Três pontos sobre…
… 08/07/2014 – Brasil 1 x 7 Alemanha
“Mineiratzen“
(Imagem localizada no Google)
● Em toda edição, a Copa das Confederações consegue enganar muitas seleções, especialmente a equipe campeã. Mas parece uma espécie de “maldição”. Assim aconteceu (de novo) com a Seleção Brasileira, que venceu a competição de 2013 em seus domínios e se preparava para a “vingança do Maracanazzo“. O Brasil tinha sido campeão em todas as competições oficiais que disputou em casa (quatro Copas América e uma Copa das Confederações), com exceção da Copa do Mundo de 1950. Era a hora da turma liderada por Júlio César, Thiago Silva, David Luiz, Daniel Alves, Neymar e Fred ir à forra, se sagrando campeões do mundo em pleno estádio Maracanã. Tudo certinho e planejado. Só faltou combinar com a Alemanha.
Na primeira fase, o Brasil se classificou em primeiro lugar do Grupo A, com sete pontos. Estreou vencendo a Croácia de virada por 3 a 1, empatou sem gols com o México e goleou Camarões por 4 a 1. Empatou com o freguês Chile por 1 a 1 e contou com a vitória por 3 a 2 nas cobranças de pênaltis (além de sorte na prorrogação) para se classificar nas oitavas de final. Nas quartas, venceu a Colômbia por 2 a 1. Mesmo passando tranquilamente de fase, o Brasil não demonstrava o mesmo futebol de um ano antes. Passou um certo sufoco em todas as partidas, exceto contra os fracos camaroneses. O primeiro grande adversário seria a Alemanha.
Líder do Grupo G na fase inicial, a Alemanha goleou Portugal por 4 a 0, empatou com Gana por 2 a 2 e venceu os Estados Unidos por 1 a 0. Nas oitavas de final, enfrentou a Argélia, um adversário duríssimo, que deu muitos sustos aos alemães, mas venceu por 2 a 1 na prorrogação. Nas quartas de final, em outro jogo bastante equilibrado, a Alemanha venceu a França por 1 a 0. Os alemães estavam com seu futebol em plena evolução e precisava se provar justamente contra os anfitriões.
Para a semifinal, a Seleção Canarinho não podia contar com Thiago Silva, seu capitão, que estava suspenso pelo segundo cartão amarelo. Neymar também não tinha condições de jogo, por estar com uma fratura na vértebra, fruto de uma joelhada criminosa do lateral colombiano Camilo Zúñiga. Com o mesmo discurso motivacional que (às vezes) funcionava antigamente, o técnico Luiz Felipe Scolari escolheu Bernard para a vaga de Neymar. Mesmo orientado pelos observadores e pela comissão técnica de que deveria escalar outro jogador de meio campo para dar mais sustentabilidade ao time. Scolari preferiu não dar ouvidos e apostou na “alegria nas pernas” do menino Bernard. Ali o Brasil começou a perder a partida. Na verdade, foi uma sucessão de erros. O lento e péssimo zagueiro Dante entrou na vaga de Thiago Silva.
Na entrada dos times em campo, os brasileiros carregavam a camisa de Neymar, tratando de lembrar a todos que jogaria sem seu único craque. O hino nacional cantado “à capela” por todo estádio voltou a emocionar e a deixar os atletas nervosos e ansiosos.
No histórico preliminar, as seleções principais de Brasil e Alemanha haviam se enfrentado 21 vezes, com doze vitórias para os brasileiros, quatro para os alemães e cinco empates. Em Copas do Mundo, era o segundo duelo. O anterior havia acontecido na final do Mundial de 2002, quando o Brasil venceu por 2 a 0, com dois gols de Ronaldo. O técnico em 2002 também era Luiz Felipe Scolari.
O Brasil atuou no sistema 4-2-3-1. Sem Neymar, Bernard jogou aberto na direita e Hulk “torto” pela esquerda.
A Alemanha jogou no 4-3-3. Com a bola, Lahm avançava e Höwedes recuava, formando um 3-4-3.
