Três pontos sobre…
… 31/05/1934 – Itália 1 x 1 Espanha
“A Batalha de Florença”
(Imagem: Soccer Nostalgia)
● No jogo inaugural da segunda Copa do Mundo de futebol, a Itália havia massacrado os Estados Unidos com impiedosos 7 x 1. Enquanto isso, a Espanha venceu o Brasil com tranquilidade, por 3 x 1. Quis o sorteio feito quatro meses antes que as duas favoritas se encontrassem já nas quartas de final.
Era a partida mais aguardada do campeonato até então. Talvez uma final antecipada. Mas o cenário não era dos mais favoráveis aos espanhóis, já que os italianos jogavam diante de sua torcida e sob o olhar atento do ditador Benito Mussolini, “Il Duce”. Eram mais de 35 mil expectadores ansiosos para ver a vitória do regime fascista sobre qualquer que fosse o adversário. Mas o que assistiram foi mais uma guerra do que um jogo de futebol.
A Itália jogava em uma adaptação do sistema 2-3-5 chamada “Metodo”, que consistia no ligeiro recuo de dois atacantes, deixando o ataque em uma espécia de “W”, com dois meia-atacantes, dois pontas bem abertos e um centroavante.
Nos anos 1930, praticamente todas as equipes atuavam no ofensivo sistema “clássico” ou “pirâmide”, o 2-3-5.
● Segundo Paulo Vinícius Coelho, autor do livro “Os 55 maiores jogos das Copas do Mundo” (2010), “em vez de súmula, o clássico Itália e Espanha poderia ter um boletim de ocorrência, com os nomes das vítimas”.
Em um duelo muito equilibrado, os espanhóis foram superiores técnica e psicologicamente, não dando ouvidos às arquibancadas do estádio Giovanni Berta, que entoavam o slogan fascista “Vitória ou morte”.
A Fúria abriu o placar aos 30 minutos de jogo, com o atacante Luis Regueiro.
Amedrontado, o árbitro belga Louis Baert não teve coragem de expulsar nenhum italiano – apesar muitos merecerem. Especialmente o ótimo centromédio Luisito Monti, que não se furtou a utilizar os mais baixos artifícios e abriu sua “caixa de ferramentas”.
Além disso, o gol italiano foi irregular: o atacante Angelo Schiavio tirou o goleiro espanhol Zamora do lance com uma cotovelada, enquanto a bola ficava livre para Giovanni Ferrari marcar o tento que igualou o placar, a um minuto do intervalo. O juiz fez vista grossa. Esse foi o primeiro e indiscutível grande roubo na história das Copas. Mas a Itália de Mussolini tinha que vencer a qualquer preço.
Na etapa final, a Itália distribuiu pancadas e a Espanha se segurou na defesa, graças ao machucado Zamora e à dupla de zaga Ciriaco e Quincoces (todos do Real Madrid).
Seleção italiana na primeira partida contra a Espanha na Copa do Mundo de 1934 (Imagem: La Nazionale Italiana, 1978 / Soccer Nostalgia)
Em pé: Combi, Monti, Guaita, Schiavio, Allemandi, Ferrari e Castellazzi;
Agachados: Pizziolo, Monzeglio, Meazza e Orsi.
Seleção espanhola na primeira partida contra a Itália na Copa do Mundo de 1934 (Imagem: Todo Sobre La Selección Española, 2006 / Soccer Nostalgia)
Em pé: Iraragorri, Ramón “Moncho” Encinas (assistente técnico), Quincoces, Zamora, Cilaurren, Fede, Lafuente e Regueiro;
Agachados: Ciriaco, Gorostiza e Muguerza.
● Já veterano, o lendário capitão Ricardo “El Divino” Zamora era considerado o melhor goleiro do mundo na época. Ainda hoje ele dá nome à premiação do goleiro menos vazado em cada edição do Campeonato Espanhol. A história conta que ele defendeu cinco bolas praticamente dentro do gol, impedindo a vitória italiana contra os bravos espanhóis.
O placar de 1 x 1 permaneceu no tempo normal. Na prorrogação, o máximo que as equipes conseguiram foi uma bola na trave para cada lado, obrigando a disputa de um jogo extra.
