… 13/07/1950 – Brasil 6 x 1 Espanha

Três pontos sobre…
… 13/07/1950 – Brasil 6 x 1 Espanha


(Imagem: FIFA.com)

● Nas Copas do Mundo de 1934 e 1938, todas as partidas eram eliminatórias, ou seja, se uma seleção perdesse uma vez, já seria eliminada. Esse formato cometia aberrações, como fazer a delegação de um país atravessar o mundo para jogar um mísera partida.

Mas se nas edições anteriores todos os jogos eram finais, o Mundial de 1950 quebrou completamente essa escrita. Não haviam finais em seu regulamento. O primeiro colocado de cada um dos quatro grupos de quatro se classificaria para um quadrangular final, onde todos jogariam contra todos e quem somasse mais pontos seria o campeão do mundo.

O Brasil foi líder do Grupo 1. Goleou o México por 4 a 0, empatou com a Suíça por 2 a 2 e venceu a Iugoslávia por 2 a 0.

O apelido de Fúria atribuído aos espanhóis surgiu nessa Copa, quando a Espanha fez a melhor campanha da primeira fase. No Grupo 2, foram vitórias sobre Estados Unidos (3 x 1), Chile (2 x 0) e Inglaterra (1 x 0).

No Grupo 3, a liderança ficou com a Suécia, que bateu a Itália (3 x 2) e empatou com o Paraguai (2 x 2). A Índia seria o quarto time, mas desistiu da competição em protesto contra uma decisão da FIFA que proibia jogar descalço, o que era costume no país.

O Grupo 4, devido à desistências de Escócia e Turquia, tinha apenas Uruguai e Bolívia. A Celeste Olímpica se classificou com uma vitória, ao golear La Verde com impiedosos 8 a 0.

Assim, estavam classificados para o quadrangular final: Brasil, Espanha, Suécia e Uruguai. A ordem dos confrontos foi decidida e não sorteada. Os jogos seriam disputados no Pacaembu e no Maracanã. A CBD solicitou que o Brasil jogasse as três partidas no Maracanã, que tinha maior capacidade oficial (150 mil, contra 60 mil do estádio paulista) e, consequentemente, gerava maior renda. Isso desagradou muito aos espanhóis, porque o Brasil seria o único país que não precisaria se deslocar entre São Paulo e Rio de Janeiro.

Na primeira partida da fase decisiva, Espanha e Uruguai empataram por 2 a 2, enquanto o Brasil aumentava seu favoritismo massacrando a Suécia com 7 a 1. [Alguém aí lembrou de algum outro “7 a 1” em Copa do Mundo disputada no Brasil, com a Seleção em campo? Então, por favor, esqueça.]

Na segunda rodada, o Uruguai venceu a Suécia por 3 a 2 e o Brasil enfrentaria a Espanha. Se a Seleção vencesse, jogaria por um empate na última partida frente ao rival Uruguai.


O Brasil atuava no sistema “Diagonal”, criado pelo técnico Flávio Costa. Partindo do WM, Flávio teve a ideia de criar um losango no meio de campo, com um vértice mais avançado e outro mais recuado. Os vértices laterais eram os armadores. Na imagem, ficam claros o losango no meio campo e a faixa diagonal que deu nome ao sistema.


A Espanha jogava no WM. O sistema defensivo com três zagueiros e dois meio campistas recuados, formam um “W”. Os dois meias avançados, os dois pontas e o centroavante, formam um “M”. Por isso o sistema 3-2-2-3 da época era chamado de WM. Conforme a imagem, o meio campo formava um retângulo.

● O Brasil vinha embalado pelo resultado contra os suecos. Todos esperavam um grande jogo, não apenas os 150 mil presentes no estádio Maracanã, mas todos os 52 milhões de brasileiros que se aglomeravam juntos aos rádios para escutar as narrações de Pedro Luiz (Rádio Panamericana de São Paulo, atual Jovem Pan) e da dupla Jorge Curi e Antônio Cordeiro (Rádio Nacional — veja mais abaixo).