● No início da partida, o Brasil tentou mostrar que jogaria de igual para igual. Mas isso durou apenas dez minutos, até a Alemanha descobrir que não teria adversário na partida. Tudo começou com um erro de passe de Marcelo, que na sequência cedeu o escanteio. Toni Kroos cobrou o tiro de canto e encontrou Thomas Müller livre dentro da área, para escorar para as redes e inaugurar o placar em BH. David Luiz, que estava marcando Müller, parou em uma barreira feita por Klose. Foi o gol de nº 2.000 da história da “Nationalmannschaft“.
Aos 23 minutos do primeiro tempo começou uma sequência inacreditável de gols. Em uma troca de passes que começa na direita, Klose tabela com Müller dentro da área e finaliza. Júlio César ainda fez uma grande defesa, mas a bola voltou para o próprio Klose emendar para o fundo do gol. Com esse gol, Miroslav Klose passou a ter 16 gols em Copas do Mundo, se tornando o maior artilheiro da história da competição, superando o brasileiro Ronaldo, que tem 15. Enquanto toda a defesa estava desesperada sem saber o que fazer, o capitão David Luiz ficou na marca do pênalti, apenas olhando a jogada se desenvolver. Mas não percamos as contas: Alemanha, 2 a 0.
Os alemães não menosprezaram os brasileiros e continuaram jogando seu próprio futebol. Os (muitos) gols saíram de forma natural. Aos 25′, Mesut Özil abriu o jogo na direita para Phillip Lahm, que cruzou para o meio. Müller furou, mas Toni Kroos emendou bonito de esquerda, no canto direito do goleiro brasileiro. Alemanha, 3 a 0. As imagens de parte da torcida deixando o Mineirão já dava o tom de dramaticidade, que pioraria (e muito) na sequência.
Logo no reinício de jogo, Dante toca na fogueira para Fernandinho. Toni Kroos rouba a bola dele, avança, tabela com Sami Khedira dentro da área, tirando Júlio César do lance, e finaliza de novo. Alemanha, 4 a 0. Como o Brasil estava saindo para o jogo no momento em que a bola foi roubada de Fernandinho, ficaram apenas Dante e o próprio Fernandinho na defesa, contra os dois meio campistas alemães, que avançaram para marcar a saída de jogo. David Luiz já tinha se mandado para frente. O narrador Galvão Bueno na transmissão da Rede Globo foi taxativo: “Virou passeio!”
E, como disse Galvão Bueno, “lá vem eles de novo”! Três minutos depois, Mats Hummels ganha uma dividida no meio campo. A bola fica com Khedira, que tabela com Özil dentro da área. Khedira ainda teve muito tempo para pensar e bater no canto direito. A bola ainda passou entre as pernas de Maicon. Já era desespero: o goleiro Júlio César estava na linha da pequena área e o lateral esquerdo Marcelo estava dentro do gol. David Luiz nem estava na jogada; já tinha se mandado para o ataque. Alemanha, 5 a 0.
E a Alemanha continuou criando chances. Kroos chutou uma bola que desviou e levou perigo.
No segundo tempo, o Brasil conseguiu criar chances, especialmente com Ramires e Paulinho, que entraram no intervalo, provando que o mais sensato seria que Scolari tivesse entrado com mais um jogador no meio campo, como lhe foi sugerido. E começou a brilhar o “goleiro ciborgue” Manuel Neuer. Ele fez quatro defesas difíceis, mantendo seu gol intacto.
Desde o quinto gol, os alemães tinham “tirado o pé”. Mas o técnico Löw colocou em campo o atacante André Schürrle, tão cruel quanto os nazistas, que assassinou de vez o amor próprio da Seleção Brasileira.
Aos 24 minutos da segunda etapa, Lahm abre na direita para Khedira, que devolve para Lahm já dentro da área. O capitão alemão tocou para a entrada da pequena área e Schürrle chegou batendo rasteiro, fazendo o sexto gol alemão. David Luiz, que estava marcando o camisa 9, afrouxou a marcação e deixou Schürrle livre para finalizar.