(Imagem: Pinterest)
● FICHA TÉCNICA: |
|
|
|
ITÁLIA 1 X 1 ESPANHA |
|
|
|
Data: 31/05/1934 Horário: 16h30 locais Estádio: Giovanni Berta Público: 35.000 Cidade: Florença (Itália) Árbitro: Louis Baert (Bélgica) |
|
|
|
ITÁLIA (2-3-5): |
ESPANHA (2-3-5): |
Giampiero Combi (G)(C) |
Ricardo Zamora (G)(C) |
Eraldo Monzeglio |
Ciriaco Errasti |
Luigi Allemandi |
Jacinto Quincoces |
Mario Pizziolo |
Leonardo Cilaurren |
Luis Monti |
José Muguerza |
Armando Castellazzi |
Fede |
Enrique Guaita |
Ramón de Lafuente |
Giuseppe Meazza |
José “Chato” Iraragorri |
Angelo Schiavio |
Isidro Lángara |
Giovanni Ferrari |
Luis Regueiro |
Raimundo Orsi |
Guillermo Gorostiza |
|
|
Técnico: Vittorio Pozzo |
Técnico: Amadeo García Salazar |
|
|
SUPLENTES: |
|
|
|
Guido Masetti (G) |
Juan José Nogués (G) |
Giuseppe Cavanna (G) |
Ramón Zabalo |
Umberto Caligaris |
Hilario |
Virginio Rosetta |
Pedro Solé |
Luigi Bertolini |
Luis Martín |
Attilio Ferraris IV |
Martín Marculeta |
Mario Varglien I |
Chacho |
Pietro Arcari |
Campanal |
Felice Borel II |
Crisanto Bosch |
Anfilogino Guarisi |
Martí Ventolrà |
Attilio Demaría |
Simón Lecue |
|
|
GOLS: |
|
30′ Luis Regueiro (ESP) |
|
44′ Giovanni Ferrari (ITA) |
… 01/06/1934 – Itália 1 x 0 Espanha (Partida de Desempate)
(Imagem: Guerin Sportivo I Mondiali del 1934 / Soccer Nostalgia)
● A partida de desempate, marcada para apenas 24 horas depois, no mesmo estádio, começou com o resultado decidido. Era mera formalidade.
Desgastados pela partida anterior, os dois times estavam bem modificados. A Itália vinha com quatro alterações. A Espanha teve sete atletas “feridos”, já que em guerras não há lesionados (como disse Edgardo Martolio no livro “Glória Roubada”): Ciriaco, Fede, Lafuente, Iraragorri, Gorostiza, Lángara e Zamora, o mais machucado deles, com duas costelas fraturadas após uma didivida na qual o juiz belga nem falta marcou.
Agora havia um outro árbitro em campo, mas Mussolini continuava mandando no apito. Se não fosse capaz de vencer na bola, a “Azzurra” teria toda a ajuda “externa” possível.
A Itália teve quatro alterações em relação ao jogo anterior, mas permaneciam com as peças chave para seu estilo de jogo, especialmente o meia-atacante Giuseppe Meazza e os pontas Enrique Guaita e “Mumo” Orsi.
A seleção espanhola foi obrigada a fazer sete alterações em relação aos atletas que atuaram um dia antes. O sistema tático permaneceu o mesmo, o 2-3-5.
● Quem definiu o resultado foi o juiz suíço René Mercet. Ele deixou a pancadaria rolar solta. Ainda na primeira etapa, o ponta espanhol Crisanto Bosch foi violentamente atingido por Luisito Monti. Como as substituições não eram permitidas na época, ele permaneceu em campo apenas para fazer número.
O substituto de Zamora, Juan José Nogués, que jogava no Barcelona, era um goleiro valoroso, mas não imbatível como o titular. Ele não comprometeu, já que o gol de Giuseppe Meazza, marcado aos 11 minutos do primeiro tempo, foi indefensável. Enquanto Meazza marcava o gol, o argentino Demaría segurava Nogués, impedindo que ele pudesse ir na bola. Era uma artimanha muito utilizada pelos italianos, que não era coibida pela arbitragem.
O árbitro suíço, além de validar o gol irregular do italiano, ainda anulou dois tentos legítimos dos espanhóis no segundo tempo: um de Campanal, após marcar impedimento de Regueiro, que não estava no lance, e outro do próprio Regueiro, depois de ter voltado atrás em uma vantagem e apitado falta para a Espanha depois que a bola já estava nas redes. Dessa vez o roubo foi tão evidente que a FIFA e a federação suíça expulsaram o juiz de seus quadros. Mas nada modificaria a vitória italiana.