A Espanha estava invicta há mais de um ano e tinha grandes jogadores, como o zagueiro José Parra (eleito para a seleção da Copa), o ponta direita Estanislau Basora e o centroavante Telmo Zarra (recordista de gols em um só campeonato espanhol até aparecerem os “extra-terrestres” Messi e Cristiano Ronaldo).

No escrete nacional, Friaça continuava na ponta direita, no lugar de Maneca, que sentia uma lesão na coxa.

Logo de cara o Brasil já começou a encantar os expectadores, mostrando um futebol bonito e envolvente.

Todavia, foi a Fúria quem teve a primeira oportunidade de tirar o zero do placar, mas Telmo Zarra desperdiça ao dominar a bola com a mão.

As duas equipes se alternavam no ataque até que, aos 15 minutos, Ademir de Menezes domina a bola fora da área e chuta no canto esquerdo. A bola desvia no espanhol Parra e tira qualquer chance de defesa para o goleiro. A FIFA só creditou o gol para o centroavante brasileiro mais de cinquenta anos depois. Para os padrões da época, foi considerado gol contra.

Depois, o capitão Augusto tirou em cima da linha o que seria o empate da Fúria. Na sequência, no minuto 22, o Brasil amplia o resultado. Jair Rosa Pinto chuta de canhota da entrada da área. Ramallets ainda alcança a bola, mas a deixa escapar. Ela toca a rede pelo alto e cai dentro do gol.

Com dois tentos de vantagem, o Brasil toma conta do jogo e marca mais um. Aos 31′, Chico recebe de Bigode, entra na área pelo lado esquerdo e chuta. Ramallets espalma e Ademir pega a sobra e chuta, para nova rebatida do goleiro espanhol. Chico pega a sobra e emenda de primeira para o gol.

Com a goleada já bem encaminhada, o Brasil passa a administrar a vantagem.

No segundo tempo, o domínio foi ampliado. O time forçou duas grandes defesas de Ramallets, em chutes de Friaça e Ademir. Mas ele seria vazado outra vez aos 10′. Após lançamento longo, Ademir avança pela ponta direita e cruza. A bola passa por vários jogadores e cai nos pés de Chico, que chuta no ângulo direito. Esse foi o gol de número 300 na história das Copas do Mundo.

Mal se deu a saída de bola, quando Zizinho cruza da direita e Ademir fuzila, de dentro da área. Era o quinto do Brasil.

Dez minutos depois, Ademir, o melhor em campo, dá um belo passe para Zizinho. O craque domina a bola dentro da área, tira o marcador espanhol e chuta forte, balançando as redes da Espanha, fazendo o sexto e mais bonito dos gols.

Com o resultado garantido, o Brasil parou de atacar e a torcida começou a cantar “Touradas em Madri” nas arquibancadas (veja mais abaixo).

Não parou nem com o gol de honra da Espanha. Aos 26′, Basora corre pela ponta direita e cruza para a pequena área. Perto da trave direita (e em posição de impedimento não marcada pela arbitragem), Silvestre Igoa acerta um lindo voleio e diminui a goleada.

Depois, Zarra ainda acertaria a trave.

No fim, os espanhois passaram a assistir o toque de bola brasileiro. Nada mais importava. Estava muito próximo o sonhado título mundial do Brasil em pleno Maracanã.


(Imagem: FIFA.com)

● Vencer a Espanha de forma tão avassaladora era a prova de que o Brasil estava preparado para ser campeão do mundo. Muitos consideram que essa partida foi a maior exibição da história da Seleção. O jornalista inglês Brian Glanville escreveu que o Brasil “jogava o futebol do futuro, quase surrealista, que taticamente não apresenta nada demais, mas tecnicamente é soberbo”.

Provavelmente nunca mais tenha se visto uma festa coletiva que unisse o país inteiro, como foi naquele 13 de julho de 1950.

É até hoje a terceira maior goleada sofrida pela seleção espanhola em toda sua história.

Na última rodada, a Espanha perdeu para a Suécia por 3 a 1, terminando com o 4º lugar geral.

O Brasil enfrentou o arquirrival Uruguai, precisando apenas de um empate para se sagrar campeão, mas todos sabemos como termina essa história.

● Após o quarto gol brasileiro, a torcida estava enlouquecida e começou a cantar em coro “Touradas em Madri”. Essa que é uma das marchinhas de Carnaval mais populares da história, foi composta por João de Barro (o Braguinha) e Alberto Ribeiro.

