Três pontos sobre…
… 30/06/2002 – Brasil 2 x 0 Alemanha
Capitão Cafu levanta a Taça FIFA e celebra o amor (Imagem: FolhaPress)
● Com quatro técnicos em pouco mais de três anos, a Seleção Brasileira teve dificuldades durante toda a fase eliminatória, a mais sofrida da história. Mas atingiu o sucesso.
O Mundial de 2002 ficou comprovadamente marcado como o mais imprevisível de todos. Mas depois de tantas zebras e erros grosseiros da arbitragem, a decisão foi entre as duas maiores potências do futebol mundial: Brasil e Alemanha. Curiosamente, elas nunca haviam se enfrentado em uma partida de Copa do Mundo, embora concentrassem a maior quantidade de títulos (quatro para os brasileiros e três para os alemães), o maior número de finais (seis para cada lado) e até jogos na história da competição (86 para o Brasil e 84 para a Alemanha). Se o Brasil vencesse, se tornaria o único pentacampeão mundial. Se a Alemanha ganhasse, igualaria o tetra brasileiro; se perdesse, seria “tetra-vice”. O Brasil estava na decisão pela terceira vez consecutiva, feito somente alcançado pela própria Alemanha entre 1982 e 1990.
Ambas seleções chegavam invictas na final. O Brasil venceu todas as partidas anteriores: Turquia (2 x 1), China (4 x 0) e Costa Rica (5 x 2) na primeira fase, Bélgica (2 x 0) nas oitavas de final, Inglaterra (2 x 1) nas quartas de final e novamente a Turquia (1 x 0) nas semifinais. Já a Alemanha, com uma equipe limitada, sofreu um pouquinho mais. Na primeira fase, estraçalhou a Arábia Saudita (8 x 0), empatou com a Irlanda (1 x 1) e bateu Camarões (2 x 0). Nas fases de mata-mata, a segurança defensiva e o placar de 1 a 0 a favor sobressaiu em todos os jogos: Paraguai (nas oitavas), Estados Unidos (nas quartas) e Coreia do Sul (nas semi).
Até a pouco tempo, a FIFA tinha o hábito de eleger o melhor jogador da Copa antes da final. Em 2002, o escolhido excepcional goleiro alemão Oliver Kahn, imprescindível para levar sua equipe à decisão. Mas Kahn, presunçoso como sempre, provocou: “Para ser campeão, o time deles terá que fazer gol em mim primeiro”.
Mas o favoritismo brasileiro ia muito além do nível de futebol apresentado. Enquanto Ronaldinho Gaúcho voltava de suspensão e o Brasil jogaria com seu time principal, a Alemanha estava desfalcada do seu melhor jogador de linha: Michael Ballack, suspenso pelo segundo cartão amarelo recebido na semifinal.
Felipão apostou no sistema 3-5-2, para liberar o avanço dos laterais. A seleção ficou mais sólida na defesa e continuou forte no ataque. Ronaldinho Gaúcho e Rivaldo se revezavam na criação e no ataque.
A Alemanha também atuava no 3-5-2, porém mais rígido que o esquema do Brasil.
● Diante de 69.029 expectadores no estádio de Yokohama, a Seleção Brasileira mostrou sua força, mesmo contra os disciplinados e fortes alemães. Ambos fizeram um duelo digno da grandeza dos dois países. As equipes se respeitavam e marcavam muito forte. Nos primeiros minutos, o Brasil tinha muitas dificuldades na criação. Mas aos poucos a Seleção foi se soltando.
O primeiro tempo de jogo cumpriu o que era esperado. O Brasil foi para cima e o goleiro Kahn foi se tornando a figura do jogo, ao impedir que Ronaldo abrisse o placar. Contou também com a sorte em um chute de Kléberson no travessão.
Na segunda etapa, a Alemanha voltou melhor e quase abriu o placar. Oliver Neuville cobrou uma falta de longe, com muita força, mas Marcos fez uma linda defesa no canto esquerdo.