Aos 34′, lateral cobrado para Müller na ponta e ele deu um ótimo passe para Schürrle, de novo, avançar (justamente na posição onde deveria estar David Luiz) e encher o pé esquerdo. A bola entrou no ângulo de Júlio César, chegando a bater na trave, só para trazer mais beleza ao gol. Aplausos dos 58.141 expectadores do Mineirão para a apresentação de gala dos alemães.
Pouco depois, Özil teve a chance de fazer o seu, mas sua finalização tirou tinta da trave esquerda.
Já nos acréscimos, veio o único gol brasileiro. Me recuso a chamá-lo de “gol de honra”. Marcelo lança para Oscar. O camisa 11 corta para o meio, tirando o zagueiro Boateng, e chuta na saída de Neuer. Um absurdo é que a Alemanha, mesmo vencendo por 7 a 0, ainda levou um gol no contra-ataque.
● No fim, foram vários recordes quebrados:
— a pior derrota da história da Seleção Brasileira;
— a pior derrota da Seleção em Copas do Mundo, superando a derrota para a França na final de 1998 (3 x 0);
— a partida de Copa em que o Brasil mais sofreu gols;
— a maior goleada em semifinais de Copa, superando outros três duelos que haviam terminado em 6 a 1;
— a maior goleada em um jogo entre campeões mundiais, superando Alemanha 4 x 0 Uruguai de 1966;
— a pior derrota de um anfitrião da Copa;
— nunca antes da história dos Mundiais uma equipe tinha feito cinco gols em 18 minutos, tampouco quatro gols em seis minutos;
— a Alemanha foi a terceira seleção a conseguir marcar cinco gols ou mais em um só tempo. As outras foram Iugoslávia (marcou seis gols no primeiro tempo), na goleada de 9 a 0 sobre o Zaire em 1974, e a Polônia (marcou cinco gols no primeiro tempo), nos 7 a 0 sobre o Haiti, também em 1974;
— Miroslav Klose marcou o 16º gol em Copas do Mundo, se tornando o maior artilheiro da história da competição, superando o brasileiro Ronaldo, que tem 15 gols.
Miroslav Klose, maior goleador de todos os tempos em Copas do Mundo. (Imagem: Globo Esporte)
● A Seleção Brasileira era muito frágil emocionalmente. O ídolo alemão Lothar Matthäus resumiu bem, em entrevista ao jornal francês “Le Journal du Dimanche“, no dia 12 de julho de 2014:
“Não entendo por que um jogador de futebol chora. Brasileiros sempre choram. Toca o hino, choram; eliminam o Chile, choram; perdem para a Alemanha, choram. Eles têm de mostrar que são fortes. Nunca vi nada tão nefasto como a linguagem corporal dessa equipe.”
Foi uma vitória da humildade. No decorrer do torneio, o técnico Joachim Löw abriu mão de seus conceitos, voltando o capitão Phillip Lahm do meio campo para a lateral direita, sua posição de origem. Também deixou de lado o “falso nove” e escalou um centroavante verdadeiro, Miroslav Klose. Já Felipão nunca desceu e nem descerá do salto. Preferiu morrer com suas convicções em vez de dar ouvidos às orientações da comissão técnica e da imprensa.
Foi a premiação de um trabalho iniciado a mais de uma década pela federação alemã. A Alemanha era uma equipe muito bem treinada por Joachim Löw e tinha jogadores de destaque e talento em todas as posições. A Alemanha jogou como o Brasil de seus melhores tempos e o Brasil jogou como meninos de cinco anos.
Do meio para a frente, o Brasil não apareceu em momento algum. Oscar, a maior esperança brasileira sem Neymar, foi omisso o jogo todo. Marcou o gol, é verdade, mas foi omisso. Hulk não fez nada, como na Copa toda. Bernard não deveria estar em campo e não sabia nem o que estava fazendo. E Fred… ficou imóvel, no meio dos dois zagueiros alemães. Um time medíocre, sem alma e sem nenhuma organização tática. Realmente contou com a sorte para chegar nas semifinais.
Para completar a vergonha, o Brasil perdeu para a Holanda por 3 x 0 na decisão do 3º lugar.