A música já era muito conhecida, mas curiosamente tinha sido desclassificada do Carnaval de 1938, quando a comissão do júri alegou que se tratava de um “pasodoble” (estilo espanhol) e não de uma marchinha.

Mas doze anos depois, cantada em uníssono por um público oficial de 152.772 pessoas, “Touradas em Madri” foi consagrada em pleno Maracanã.

Em uma entrevista à ESPN, o jornalista João Máximo, que estava presente no estádio naquele dia, relatou como tudo começou: “Quando fui ao jogo, havia pequenos grupos de torcedores que distribuíam uma paródia para ser cantada com o ‘Touradas em Madri’. Essa paródia mexia com Basora, Parra, Gaínza, Puchades, Panizo, jogadores espanhóis. O que eu acho é que esse papel se espalhou por vários grupos da arquibancada, as pessoas tentaram cantar a paródia. Mas claro que não pegou. O estádio de repente começou a cantar a mesma letra original que todo mundo conhecia.”

Braguinha também estava presente no Maracanã e chorou tanto de emoção, que nem conseguia falar. Muitos torcedores brasileiros não o reconheceram e pensaram se tratar de um torcedor espanhol que chorava de tristeza. Alguns queriam até agredi-lo. Mas era apenas Braguinha, chorando de felicidade ao ver seu trabalho ser eternizado eu um dos momentos mais felizes da história do país.

Touradas em Madri (1938)

Eu fui às touradas em Madri
E quase não volto mais aqui
Pra ver Peri beijar Ceci
Eu conheci uma espanhola
Natural da Catalunha
Queria que eu tocasse castanhola
E pegasse touro à unha
Caramba! Caracoles! Sou do samba
Não me amoles
Pro Brasil eu vou fugir!
Isto é conversa mole para boi dormir!”

● Assim como todos os jogos da Copa de 1950, esse é uma partida da qual se tem poucos registros. Uma verdadeira relíquia (descoberta por Thiago Uberreich, da Jovem Pan) é a a transmissão da Rádio Nacional do Rio de Janeiro. Infelizmente alguns trechos do áudio foram perdidos, mas a maior parte está disponível. Na narração, fica evidente a o envolvimento e a euforia da torcida.

 

FICHA TÉCNICA:

 

BRASIL 6 x 1 ESPANHA

 

Data: 13/07/1974

Horário: 15h00 locais

Estádio: Maracanã

Público: 152.772

Cidade: Rio de Janeiro (Brasil)

Árbitro: Reginald Leafe (Inglaterra)

 

BRASIL (Diagonal):

ESPANHA (WM):

1  Barbosa (G)

1  Antoni Ramallets (G)

2  Augusto (C)

2  Gabriel Alonso

3  Juvenal 

3  José Gonzalvo II

4  Bauer

4  Mariano Gonzalvo III

5  Danilo Alvim

5  José Parra

6  Bigode

6  Antonio Puchades

7  Friaça

7  Estanislau Basora

8  Zizinho

8  Silvestre Igoa

9  Ademir de Menezes

9  Telmo Zarra

10 Jair Rosa Pinto

10 José Luis Panizo

11 Chico

11 Agustín Gaínza (C)

 

Técnico: Flávio Costa

Técnico: Guillermo Eizaguirre

 

SUPLENTES:

 

 

Castilho (G)

Ignacio Eizaguirre (G)

Nena

Juan Acuña (G)

Nilton Santos

Francisco Antúnez

Ely

Vicente Asensi

Rui

Rafael Lesmes II

Noronha

Alfonso Silva

Alfredo II

Nando

Maneca

Luis Molowny

Baltazar

Rosendo Hernández

Adãozinho

José Juncosa

Rodrigues

César

 

GOLS:

15′ Ademir de Menezes (BRA)

21′ Jair Rosa Pinto (BRA)

31′ Chico (BRA)

55′ Chico (BRA)

57′ Ademir de Menezes (BRA)

67′ Zizinho (BRA)

71′ Silvestre Igoa (ESP)

Lances da partida:

Diversas imagens desse jogo:

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