O placar foi inaugurado aos 22 minutos do segundo tempo por mérito de Ronaldo (e também dos treinos do técnico Felipão). Após perder a bola no ataque para Hamann, o “Fenômeno” pressionou e a tomou do volante alemão, rolando para Rivaldo antes da chegada de Metzelder. O mágico camisa 10 brasileiro chutou com efeito de fora da área, Oliver Kahn não conseguiu segurar e Ronaldo tocou para dentro. O erro nesse lance não diminui o mérito do alemão na competição, mas o pune pela declaração infeliz na véspera. Posteriormente soube-se que o alemão jogou com uma torção no ligamento do dedo anelar da mão direita, o que pode ter sido fatal para ele não ter segurado o chute de Rivaldo.
Sem outra saída, a Alemanha partiu com tudo para o ataque em busca do empate. E o Brasil, com inteligência, passou a jogar no contra-ataque.
No minuto 34, veio o golpe definitivo. Kléberson arrancou em velocidade pela direita e rolou para a meia lua. Rivaldo fez um lindo corta-luz e Ronaldo finalizou no canto esquerdo do goleiro.
Com 56%, a Alemanha até tinha mais posse de bola e tentou mostrar sua força, mas “São” Marcos defendeu uma boa finalização do veterano Oliver Bierhoff.
Estava garantido o pentacampeonato brasileiro, com a melhor campanha da história: sete vitórias em sete jogos, um índice jamais alcançado em Mundiais.
Ronaldo marca seu segundo gol na partida (Imagem localizada no Google)
● Após a final e a falha de Oliver Kahn no primeiro gol, ficou a sensação que o prêmio de melhor jogador da Copa poderia ter sido dado a outro jogador. Ronaldo, decisivo com seus dois gols, era o mais indicado. Na opinião do técnico Luiz Felipe Scolari (e também deste que vos escreve), Rivaldo foi o craque da Copa, pois foi de seus pés que saíram as melhores jogadas da seleção no torneio, tanto armando quanto finalizando – com destaque especial para os gols contra Bélgica e Inglaterra.
Rivaldo vinha de uma temporada com muitas lesões, jogando pouco no Barcelona. Mas o técnico Scolari apostou em sua recuperação e no poder de um ataque com ele e Ronaldo.
Mas o destaque foi mesmo a ressurreição do “Fenômeno“, que ainda tinha viva na memória a convulsão que mexeu com o emocional de toda a equipe na decisão de 1998. E também a volta por cima depois de praticamente dois anos de inatividade do futebol, depois de um rompimento total do tendão patelar e duas cirurgias delicadíssimas. Para uma pessoa comum, seria o fim. Para Ronaldo, era a chance de um recomeço. E, com os dois gols na final, ele se tornou o artilheiro do Mundial com oito gols (primeiro goleador a passar dos seis gols desde 1974).
Falando de Ronaldo, ele apresentou um estranho corte de cabelo nas duas últimas partidas do Mundial. Logo ganhou o apelido de “corte Cascão“, em referência ao personagem de Maurício de Sousa. No começo, o centroavante disse que tinha apanhado a máquina e cortado desse jeito apenas para brincar um pouco. Tempos depois, Ronaldo confidenciou que havia tomado a decisão por outro motivo. Ele soube que seu filho, Ronald (então com dois anos), estava vendo a partida entre Brasil e Inglaterra e, sempre que via Roberto Carlos (também careca) na TV, ele dizia “Papai, papai”. Então, o camisa 9 decidiu ficar “um pouco diferente” para que a criança não o confundisse mais. E esse corte de cabelo virou febre no Brasil e no mundo na época, a ponto de diversas pessoas cortarem o cabelo nesse estilo “Cascão” (inclusive este que vos escreve…).
Esse título também foi o auge do técnico gaúcho Luiz Felipe Scolari, que mostrou novamente seu futebol de resultados e títulos. No comando da seleção desde junho de 2001, Felipão chegou com a missão de classificar o Brasil, ameaçado de ficar fora de uma Copa pela primeira vez. Formou a “Família Scolari” e deixou Romário de fora do grupo, apesar dos apelos da torcida, da mídia e do próprio “Baixinho“.
