… Domingos da Guia: o “Divino Mestre”

Três pontos sobre…
… Domingos da Guia: o “Divino Mestre”


(Imagem localizada no Google)

● Domingos Antônio da Guia veio ao mundo em 19/11/1912 (algumas fontes citam que seu ano de nascimento é 1911), na então capital federal, Rio de Janeiro. Nascido e criado próximo da igreja de São Sebastião e Santa Cecília, no bairro de Bangu. Era de família humilde, filho de lavradores e neto de escravos. Deu seus primeiros passos no futebol no time da fábrica de tecidos Bangu, em 1929, assim como seus três irmãos: Luiz, Mamede (Médio) e Ladislau, meia que reinava no time do Bangu na época e que ainda é o maior artilheiro da história do clube, com 222 gols. Em seu início, Domingos ficou conhecido como o irmão de Ladislau. Mas sua ligação com o time é tão grande, que foi citado por Lamartine Babo quando este compôs a letra do hino do Bangu:

“O Bangu tem também a sua história e glória,
Enchendo seus fãs de alegria.
De lá pra cá, surgia Domingos da Guia.”

Sua habilidade começou cedo, nas peladas no subúrbio de Bangu. Sua posição original era de centromédio. Logo em seus primeiros treinos, Kanela (o maior técnico de basquete da história do Brasil, bicampeão mundial, que também foi treinador de futebol e passou pelo Bangu) achou melhor adaptar o garoto na defesa. Domingos ensinou que os defensores também podem ter habilidade. Estreou no Bangu em 04/04/1929, em uma vitória de 4 x 2 sobre o Fluminense (algumas fontes afirmam que o jogo era contra o Flamengo) pelo Campeonato Carioca, substituindo o zagueiro Conceição. Até a profissionalização do futebol no Brasil, Domingos conciliava os compromissos do futebol com as trabalhos como carpinteiro, na Fábrica de Tecidos Bangu e até como mata-mosquitos no Departamento de Saúde Pública do Rio de Janeiro. Após três temporadas, em 1932, trocou o Bangu pelo Vasco da Gama.

● Em 1933, após jogo da Copa Rio Branco pela Seleção Brasileira contra o Uruguai, decidiu ficar no futebol profissional uruguaio e assinar com o Nacional. Provocou uma revolução, pois jogava na mesma posição que José Nasazzi (capitão celeste campeão da primeira Copa do Mundo, em 1930). Assim, formaram uma inédita dupla em que os dois eram zagueiros pelo lado direito. Quando Domingos foi contratado, os uruguaios se revoltaram, alegando que não precisavam de zagueiro, pois tinham Nasazzi. Quando Domingos saiu do clube, disseram que só aprenderam com ele o verdadeiro significado da palavra “zagueiro”. No país vizinho, com apenas 20 anos, ganhou o apelido de “Divino Mestre”. Foi campeão uruguaio em 1933. Voltou ao Brasil para nova passagem pelo Vasco, já profissionalizado, e foi campeão do Campeonato Carioca da LCF em 1934.

Despertou novo interesse estrangeiro e foi para o Boca Juniors em 1935. Em terras portenhas, fez uma ótima dupla de zaga com Victor Valussi, dando uma proteção “divina” ao goleiro Yustrich. Se tornou lenda também no Boca Juniors, de Francisco Varallo, e venceu o campeonato argentino de 1935. Seu maior orgulho foi ter sido campeão tricampeão consecutivo em três países diferentes: Uruguaio (1933), Carioca (1934) e Argentino (1935). Onde passou, deixou sua marca. Mesmo com o talento singular, nunca lhe faltou raça. Às vezes nem precisava se mexer. “Eu vou pelo atalho”, explicou certa vez. Mas um desentendimento de Domingos com um árbitro local o levou a uma suspensão de dois meses, o que motivou novas investidas de clubes brasileiros. Com diversas propostas, Domingos foi ser ídolo do Flamengo a partir de 1936.

Estreou em um empate em 2 x 2 com o Fluminense, em 16/08/1936. Após passar de novo e rapidamente pelo Boca em 1937, se consagrou definitivamente com a camisa do rubro-negra, jogando entre 1937 e 1943, disputando 223 partidas pelo Flamengo, com 138 vitórias, 46 empates e 39 derrotas. Se tornou campeão carioca em 1939, 1942 e 1943. Posteriormente, foi homenageado pelo Flamengo dando seu nome a escolinha do clube em São Gonçalo.

Em 1944, Domingos brigou com a diretoria do Flamengo e se mandou para jogar no Corinthians, já aos 32 anos. Chegou ao Timão por 300 contos de réis (maior transação da época). Foi um fato marcante que revolucionou o futebol paulista. Pelo Timão, entre 1944 e 1948, disputou 116 jogos, com 77 vitórias, 17 empates e 22 derrotas. Foi capitão do time e chegou a ser convocado para a Seleção Paulista, provando que a idade nunca foi um empecilho para o craque. Já tinha jogado pela Seleção do Rio de Janeiro entre 1931 e 1943, no antigo Campeonato Brasileiro de Seleções. Encerrou a carreira onde começou, no Bangu, onde jogou novamente de 1958 a 1950.


(Imagem: Globo)

● Após se despedir dos gramados, treinou o Olaria Atlético Clube, mas não teve sucesso como técnico. Em 1952 voltou a trabalhar no serviço público, no qual se aposentou como fiscal de renda. Depois, trabalhou como comerciante em um bar de sua propriedade. Não era um simples dono do bar. Sempre aparecia alguém da imprensa interessado apenas em suas histórias e em reviver seus grandes momentos dentro do gramado. Se estabeleceu no bairro de Bangu, em busca de suas raízes. Costumava passear pelas calçadas da Avenida Rio Branco, onde encontrava velhos amigos e a prosa era certa. Vestia-se com a mesma elegância com que jogava: com um terno branco e uma cartola. Se tornou parceiro de Zizinho, como morador do bairro do Méier, em 1974. Faleceu aos 87 anos, em 18/05/2000, em um quarto do Hospital Quarto Centenário, vítima de um acidente vascular cerebral, no mesmo Rio de Janeiro onde nasceu.

Seu maior orgulho era seu filho Ademir da Guia, maior ídolo da história do Palmeiras, que herdou o apelido e a “divindade” do pai. “Quando meu pai jogou no Nacional do Uruguai, ganhou o apelido de Divino Mestre. E quando eu cheguei aqui em São Paulo, os jornais colocaram: ‘O Palmeiras contratou o filho do Divino’. Então o apelido na verdade é do meu pai. Ele me incentivou bastante no início da carreira. Todo início de carreira em qualquer profissão é difícil e ele me incentivou, me ajudou muito, me abriu portas”. “Ele sabia de sua categoria, mas preferia não ficar se gabando. As pessoas falavam mais sobre as suas qualidades do que ele próprio”, afirmou certa vez Ademir, que não chegou a ver o pai atuando.

(Imagem: Gazeta Press)

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