Apesar da derrota, os espanhóis foram recebidos como heróis em seu país. A população considerou que seus atletas foram bravos e valentes, enquanto os italianos venceram graças a um jogo sujo. Houve, inclusive, quem contribuísse para que os jogadores recebessem uma medalha de ouro e uma premiação em dinheiro como reconhecimento pelo bela competição que fizeram.
Seleção italiana na partida desempate contra a Espanha na Copa do Mundo de 1934 (Imagem: La Nazionale Italiana, 1978 / Soccer Nostalgia)
Em pé: Vittorio Pozzo (técnico), Combi, Ferraris IV, Allemandi, Monti, Guaita e Carlo Carcano (assistente técnico);
Agachados: Bertolini, Orsi, Monzeglio, Meazza, Borel II e Demaría.
Seleção espanhola na partida desempate contra a Itália na Copa do Mundo de 1934 (Imagem: Todo Sobre La Selección Española, 2006 / Soccer Nostalgia)
Em pé: Campanal, Vantoira, Nogués, Bosch, Zabalo, Muguerza, Chacho, Lecue, Cilaurren;
Agachados: Regueiro e Quincoces.
● Em 1934, a Itália se tornou a única seleção que disputou três jogos de Copa do Mundo em apenas quatro dias. Em 31/05/1934, empatou com a Espanha por 1 x 1. No dia seguinte, venceu o jogo desempate por 1 x 0. No dia 03/06, venceu a Áustria por 1 x 0 na semifinal – quando a arbitragem voltou a favorecer o time local.
Na decisão, outra vitória bastante controversa contra a Tchecoslováquia, de virada, por 2 x 1.
Benito Mussolini levou sua Itália fascista ao título da segunda Copa do Mundo. Festa para os “tifosi” (torcedores) e para “Il Duce”.
Todos temiam ao “Duce”. Após o título, o técnico Vittorio Pozzo fez uma declaração cheia de apologias ao regime fascista, ao comentar sobre os adversários:
“A partida mais difícil de todas foi contra a Espanha. Precisamos passar por 210 minutos de jogo para vencer. Nenhum outro time nos exigiu tanto. Com tal valor se comportaram os espanhóis naquelas duas partidas em Florença, que foram necessários homens de têmpera especial para batê-los, homens fortes e confiantes como só o fascismo pode criar.”
(Imagem: Guerin Sportivo I Mondiali del 1934 / Soccer Nostalgia)
● FICHA TÉCNICA: |
|
|
|
ITÁLIA 1 X 0 ESPANHA |
|
|
|
Data: 01/06/1934 Horário: 16h30 locais Estádio: Giovanni Berta Público: 43.000 Cidade: Florença (Itália) Árbitro: René Mercet (Suíça) |
|
|
|
ITÁLIA (2-3-5): |
ESPANHA (2-3-5): |
Giampiero Combi (G)(C) |
Juan José Nogués (G) |
Eraldo Monzeglio |
Ramón Zabalo |
Luigi Allemandi |
Jacinto Quincoces (C) |
Attilio Ferraris IV |
Leonardo Cilaurren |
Luis Monti |
José Muguerza |
Luigi Bertolini |
Simón Lecue |
Enrique Guaita |
Martí Ventolrà |
Giuseppe Meazza |
Luis Regueiro |
Felice Borel II |
Campanal |
Attilio Demaría |
Chacho |
Raimundo Orsi |
Crisanto Bosch |
|
|
Técnico: Vittorio Pozzo |
Técnico: Amadeo García Salazar |
|
|
SUPLENTES: |
|
|
|
Guido Masetti (G) |
Ricardo Zamora (G) |
Giuseppe Cavanna (G) |
Ciriaco Errasti |
Umberto Caligaris |
Hilario |
Virginio Rosetta |
Pedro Solé |
Armando Castellazzi |
Luis Martín |
Mario Pizziolo |
Martín Marculeta |
Mario Varglien I |
Fede |
Pietro Arcari |
Isidro Lángara |
Angelo Schiavio |
Guillermo Gorostiza |
Anfilogino Guarisi |
Ramón de Lafuente |
Giovanni Ferrari |
José “Chato” Iraragorri |
|
|
GOL: 11′ Giuseppe Meazza (ITA) |
Resumo rápido da partida:
Algumas imagens da partida:
Eu gosto da informação valiosa que você fornece em seus artigos. Vou marcar seu blog e verificar novamente aqui regularmente. Boa sorte para a próxima!
Pingback: ... 27/05/1934 - Espanha 3 x 1 Brasil - Três Pontos