Três pontos sobre…
… 15/07/1930 – Argentina 1 x 0 França
Protocolos iniciais da parida. (Imagem: Wikimedia Commons)
● Era o terceiro dia de competições. Enquanto a Argentina fazia sua estreia na Copa do Mundo de 1930, a França já realizaria sua segunda partida, após golear o México por 4 x 1 no primeiro jogo, disputado dois dias antes.
O Grupo 1 era o único que contava com quatro seleções (França, México, Argentina e Chile) e o calendário foi cruel com a seleção francesa, fazendo-a entrar em campo por duas vezes antes de várias equipes terem estreado.
Nos anos 1930, todas as equipes atuavam no ofensivo sistema “clássico” ou “pirâmide”, o 2-3-5.
● Os franceses sofreram com o jogo duro dos argentinos. Logo aos dois minutos, o ótimo e violento centromédio Luisito Monti mostrou seu “cartão de visitas”. Ele deu uma entrada duríssima no autor do primeiro gol em Copas, Lucien Laurent. O francês ficou mancando em campo até o fim da partida, apenas fazendo número.
O goleiro Alexis Thépot (que já tinha se machucado e saído de campo na partida contra os mexicanos) também foi agredido aos 23 minutos. Mas mesmo assim ele fechou o gol. Só foi vencido em uma cobrança de falta de Monti, aos 36 minutos do segundo tempo.
A França mal teve tempo para reagir. O árbitro brasileiro Gilberto de Almeida Rêgo encerrou o jogo por engano apenas três minutos depois, ou seja, faltando seis minutos a serem jogados e ainda no meio de um contra-ataque francês. Evidentemente, isso resultou em protestos exaltados dos europeus.
O detalhe é que a culpa da trapalhada no tempo de jogo não foi do árbitro. Na época, o controle do tempo cabia a um cronometrista oficial, que ficava do lado de fora do campo. O erro foi percebido logo depois, mas os torcedores já haviam invadido o gramado.
Alguns jogadores até já haviam tomado banho quando, meia hora depois, com o apoio do bandeirinha romeno Costel Rădulescu e o testemunho do próprio cronometrista, os franceses convenceram o juiz brasileiro a reiniciar a partida para disputarem os minutos finais do tempo regulamentar. Mesmo com pressão francesa, não houve mais alteração no placar.
“Voltamos para o vestiário e só aí o juiz descobriu que apitou o fim do jogo 5 minutos antes da hora. Alguns jogadores já estavam se trocando quando tivemos que voltar para o campo. Ainda tive uma chance de empatar. A bola passou perto da trave. Não tivemos sorte naquele dia” – disse posteriormente o meia direita francês Edmond Delfour.
Gol argentino retratado pelo site Moviolagol (http://moviolagol.deviantart.com/)
● Não era de se esperar que os mais de vinte mil uruguaios presentes no estádio Parque Central tivessem carinho com os argentinos. Mas a torcida uruguaia provocou demais os arqui-inimigos durante todo o jogo. Tanto, que o atacante Roberto Cherro, do Boca Juniors, teve uma violenta crise emocional. Levado para o vestiário, ele desmaiou e nem voltou para disputar o final da partida.
Na saída, 500 vândalos apedrejaram o ônibus da Argentina, em um tumulto que só foi controlado pela polícia quase uma hora depois. Os portenhos ameaçaram a abandonar a competição, mas foram convencidos a continuarem devido a insistentes pedidos dos organizadores e do presidente uruguaio, Juan Campisteguy, além de garantias de segurança a todos.
O francês Delfour disse que o jogo quase acabou em briga:
“O estádio estava cheio, com todo mundo torcendo pela França, gritando ‘Francia, Francia’. O jogo estava 0 a 0. Faltando 10 minutos, uma bola caiu na entrada da área, matei ela no peito e Luis Monti veio para cima de mim. Mas o juiz deu falta contra a França. Na cobrança a Argentina fez o gol da vitória. Depois ainda houve um princípio de confusão, porque Monti também tinha agredido Laurent e Maschinot.”
Lucien Laurent também deu sua versão:
“Eu me lembro de Monti, o central da Argentina. Diziam que ele era durão, que tínhamos que provocá-lo, mas acho que era exatamente isso que ele queria que nós fizéssemos.”
A França acabou em 7º dentre as 13 seleções. Venceu os mexicanos (4 a 1), mas perdeu para argentinos e chilenos (ambos por 1 a 0).
O meia esquerda argentino Manuel Ferreira tinha muita moral na sua seleção, inclusive sendo o capitão do time. Por isso, desfrutou de um privilégio durante a Copa. Ele chegou a Montevidéu alguns dias depois do resto da delegação porque estava fazendo um curso de escrivão público. Após essa partida contra a França, ele não jogou contra o México porque teve que voltar a Buenos Aires para fazer uma prova. Foi aprovado e retornou normalmente para a seleção portenha logo depois.
Como curiosidade, em Copas do Mundo, a Argentina de 1930 foi a primeira seleção a ter dois técnicos em vez de apenas um: Francisco Olazar e Juan José Tramutola.
(Imagem localizada no Google)
● FICHA TÉCNICA: |
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ARGENTINA 1 x 0 FRANÇA |
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Data: 15/07/1930 Horário: 16h00 locais Estádio: Parque Central Público: 23.409 Cidade: Montevidéu (Uruguai) Árbitro: Gilberto de Almeida Rêgo (Brasil) |
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ARGENTINA (2-3-5): |
FRANÇA (2-3-5): |
Ángel Bossio (G) |
Alexis Thépot (G) |
José Della Torre |
Marcel Capelle |
Ramón Muttis |
Étienne Mattler |
Juan Evaristo |
Alexandre Villaplane (C) |
Luis Monti |
Marcel Pinel |
Pedro Suárez |
Augustin Chantrel |
Natalio Perinetti |
Ernest Libérati |
Francisco Varallo |
Edmond Delfour |
Roberto Cherro |
André Maschinot |
Manuel Ferreira (C) |
Lucien Laurent |
Mario Evaristo |
Marcel Langiller |
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Técnicos: Francisco Olazar / Juan José Tramutola |
Técnico: Raoul Caudron |
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SUPLENTES: |
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Juan Botasso (G) |
André Tassin (G) |
Alberto Chividini |
Numa Andoire |
Fernando Paternoster |
Célestin Delmer |
Rodolfo Orlandini |
Jean Laurent |
Edmundo Piaggio |
Émile Veinante |
Adolfo Zumelzú |
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Carlos Spadaro |
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Carlos Peucelle |
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Guillermo Stábile |
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Attilio Demaría |
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Alejandro Scopelli |
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GOL: 81′ Luis Monti (ARG) |
O capitão Manuel Ferreira, seguido pelo goleiro Ángel Bossio, na entrada dos atletas argentinos no gramado para enfrentarem a França
(Imagem: Bob Thomas / Popperfoto / Getty Images / FIFA)
Imagens diversas sobre a partida:
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