Cárdenas

Ary

Jesús Herbas

William

Mario Zabalaga

Píter

Atilio Aguirre

Ílton Chaves

Abdul Aramayo

Altamiro

Jaime Herbas

Amauri Silva

Renan López

Fernando

Edgar Quinteros

 

 

GOLS:

15′ Víctor Agustín Ugarte (BOL)

25′ Wilfredo Camacho (BOL)

26′ Marco Antônio (BRA)

28′ Almir (BRA)

58′ Víctor Agustín Ugarte (BOL)

62′ Ausberto García (BOL)

63′ Flávio Minuano (BRA)

66′ Flávio Minuano (BRA)

86′ Máximo Alcócer (BOL)

 

SUBSTITUIÇÕES:

Jorge ↓

Massinha

 

Máximo Alcócer

Renan López

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  2. Katarina

    Muito bom o conteúdo deste site. Sou Flamengo de coraçao mas torço par todos os times gostei bastante.

    Legal, vou compartilhar com meus amigos!

  3. Celso Moreira

    Gostei. Matéria histórica . Muito boa mesmo. Parabéns para o sait

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