Curiosamente, Cafu nasceu em um dia histórico para o futebol brasileiro: 07/06/1970, quando o Brasil venceu a Inglaterra por 1 x 0 na Copa de 1970. Diz a lenda que um parente seu teria dito, de forma profética: “Vamos nascer logo essa criança, para que ela assista ao jogo. Esse aqui vai ser um campeão”. E Cafu repetiu o gesto de Bellini, Mauro, Carlos Alberto Torres e Dunga, mas foi além. Ao levantar a Taça FIFA, o capitão (e único jogador a disputar três finais de Copas do Mundo), improvisou um pedestal. Em sua camisa, uma homenagem ao bairro paulistano onde se criou: “100% Jardim Irene”. E também celebrou o amor, ao gritar para um bilhão de pessoas ao redor do mundo: “Regina, eu te amo!”
Chico Xavier, o mais famoso médium da história do país dizia que queria morrer em um dia em que o país estivesse em festa. Cerca de 9 horas depois que o Brasil se sagrou pentacampeão, ele faleceu na cidade mineira de Uberaba, aos 92 anos.
O “Fenômeno” comemora um de seus gols (Imagem: Globo Esporte)
● FICHA TÉCNICA: |
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BRASIL 2 x 0 ALEMANHA |
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Data: 30/06/2002 Horário: 20h00 locais Estádio: International Stadium Yokohama (atual Nissan Stadium) Público: 69.029 Cidade: Yokohama (Japão) Árbitro: Pierluigi Collina (Itália) |
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BRASIL (3-5-2): |
ALEMANHA (3-5-2): |
1 Marcos (G) |
1 Oliver Kahn (G)(C) |
3 Lúcio |
2 Thomas Linke |
5 Edmílson |
5 Carsten Ramelow |
4 Roque Júnior |
21 Christoph Metzelder |
2 Cafu (C) |
22 Torsten Frings |
8 Gilberto Silva |
8 Dietmar Hamann |
15 Kléberson |
16 Jens Jeremies |
6 Roberto Carlos |
19 Bernd Schneider |
11 Ronaldinho Gaúcho |
17 Marco Bode |
10 Rivaldo |
7 Oliver Neuville |
9 Ronaldo |
11 Miroslav Klose |
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Técnico: Luiz Felipe Scolari |
Técnico: Rudi Völler |
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SUPLENTES: |
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12 Dida (G) |
12 Jens Lehmann (G) |
22 Rogério Ceni (G) |
23 Hans-Jörg Butt (G) |
13 Belletti |
3 Marko Rehmer |
14 Ânderson Polga |
4 Frank Baumann |
16 Júnior |
15 Sebastian Kehl |
18 Vampeta |
6 Christian Ziege |
7 Ricardinho |
18 Jörg Böhme |
19 Juninho Paulista |
13 Michael Ballack |
23 Kaká |
10 Lars Ricken |
17 Denílson |
14 Gerald Asamoah |
20 Edílson |
9 Carsten Jancker |
21 Luizão |
20 Oliver Bierhoff |
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GOLS: |
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67′ Ronaldo (BRA) |
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79′ Ronaldo (BRA) |
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CARTÕES AMARELOS: |
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6′ Roque Júnior (BRA) |
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9′ Miroslav Klose (ALE) |
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SUBSTITUIÇÕES: |
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74′ Miroslav Klose (ALE) ↓ |
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Oliver Bierhoff (ALE) ↑ |
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77′ Jens Jeremies (ALE) ↓ |
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Gerald Asamoah (ALE) ↑ |
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84′ Marco Bode (ALE) ↓ |
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Christian Ziege (ALE) ↑ |
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85′ Ronaldinho Gaúcho (BRA) ↓ |
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Juninho Paulista (BRA) ↑ |
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90′ Ronaldo (BRA) ↓ |
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Denílson (BRA) ↑ |
Rivaldo foi um dos grandes destaques do Mundial (Imagem: Antonio Scorza / AFP)
Melhores momentos da partida, com narração em português:
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