Na final contra a forte Argentina de Lionel Messi e cia., a Alemanha venceu com um gol de Mario Götze aos oito minutos do segundo tempo da prorrogação. Nada mais justo: Alemanha, tetracampeã da Copa do Mundo!
Thomas Müller abre o placar no Mineirão. (Imagem: Folha)
● FICHA TÉCNICA: |
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BRASIL 1 x 7 ALEMANHA |
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Data: 08/07/2014 Horário: 17h00 locais Estádio: Mineirão Público: 58.141 Cidade: Belo Horizonte (Brasil) Árbitro: Marco Rodríguez (México) |
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BRASIL (4-2-3-1): |
ALEMANHA (4-3-3): |
12 Júlio César (G) |
1 Manuel Neuer (G) |
23 Maicon |
16 Phillip Lahm (C) |
4 David Luiz (C) |
20 Jérôme Boateng |
13 Dante |
5 Mats Hummels |
6 Marcelo |
4 Benedikt Höwedes |
17 Luiz Gustavo |
6 Sami Khedira |
5 Fernandinho |
7 Bastian Schweinsteiger |
7 Hulk |
18 Toni Kroos |
11 Oscar |
8 Mesut Özil |
20 Bernard |
13 Thomas Müller |
9 Fred |
11 Miroslav Klose |
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Técnico: Luiz Felipe Scolari |
Técnico: Joachim Löw |
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SUPLENTES: |
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1 Jefferson (G) |
22 Roman Weidenfeller (G) |
22 Victor (G) |
12 Ron-Robert Zieler (G) |
2 Daniel Alves |
3 Matthias Ginter |
3 Thiago Silva |
17 Per Mertesacker |
15 Henrique |
21 Shkodran Mustafi |
14 Maxwell |
15 Erik Durm |
8 Paulinho |
2 Kevin Großkreutz |
18 Hernanes |
23 Christoph Kramer |
16 Ramires |
14 Julian Draxler |
19 Willian |
19 Mario Götze |
10 Neymar |
9 André Schürrle |
21 Jô |
10 Łukas Podolski |
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GOLS: |
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11′ Thomas Müller (ALE) |
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23′ Miroslav Klose (ALE) |
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25′ Toni Kroos (ALE) |
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26′ Toni Kroos (ALE) |
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29′ Sami Khedira (ALE) |
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69′ André Schürrle (ALE) |
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79′ André Schürrle (ALE) |
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90+1′ Oscar (BRA) |
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CARTÃO AMARELO: 68′ Dante (BRA) |
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SUBSTITUIÇÕES: |
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INTERVALO Hulk (BRA) ↓ |
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Ramires (BRA) ↑ |
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INTERVALO Fernandinho (BRA) ↓ |
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Paulinho (BRA) ↑ |
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INTERVALO Mats Hummels (ALE)↓ |
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Per Mertesacker (ALE) ↑ |
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58′ Miroslav Klose (ALE) ↓ |
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André Schürrle (ALE) ↑ |
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69′ Fred (BRA) ↓ |
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Willian (BRA) ↑ |
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77′ Sami Khedira (ALE) ↓ |
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Julian Draxler (ALE) ↑ |
Melhores (ou piores?) momentos da partida:
Jogadores brasileiros participaram do protocolo inicial da partida segurando uma camiseta de Neymar. Seria uma homenagem ao craque, mas, na verdade, apenas lembrou ao mundo que o Brasil tinha perdido grande parte de sua criatividade e poder ofensivo sem o camisa 10. (Imagem: Jefferson Bernardes/ Vipcomm)
P.S.: Sou um grande admirador do futebol de David Luiz. Reconheço todas as qualidades técnicas, táticas e físicas de seu futebol. Se a Seleção Brasileira é um prêmio para os melhores jogadores em melhor fase, eu defendo sua convocação atualmente.
Não digo que ele tenha falhado nos sete gols alemães. Mas, quem entende o mínimo de futebol, percebe que em todos os gols sofridos, David Luiz poderia ter feito melhor do que fez.
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